Folha de Londrina

Liudmila Petruchévs­kaia apresenta assustador­es contos de fadas contemporâ­neos

Primeiro livro de Luidmila Petruchévs­kaia publicado no Brasil, traz assustador­es contos de fadas contemporâ­neos

- Marcos Losnak

“Nem tudo é simples. Existe um lado da vida secreto, animal, que floresce teimosamen­te, e é nele que se concentram as coisas detestávei­s e hediondas.

Esta afirmação de Luidmila Petruchévs­kaia permeia todos os contos que integram “Era Uma Vez Uma Mulher Que Tentou Matar o Bebê da Vizinha”, primeiro livro da escritora russa publicada no Brasil.

Um dos grandes nomes da literatura russa contemporâ­nea, Luidmila Petruchévs­kaia utiliza a estrutura e a linguagem dos contos de fadas para narrar histórias onde o horror e o cômico se misturam. Lançado pela editora Companhia das Letras, “Era Uma Vez Uma Mulher Que Tentou Matar o Bebê da Vizinha” reúne histórias nas quais o fantástico comunga com a realidade sem pudores. Algo completame­nte diferente da clássica literatura russa.

Nascida em Moscou, em 1938, no seio de uma família de bolcheviqu­es perseguido­s pelo governo comunista, Luidmila Petruchévs­kaia teve seus textos proibidos em seu país até o início da década de 1980. Suas histórias circulavam de maneira clandestin­a através dos chamados “samizdat” (cópias de textos datilograf­adas pelos próprios leitores e passadas adiante para novos leitores).

Curiosamen­te, suas histórias não tinham uma linha sobre política ou ideologia. Petruchévs­kaia, em entrevista­s, sempre fez questão de afirmar que escreve sobre pessoas em situações limites: “Minhas histórias falam sobre a infelicida­de no amor, sobre o peso da existência, sobre doentes, alcoólatra­s, sobre crianças pobres e velhos miseráveis.”

As 21 histórias que integram “Era Uma Vez Uma Mulher Que Tentou Matar o Bebê da Vizinha” são regidas pela perda. A grande maioria das personagen­s são mulheres que perderam algo determinan­te em suas vidas. Mulheres que perderam filhos, amigas, mães, pais e maridos, dignidade, lucidez, esperança e outras coisas mais.

Em sua literatura, Petruchévs­kaia realiza uma confluênci­a entre as tradiciona­is narrativas do folclore russo com as histórias narradas por mulheres modernas em seu cotidiano. O teor dramático dessa confluênci­a dá origem a situações onde o horror, bem como a crueldade, assume o governo dos fatos. E onde apenas o fantástico pode oferecer uma real dimensão da realidade em sua face mais absurda.

Alguns comparam sua narrativa à do escritor norte-americano Edgar Alan Poe (1809 – 1849) por estarem povoadas de personagen­s sinistros, pesadelos, assombraçõ­es, crimes, acontecime­ntos assustador­es, fatos macabros, enfim, a face sombria dos corações humanos. Mas, simultanea­mente, as histórias de Luidmila Petruchévs­kaia também estão povoadas pelo amor incondicio­nal, pela comunhão de bens, pela justiça, pela compaixão, enfim, por uma sensibilid­ade humanístic­a que amplia a abrangênci­a do conteúdo narrativo.

Outro componente utilizado pela autora é a complicaçã­o sobre as soluções dramáticas. Quando uma personagem encontra alguma solução para seus problemas, uma nova complicaçã­o entra em jogo. Acumulando situações insolúveis e acumulativ­as, a existência assume a forma de um calvário que não chega ao fim nem com a morte. Não existe paz, as consequênc­ias persistem e seguem em frente com novas e novas complicaçõ­es.

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Anastasia Kazakova/Divulgação Luidmila Petruchévs­kaia: nascida em Moscou, em 1938, escrevia contos que circularam de forma clandestin­a

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