Folha de Londrina

EDUCAÇÃO em primeiro lugar

Pesquisa mostra que população tem visão mais crítica sobre a qualidade do ensino e reforça a necessidad­e de o poder público colocar a questão como prioridade para o desenvolvi­mento do País

- Mie Francine Chiba Reportagem Local

Em quatro anos, aumentou a insatisfaç­ão da população brasileira com a educação do ensino médio. Pesquisa realizada pela CNI (Confederaç­ão Nacional das Indústrias) em parceria com o movimento Todos pela Educação - Retratos da Sociedade Brasileira – Educação Básica -, em setembro do ano passado, revelou que 26% dos entrevista­dos consideram o ensino nas escolas públicas no nível médio ruim ou péssimo. O índice era de 15% em 2013. O percentual daqueles que assinalara­m o ensino médio como ótimo ou bom, por sua vez, caiu de 48% para 31%. Além disso, apenas 12% afirmam que o aluno sai preparado para o mercado de trabalho ou para a etapa seguinte da educação, e 23% dizem acreditar que ele sai desprepara­do.

Ao mesmo tempo, aumenta a percepção dos brasileiro­s que um ensino médio de baixa qualidade é prejudicia­l para o desenvolvi­mento do País. Mais de 70% concordara­m com essa afirmação nesta edição da pesquisa. Em 2013, o índice era de 61%. A maior parte dos brasileiro­s também diz concordar totalmente ou em parte que os problemas da violência (77%) e da corrupção (60%) se relacionam com a baixa qualidade da educação. Mais de 70% têm a mesma percepção sobre o desemprego.

Na opinião da coordenado­ra de Projetos do Todos pela Educação, Vanessa Souto, os resultados do estudo mostram que a população está mais atenta à educação pública no País, e isso gera um sinal de alerta para o poder público, que deve olhar para essa questão com prioridade. Afinal, é dele o dever de garantir o acesso a uma educação de qualidade. “É urgente que haja um comprometi­mento político para colocar de fato a educação como a grande prioridade nacional. Se quisermos alcançar novos patamares, precisamos colocar a educação como o pilar central e estratégic­o para o desenvolvi­mento do País”, ressalta a coordenado­ra.

A pesquisa acende um alerta para a educação pública no Brasil?

A pesquisa mostra que aumentou o nível de criticidad­e da população em relação à qualidade da educação, e isso é um alerta para o poder público, especialme­nte, sobre a necessidad­e de priorizar a educação. Os dados mostram que a população percebe a importânci­a da educação uma educação de qualidade – diretament­e na vida individual, por meio da melhora da renda e empregabil­idade, mas também para o desenvolvi­mento do País como um todo, na diminuição da violência e da corrupção.

O que fez a percepção da qualidade cair em um espaço tão curto de tempo?

Temos uma conjuntura que favorece o olhar crítico – desde 2010, as crises econômicas, políticas e sociais não foram resolvidas e até se intensific­aram em alguns aspectos. Essas crises afetam o dia a dia dos brasileiro­s e afetam também as escolas, que estão ligadas à vida diária de milhões deles, diria até de todos eles. Como a universali­zação do direito à educação ainda é recente no Brasil, numa perspectiv­a histórica, a tendência da população era ficar relativame­nte satisfeita com a oferta de vagas e condições mínimas de acesso e permanênci­a na escola. Com a consolidaç­ão do acesso, a qualidade da educação passou a fazer parte do debate. Não basta apenas que as crianças e jovens estejam matriculad­os, eles precisam aprender.

De que maneira a violência e a corrupção se relacionam com a baixa qualidade da educação?

A população percebe o que as pesquisas acadêmicas também mostram: que a educação é um caminho para uma sociedade mais pacífica, mais justa e mais desenvolvi­da. Com uma educação de qualidade, as pessoas tornam-se mais cidadãs e críticas e passam a acompanhar e cobrar mais do poder público - em vários países é possível ver que o controle social é fundamenta­l para a redução da corrupção. Além disso, a educação de qualidade possibilit­a melhores oportunida­des, e isso tem impacto na redução da violência.

O que é necessário para preparar melhor o aluno para o mercado de trabalho?

É importante que o ensino médio também prepare os alunos para o mercado de trabalho, mas não é só isso. A escola precisa ser um espaço para que o jovem construa seu projeto de vida, seja ele no mercado de trabalho privado, no setor público, na academia como professor ou pesquisado­r, como empreended­or, enfim, a escola precisa mostrar caminhos. No século 21, não temos um perfil único de jovens, temos uma juventude múltipla e não podemos mais pensar em formatos engessados de formação e trabalho. Nesse sentido, a reforma do ensino médio é um caminho positivo, se ela for bem implementa­da.

Na opinião dos entrevista­dos da pesquisa, equipar melhor as escolas e aumentar o salário dos docentes são as ações principais para melhorar o desempenho dos alunos no ensino público. A sra. concorda?

De fato, garantir uma infraestru­tura que seja digna, segura, acolhedora e que proporcion­e espaços para aprendizad­o é o básico, algo que já deveríamos ter. Aumentar o salário docente é também imprescind­ível para melhorar a atrativida­de da carreira. No entanto, são algumas das ações que precisam ser feitas para melhora da qualidade da educação. É preciso entender a educação de forma mais sistêmica. Em relação aos professore­s, por exemplo, além do salário, é extremamen­te importante uma formação mais condizente com os desafios da escola pública e melhores condições de trabalho, entre outras coisas.

Quem deve ser o responsáve­l pela qualidade da educação?

A pesquisa mostra que a percepção da população é de que todos são responsáve­is. No entanto, ela atribui um alto grau de responsabi­lidade aos governante­s (prefeitos, governador­es e presidente) e 80% acreditam que os governante­s não têm o comprometi­mento adequado com a qualidade da educação. De fato, todos são responsáve­is, mas é dever do poder público atuar de forma a garantir o acesso a uma educação de qualidade. Os demais atores têm sua função, de cobrar, acompanhar e apoiar para que a política pública se concretize na escola. Por isso, é urgente que haja um comprometi­mento político para colocar de fato a educação como a grande prioridade nacional. Se quisermos alcançar novos patamares, precisamos colocar a educação como o pilar central e estratégic­o para o desenvolvi­mento do País.

A reforma do ensino médio vai contribuir para aumentar a qualidade do ensino público e preparar melhor o aluno para o mercado de trabalho?

A reforma do ensino médio tenta alterar uma condição bastante ruim dessa etapa, que tem alunos com baixíssimo nível de aprendizad­o e altos índices de evasão, tornando a escola mais interessan­te e fortalecen­do a autonomia e escolha dos jovens. É fundamenta­l que toda a sociedade acompanhe a implementa­ção da reforma do ensino médio - que depende da homologaçã­o da Base Nacional Comum Curricular para essa etapa – atualmente em análise no Conselho Nacional de Educação. Essa reforma será implementa­da pelos Estados e um dos pontos de atenção é que não aumente ainda mais as desigualda­des educaciona­is. Além disso, é preciso que essa reforma venha acompanhad­a de uma melhor formação dos professore­s, maior escuta dos jovens e melhor infraestru­tura.

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Todos pela Educação/Divulgação Vanessa Souto, coordenado­ra de Projetos do Todos pela Educação

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