Longevidade e disposição para competir
Disciplina e prazer são os segredos de Sokuchin Uehara para continuar correndo aos 77 anos
O54º lugar entre 94 participantes de uma corrida de rua como a São Silvestre dificilmente deixaria um atleta experiente feliz, mas há exceções. Sokuchin Uehara disputa o circuito de 15 km, que percorre um pedaço da cidade de São Paulo, desde 1989 e ficou contente com sua participação na prova. Aos 77 anos, o engenheiro metalúrgico aposentado leva a vida de atleta há mais de três décadas, quando decidiu que deveria praticar o esporte para o resto da vida.
A história do quase otagenário começou em Araraquara (SP), onde nasceu mas passou pouco tempo. Aos sete anos se mudou para Londrina com os pais, que decidiram deixar o trabalho no campo para tentar a sorte na cidade. Por aqui, Sokuchin completou o colegial, mas não viu nenhuma perspectiva de formação superior. “Aqui tinha dois cursos na época, direito e odontologia, eu não queria fazer nenhum e acabei indo para São Paulo. Lá eu não tinha condição financeira de pagar estudos, mas meus irmãos que moravam lá pagaram meu cursinho e eu consegui passar no vestibular da Escola Politécnica (USP) em engenharia metalúrgica.”
Formado em uma das mais conceituadas universidades de engenharia do Brasil, o londrinense de coração trabalhou quase toda a vida em três cidades: Santo André e São José dos Campos, em São Paulo, e Juiz de Fora, em Minas Gerais, e foi nesta última que teve seu primeiro contato com o esporte pela qual se apaixonou.
Desde jovem ele praticava beisebol, vôlei, tênis e basquete, mas na cidade mineira que recebeu um convite.
“Um colega de trabalho olhou para mim e perguntou ‘vamos correr?’”, lembra.
“Eu pensei, basquete não consigo praticar porque eu ia precisar de 10 pessoas; para jogar tênis, sempre vou ter que ter um parceiro. Então eu aceitei correr e não parei mais. Esse meu amigo parou já nos primeiros dias que co- meçamos, eu já estou nessa há mais de 30 anos. Eu não dependo de ninguém. Achei o que eu precisava para minha vida toda.”
Uehara ficou em Minas durante 13 anos e nunca abandonou o esporte. Quando parou de trabalhar, aos 55, decidiu voltar à cidade que cresceu para aproveitar a aposentadoria. “A vantagem da corrida é que você não precisa de nada. É sozinho, seu campo de esportes é a rua. Eu não senti problema quando voltei para cá, nesse meio da corrida você conhece as pessoas muito rápido, você sai para correr e faz um círculo de amizade fácil.”
SUSTO
Há 20 anos, o engenheiro aposentado tomou um susto. Após sofrer com algumas dores pós-provas, decidiu procurar um médico. Visitou três ortopedistas e todos eles deram a mesma ordem: “se quer parar de sofrer com isso, pare de correr”. Sokuchin, então, foi atrás de uma quarta opinião e foi essa que o encorajou, disse que ele tinha liberdade para correr por mais quanto tempo quisesse e que os problemas físicos poderiam ser tratados apenas reduzindo a carga de treinos – que antes eram diários, mas
atualmente são feitos com intervalo de um dia.
Para participar das corridas, o idoso é obrigado a apresentar exames médicos comprovando estar com a saúde em dia. “Este ano, a minha médica achou alguma ‘coisinha’ no meu coração e pediu mais alguns exames. Fiquei com medo, pensei que
fosse ter que parar, eu não teria mais o que fazer da vida, mas ela disse ‘nada sério, você está liberado para correr normalmente’. Foi a primeira vez que deu algo e não foi sério, foi um alívio.”
Com supervisão de Lucilia Okamura
Editora Cidades