AO RELENTO
Mulheres cujos filhos estudam na Apae e moram longe da instituição ficam ao relento
Acompanhar os filhos até a Apae, na zona leste de Londrina, não é a única dificuldade enfrentada por um grupo de mães de alunos. Sem lugar para ficar durante as aulas, as mulheres são obrigadas a esperar por até quatro horas na calçada, sem proteção contra o sol ou a chuva. Elas não têm autorização nem mesmo para usar o banheiro na instituição
“A Apae tem 330 alunos e a regra é a mesma para todos”
Horas de espera sob o sol, no calor, no frio e até na chuva. Assim é a vida das mães de alunos da Apae de Londrina que moram muito longe da instituição e não têm como voltar para casa enquanto os filhos são atendidos. Dos distritos rurais ou de bairros distantes, elas chegam logo cedo, deixam os filhos e ficam na rua esperando o fim da aula. Por determinação da diretoria da Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), o grupo de aproximadamente dez mulheres não pode mais esperar nas dependências da escola, onde foram proibidas até mesmo de usar o banheiro. A solução encontrada foi se abrigar embaixo de uma uma árvore, seguindo com bancos e caixotes improvisados - por pelo menos quatro horas - a direção da sombra.
“A gente vem de longe, não compensa vir até aqui e voltar”, relatou Maria Francisca da Silva, 64, que mora na zona norte e enfrenta duas linhas de ônibus urbano com Renato, 30, que usa cadeiras de rodas, para chegar à Apae. Frequentadora da entidade há muitos anos, ela recorda que, há alguns anos, a instituição acolhia as mães em uma sala de convivência onde faziam artesanato e esperavam os filhos com mais conforto. Há mais de três anos, porém, a sala foi fechada e as mulheres foram orientadas a não permanecer dentro da instituição. “A sala era terapêutica, combatia até depressão. Agora só nos resta ficar aqui na rua. É difícil, porque não temos onde sentar, beber água ou usar o banheiro. Temos que contar com a boa vontade dos comerciantes”, lamenta.
Ela recorda que houve uma tentativa de acomodálas em uma igreja próxima, mas a iniciativa durou pou- co tempo. “Mudou o padre e não pudemos mais ficar na igreja”. A única pessoa que as acolhe é dono da residência onde costumam montar o “acampamento” na frente. Para agradecer, elas revelam que limpam a calçada todos os dias. “Por sorte ele não se incomoda com a nossa presença.”
Nadir Ribeiro Medeiros, 54, viaja todos os dias do distrito de Guaravera até Londrina com a filha Denise, 22, que também é cadeirante. “Saio de casa às 6h25 para chegar 7h40 na Apae. Não tem como voltar para casa e retornar ao meio-dia, quando acaba a aula”, lamenta ela, que já se resignou com a condição de não poder fazer nada a não ser esperar. “É muito cansativo, porque levando às 4 horas para fazer almoço. Trago uma comida especial para minha filha, que foi recomendada pelo médico. Só posso entrar na Apae para entregar a refeição”, conta.
Para Andréia Pereira Vieira Fogaça, 32, mãe de Carlos Eduardo, 9, a situação é “humilhante”. Ela vem de uma fazenda do distrito de São Luiz todos os dias, percorrendo três quilômetros apenas para chegar ao ponto de ônibus. “Na ida meu marido leva, mas na volta vou à pé com meu filho. Quando chove eu nem saio de casa porque é impossível chegar”, diz.
Com a rotina de acordar às 4 horas para adiantar o almoço, ela admite que o dia a dia é muito cansativo. “Ficar aqui na rua é muito difícil. Tem dias que vou até o centro e volto, mas na maioria das vezes nossa vida é esperar. Não queremos atrapalhar o trabalho da Apae, mas para as mães é muito ruim ficar dependendo de favor dos comerciantes e vizinhos. A gente só quer um lugar para esperar com um pouco de conforto”, pede.
Em conjunto, elas lembram que a vida das mães de filhos deficientes é desgastante, pois eles são dependentes e precisam de muitos cuidados. “Ficar na rua não ajuda, só aumenta a nossa angústia”, afirmou Silva.
SEGURANÇA
O presidente do conselho de intervenção da Apae, Antônio Valdemir Zago, informou que está ciente da presença das mães nos arredores da instituição. Ele argumentou, porém, que a associação é como todas as outras escolas e que em geral o acesso dos pais não é permitido. “Em qualquer escola o pai deixa o filho na portaria e ele fica sob responsabilidade dos professores e funcionários. A Apae tem 330 alunos e a regra é a mesma para todos”, afirmou.
Ele disse que a sala de convivência para pais foi extinta porque a instituição precisa de espaço para melhor atender os alunos. Afirmou, ainda, que o local chegava a acomodar mais de cem pessoas e que a aglomeração atrapalhava o funcionamento da escola. “Muitas mães chegavam a assediar os professores, o ambiente estava incontrolável e decidimos fechar a sala”, disse.
Outro motivo para não permitir o acesso dos pais, conforme Zago, é a garantia de segurança. “Se acontece algo com um aluno, a responsabilidade é da diretoria. Não posso correr esse risco, o que menos precisamos no momento é de interferência externa”, informou.