Reforma da Previdência: um esclarecimento
Na edição de segunda (12) dois artigos da Folha me chamaram a atenção: o texto de Claudio Tedeschi, no Espaço Aberto, e a coluna Economia Nossa de Cada Dia, do professor Marcos Rambalducci. Ambos merecem um esclarecimento.
Ao preparar nossa Constituição de 1988, os constituintes se debruçaram, entre outros temas, sobre a sustentabilidade de nossa Seguridade Social, e estabeleceram uma ampla base de custeio para atender às demandas de previdência, assistência social e saúde. Cabe aqui, de início, uma ressalva: os servidores públicos federais não tinham previdência: ao passar em um concurso, eles tinham a garantia de salário até o fim da vida - ou seja, quando não tivessem mais condições de trabalho, iriam para casa e continuariam recebendo salários como se trabalhando estivessem. Logo, essa “despesa” continuava na folha de salários, não migrava para a previdência, e os servidores públicos não pagavam contribuições previdenciárias (o que era óbvio, já que não tinham previdência).
Quando do Plano Real, em 1994, entendeu o governo que os servidores também tinham que contribuir, e então instituíram o que chamamos de previdência dos servidores federais (deveria ser similar à CAAPSML, aqui de Londrina, ou ao ParanáPrevidência, dos servidores estaduais, porém o instituto nunca foi criado). Daí nasce o grande problema: como passou a ser previdência, o governo “alocou” esses gastos e contribuições na mesma conta da Seguridade Social.
Entendemos que tal fato foi totalmente inconstitucional, por vários motivos. Listo apenas alguns: 1. A Seguridade Social foi criada com foco nos trabalhadores da iniciativa privada; 2. A Seguridade Social está em um capítulo da Constituição totalmente diferente daquele onde está a previdência dos servidores, mostrando que as aposentadorias dos servidores deve sair de outro caixa, e não do caixa da Seguridade.
Agora, quando o governo fala em reforma, coloca todas as despesas (servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada) em uma única conta, inconstitucional, para dizer que tem deficit. No ano passado o Senado se debruçou sobre este tema, na CPI da Previdência. Ao excluir os servidores públicos da conta, atendendo à Constituição, concluíram que nunca houve deficit na Seguridade Social. Até por isso, o governo não fala mais em deficit, para não incorrer em crime (por causa da CPI). Vale lembrar que o relatório da CPI foi aprovado por unanimidade.
Até pela sua natureza, é óbvio que a “previdência dos servidores públicos federais” é deficitária, pois se sustenta unicamente com as contribuições dos próprios servidores e com algumas migalhas do governo (que tira dos tributos que todos nós pagamos). Entretanto, a Seguridade Social, que na saúde e assistência social atende a toda a população, e na previdência atende aos trabalhadores da iniciativa privada, não há deficit. Por este motivo, a reforma proposta pelo governo não pode ser aprovada, pois prejudica os trabalhadores da iniciativa privada, para que o “superavit” destes seja investido nas aposentadorias dos servidores.
Outro crime é querer comparar o sistema federal, com Estados como o Rio de Janeiro, envolto nas piores crises de corrupção. Dizer que vai acontecer com o INSS o mesmo que ocorreu com o Rio, é dizer que o governo federal é tão ou mais corrupto do que o governo daquele Estado.
A pergunta que precisamos, então, fazer, é: precisamos mesmo dos serviços públicos da forma que nos são ofertados? Ou podemos ter serviços mais enxutos, ágeis e, porque não, tocados por quem realmente entende de administração?
Quando o governo fala em reforma, coloca todas as despesas (servidores públicos e iniciativa privada) em uma única conta, inconstitucional, para dizer que tem deficit”