Novos modelos de negócios exigem profissionais com mais flexibilidade
Entidades mostram preocupação com qualidade de ensino e dizem que as inovações demoram para chegar nas universidades
Odescompasso com as novas tecnologias e a melhoria na qualidade dos cursos são desafios a serem superados pela educação superior no Brasil. Percebe-se que as inovações e as novas exigências do mercado acabam demorando para chegar aos cursos superiores. “O ensino superior tem prazos muito rígidos. Quando sai uma tecnologia na indústria, é difícil a faculdade reagir e trazer inovação no mestrado ou na graduação. A dinâmica dos novos modelos de negócio exige um profissional que tenha uma grande flexibilidade”, diz Fabricio Luz Lopes, gerente adjunto da Fiep (Federação das Indústrias do Estado Paraná). O deputado Alex Canziani (PTB), que faz parte da Frente Parlamentar da Educação, concorda que a universidade “deve servir para resolver problemas da sociedade” e vê com bons olhos uma aproximação com a indústria: “Quanto mais aproximar as universidades do setor produtivo, melhor pra universidade e melhor pra sociedade”, disse. Canziani foi relator do novo programa de Financiamento Estudantil, o Fies.
Um exemplo de como superar essa barreira são iniciativas como a Faculdade da Indústria, da Fiep, que oferta cursos de graduação e pós-graduação para capacitar profissionais de acordo com as novas necessidades do mercado.
Segundo Lopes, o objetivo é atender as demandas da indústria para suprir possíveis carências de formação. “Atendemos a indústria e nós a procuramos também. Em abril, faremos um painel para discutir as pós-graduações, o que o profissional da indústria deve entender”, afirma. “Precisamos cada vez mais de um profissional singular, não podemos mais ter uma formação de massa. Hoje, o aluno define qual trilha educacional vai seguir.”
Também há a necessidade de as pesquisas desenvolvidas nas universidades brasileiras serem mais aproveitadas pela indústria, avalia o gerente adjunto da Fiep. “O Brasil é bom em produção de pequisas, mas geramos poucos negócios. A academia ainda conversa pouco com a indústria, nós procuramos suprir esse gargalo”, diz. “Outra possibilidade são parcerias internacionais. Hoje são poucas universidades brasileiras com possibilidades de intercâmbio.”
Outro exemplo de adaptação das universidades ao novo ambiente vem da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Depois de dois anos de preparação, a instituição mudou suas matrizes curriculares para focar em competências e habilidades. “O futuro vai exigir habilidades muito específicas e distantes das que vêm sendo trabalhadas hoje, será preciso saber resolver problemas oferecendo soluções criativas e inovadoras. Muitas profissões vão aparecer e outras vão desaparecer”, diz a pró-reitora de Graduação da universidade, Maria Beatriz Balena.
EXPANSÃO
Em novembro do ano passado, um decreto do governo federal suspendeu a abertura de novos cursos de Medicina por cinco anos no País - apesar da percepção de que faltam profissionais de saúde em diversas regiões brasileiras. As seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também se movimentam para impedir a abertura de novos cursos.
Para o secretário-geral do Conselho Regional de Medicina do Paraná, Luiz Ernesto Pujol, muitas faculdades de medicina que surgiram com o intenso processo de expansão das instituições particulares, a partir do governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995, não têm infraestrutura necessária para formar bons profissionais. “Há décadas vamos a Brasília, falamos com deputados e senadores, mas não somos ouvidos.”
Pujol cita como exemplo da queda de qualidade do ensino a utilização de manequins para aulas práticas. “O médico não trata de máquinas. Os sentimentos, os relacionamentos que a pessoa tem influenciam. São manifestações orgânicas, emissões de hormônios que alteram a personalidade, o comportamento. É disso que a medicina trata, não posso treinar em bonecos”, critica. “Cabe ao médico interpretar uma queixa, 80% das pessoas que entram no consultório poderiam sair sem uma gota de remédio. E isso não está acontecendo, porque as escolas não estão preparando convenientemente os alunos.”
Um processo similar ocorre na área do Direito. No início deste mês, o Conselho Pleno da OAB-PR aprovou por unanimidade uma moção para que o Conselho Federal solicite ao Ministério da Educação a suspensão da abertura de novos cursos por um período de dez anos. A proposta foi apresentada pela conselheira estadual Vânia Queiroz, de Londrina.
“A Comissão de Educação Jurídica do Paraná vem com-
Precisamos cada vez mais de um profissional singular, não podemos mais ter uma formação de massa”
provando que o Estado não comporta mais esse número de faculdades e que houve um aumento desproporcional. Há uma perspectiva mercadológica”, avalia Rodrigo Sánchez Rios, presidente da Comissão de Educação Jurídica da OAB-PR. “Não temos tantos professores qualificados e não podemos dizer que os alunos têm uma boa formação”.
Para Rios, existe uma dificuldade para encontrar bons professores. “Não há uma boa formação quando há falta de professores vocacionados para o magistério, preocupados com a formação do profissional e também com a formação do cidadão. Quando o acadêmico não tem essa resposta na faculdade, o que se encontra é uma mão de obra barata, com profissionais sem esse compromisso. É um pouco o retrato da sociedade”, diz. Outra solução para aumentar o nível dos profissionais de Direito, avalia Rios, seria tornar exames da OAB mais rigorosos e limitar o número de tentativas.