Amamentação pode gerar economia de mais de US$ 300 bilhões ao ano
Aumento das taxas de aleitamento poderia evitar a morte de 800 mil crianças e de mais de 20 mil mulheres por câncer de mama em todo o mundo a cada ano
Estudo da Universidade Federal de Pelotas (RS) mostra que o aumento da taxa de aleitamento materno propiciaria impacto positivo nas finanças públicas em todo o mundo. Redução de gastos com políticas assistenciais e impulso no desenvolvimento social, por meio do aumento da produtividade, representaria economia anual de US$ 302 bilhões. Medida também poderia evitar a morte de 800 mil crianças e de mais de 20 mil mulheres por câncer de mama.
Uma em cada cinco crianças é amamentada até um ano de idade em países de renda alta e uma em cada três é alimentada exclusivamente com o leite materno até os seis primeiros meses de vida nos países de renda média e baixa. Desde os anos 1990, agências internacionais como a OMS (Organização Mundial da Saúde) e a Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) recomendam o aleitamento exclusivo durante os seis primeiros meses de vida da criança e o estudo “Amamentação no Século XXI”, desenvolvido pela UFPel (Universidade Federal de Pelotas), no Rio Grande do Sul, aponta que o aumento das taxas de aleitamento materno a níveis quase universais poderia evitar a morte de 800 mil crianças e de mais de 20 mil mulheres por câncer de mama em todo o mundo a cada ano. Além de melhorar a saúde pública, o trabalho mostra também como o aumento das taxas de aleitamento materno propiciaria um impacto positivo na economia mundial. Os resultados do estudo foram publicados pela revista científica britânica The Lancet em 2016 e renderam ao médico epidemiologista Cesar Victora, professor emérito da UFPel, a segunda colocação na 17ª edição do Prêmio Péter Murányi 2018.
São muitos os ganhos obtidos com a amamentação, tanto para a mãe quanto para o bebê. O estudo reforça os benefícios já amplamente divulgados, como a melhora no sistema imunológico da criança, a prevenção à desnutrição e o auxílio na formação da arcada dentária, mas vai além quando comprova que o leite humano pode ajudar no desenvolvimento do cérebro, aumentando o QI (Quociente de Inteligência), e na redução do risco de incidência de câncer de mama e de ovários nas mães que amamentaram. “Nós temos vários estudos aqui em Pelotas, acompanhando pessoas do nascimento até os 30 anos de idade, que mostram que aquelas que receberam o leite materno ficaram, em média, com três a quatro pontos de QI mais alto do que aquelas que não foram amamentadas, revelando que o aleitamento tem a ver com o desenvolvimento do cérebro”, destacou Victora. “E para as mulheres que amamentam há muitos ganhos. A cada seis meses que a mãe amamenta na vida, diminui em 6% a chance de câncer de mama. Então, se uma mãe amamentou três filhos por um ano cada um, ela tem cerca de 36% de redução de chance de vir a ter câncer.”
O estudo analisou dados sobre amamentação em 153 países em todos os continentes do mundo e observou que, nos países de baixa e média renda, apenas 37% das crianças eram amamentadas exclusivamente com o leite materno até os seis meses de vida. A série de estudos coordenada por Victora mostra que especialmente para esses países, o aumento nas taxas de aleitamento materno contribuiria para reduzir os gastos assistenciais e alavancar o desenvolvimento social e econômico em decorrência da alta do QI populacional e do consequente aumento da produtividade. O médico epidemiologista vê o desenvolvimento de capital humano como um dos principais benefícios que o incentivo à amamentação traria à sociedade. O estudo conseguiu avaliar ainda o impacto econômico de uma amamentação prolongada de todos os indivíduos e chegou à soma de US$ 302 bilhões ao ano. “Além de reduzir a mortalidade infantil e prevenir o câncer de mama e de ovários em mulheres, aumentar os níveis de amamentação infantil reduz custos com o tratamento de doenças como pneumonia, diarreia e asma.”
Victora calcula que se os Estados Unidos e o Brasil aumentassem para 90% as suas taxas de amamentação até os seis meses de idade e o Reino Unido conseguisse chegar aos 45%, a economia para os sistemas de saúde dos EUA seria de US$ 2,4 bilhões, US$ 6 milhões para o Brasil e US$ 30 milhões para o Reino Unido. “O Brasil até é bom porque temos algumas políticas públicas que favorecem o aleitamento, como a licença-maternidade de quatro meses e que chega a seis meses para servidores públicos. Nos EUA são quatro semanas de licença-maternidade. Mas nos países escandinavos, as mães têm direito a um ano de licença”, comparou o médico.
Embora as mães brasileiras contem com algum apoio governamental, lembra Victora, ainda faltam políticas que auxiliem as mães após o período de licença-maternidade, como a instalação de creches nas empresas e formas de facilitar a ordenha e o armazenamento do leite materno às mães que trabalham fora de casa. Também falta apoio dos próprios profissionais de saúde. “Às vezes, um médico ou enfermeiro acha mais fácil recorrer às fórmulas em substituição ao leite materno do que ensinar a mãe a amamentar porque é uma coisa que requer paciência. Até o aleitamento materno ser estabelecido, leva alguns dias e não é fácil para algumas mães, que têm dificuldade porque o mamilo dói, tem alguma rachadura e o bebê chora muito. Tem que ter um profissional ali do lado olhando a mamada e corrigindo o posicionamento do bebê e da mãe. E para ter esse acompanhamento, é preciso políticas públicas.”
Impacto econômico de uma amamentação prolongada poderia chegar a US$ 302 bilhões ao ano em todo o mundo