Folha de Londrina

AO RELENTO

Mulheres cujos filhos estudam na Apae e moram longe da instituiçã­o ficam ao relento

- Carolina Avansini Reportagem Local

Acompanhar os filhos até a Apae, na zona leste de Londrina, não é a única dificuldad­e enfrentada por um grupo de mães de alunos. Sem lugar para ficar durante as aulas, as mulheres são obrigadas a esperar por até quatro horas na calçada, sem proteção contra o sol ou a chuva. Elas não têm autorizaçã­o nem mesmo para usar o banheiro na instituiçã­o

“A Apae tem 330 alunos e a regra é a mesma para todos”

Horas de espera sob o sol, no calor, no frio e até na chuva. Assim é a vida das mães de alunos da Apae de Londrina que moram muito longe da instituiçã­o e não têm como voltar para casa enquanto os filhos são atendidos. Dos distritos rurais ou de bairros distantes, elas chegam logo cedo, deixam os filhos e ficam na rua esperando o fim da aula. Por determinaç­ão da diretoria da Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepciona­is), o grupo de aproximada­mente dez mulheres não pode mais esperar nas dependênci­as da escola, onde foram proibidas até mesmo de usar o banheiro. A solução encontrada foi se abrigar embaixo de uma uma árvore, seguindo com bancos e caixotes improvisad­os - por pelo menos quatro horas - a direção da sombra.

“A gente vem de longe, não compensa vir até aqui e voltar”, relatou Maria Francisca da Silva, 64, que mora na zona norte e enfrenta duas linhas de ônibus urbano com Renato, 30, que usa cadeiras de rodas, para chegar à Apae. Frequentad­ora da entidade há muitos anos, ela recorda que, há alguns anos, a instituiçã­o acolhia as mães em uma sala de convivênci­a onde faziam artesanato e esperavam os filhos com mais conforto. Há mais de três anos, porém, a sala foi fechada e as mulheres foram orientadas a não permanecer dentro da instituiçã­o. “A sala era terapêutic­a, combatia até depressão. Agora só nos resta ficar aqui na rua. É difícil, porque não temos onde sentar, beber água ou usar o banheiro. Temos que contar com a boa vontade dos comerciant­es”, lamenta.

Ela recorda que houve uma tentativa de acomodálas em uma igreja próxima, mas a iniciativa durou pou- co tempo. “Mudou o padre e não pudemos mais ficar na igreja”. A única pessoa que as acolhe é dono da residência onde costumam montar o “acampament­o” na frente. Para agradecer, elas revelam que limpam a calçada todos os dias. “Por sorte ele não se incomoda com a nossa presença.”

Nadir Ribeiro Medeiros, 54, viaja todos os dias do distrito de Guaravera até Londrina com a filha Denise, 22, que também é cadeirante. “Saio de casa às 6h25 para chegar 7h40 na Apae. Não tem como voltar para casa e retornar ao meio-dia, quando acaba a aula”, lamenta ela, que já se resignou com a condição de não poder fazer nada a não ser esperar. “É muito cansativo, porque levando às 4 horas para fazer almoço. Trago uma comida especial para minha filha, que foi recomendad­a pelo médico. Só posso entrar na Apae para entregar a refeição”, conta.

Para Andréia Pereira Vieira Fogaça, 32, mãe de Carlos Eduardo, 9, a situação é “humilhante”. Ela vem de uma fazenda do distrito de São Luiz todos os dias, percorrend­o três quilômetro­s apenas para chegar ao ponto de ônibus. “Na ida meu marido leva, mas na volta vou à pé com meu filho. Quando chove eu nem saio de casa porque é impossível chegar”, diz.

Com a rotina de acordar às 4 horas para adiantar o almoço, ela admite que o dia a dia é muito cansativo. “Ficar aqui na rua é muito difícil. Tem dias que vou até o centro e volto, mas na maioria das vezes nossa vida é esperar. Não queremos atrapalhar o trabalho da Apae, mas para as mães é muito ruim ficar dependendo de favor dos comerciant­es e vizinhos. A gente só quer um lugar para esperar com um pouco de conforto”, pede.

Em conjunto, elas lembram que a vida das mães de filhos deficiente­s é desgastant­e, pois eles são dependente­s e precisam de muitos cuidados. “Ficar na rua não ajuda, só aumenta a nossa angústia”, afirmou Silva.

SEGURANÇA

O presidente do conselho de intervençã­o da Apae, Antônio Valdemir Zago, informou que está ciente da presença das mães nos arredores da instituiçã­o. Ele argumentou, porém, que a associação é como todas as outras escolas e que em geral o acesso dos pais não é permitido. “Em qualquer escola o pai deixa o filho na portaria e ele fica sob responsabi­lidade dos professore­s e funcionári­os. A Apae tem 330 alunos e a regra é a mesma para todos”, afirmou.

Ele disse que a sala de convivênci­a para pais foi extinta porque a instituiçã­o precisa de espaço para melhor atender os alunos. Afirmou, ainda, que o local chegava a acomodar mais de cem pessoas e que a aglomeraçã­o atrapalhav­a o funcioname­nto da escola. “Muitas mães chegavam a assediar os professore­s, o ambiente estava incontrolá­vel e decidimos fechar a sala”, disse.

Outro motivo para não permitir o acesso dos pais, conforme Zago, é a garantia de segurança. “Se acontece algo com um aluno, a responsabi­lidade é da diretoria. Não posso correr esse risco, o que menos precisamos no momento é de interferên­cia externa”, informou.

 ?? Gina Mardones ??
Gina Mardones
 ?? GinA MArdones ?? Como não pode ficar nas dependênci­as da escola, o grupo de mulheres se abriga na calçada
GinA MArdones Como não pode ficar nas dependênci­as da escola, o grupo de mulheres se abriga na calçada

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil