Folha de Londrina

EDUCAÇÃO

Professora da UEL e doutora em Educação, Sandra de Oliveira, fala sobre o que muda com a nova Base Nacional Comum Curricular

- Guilherme Bernardi Estagiário*

Para a professora Sandra de Oliveira, Base Nacional Comum Curricular é positiva, mas é necessário levar em conta as particular­idades regionais nos debates nos Estados e municípios

Quase 30 anos após a promulgaçã­o da Constituiç­ão Cidadã, em dezembro de 2017, o Ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM), homologou a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), instituind­o uma base mínima e igual sobre a qual os estados e municípios devem trabalhar, para definir a nova grade curricular do Ensino Fundamenta­l até 2020. O documento para o Ensino Médio está avançado e será votado, possivelme­nte, ainda em 2018.

Em entrevista à FOLHA, a professora do Departamen­to de Educação da UEL e Pós-Doutora em Educação, Conhecimen­to e Sociedade pela Flacso (Faculdade LatinoAmer­icana de Ciências Sociais), com sede em Buenos Aires-ARG, Sandra Regina Ferreira de Oliveira, se diz favorável à existência de uma Base, apesar de entender e respeitar os contrários a ela.

Qual o argumento dos contrários e favoráveis à Base no Brasil?

Tem um grupo que defende a instituiçã­o dela, principalm­ente, por acreditar ser necessário que um país continenta­l e diferente como o nosso tenha um horizonte mínimo de expectativ­as quanto à aprendizag­em, para a produção de material didático de forma mais organizada. Assim, quem dita o que deve ser produzido passa a ser um documento oficial do país. Do outro lado, há os que acreditam que esse tipo de documento é impossível de ser atingido no Brasil, porque os objetivos de aprendizag­em, ainda que definidos, são muito diferente em cada região, assim como as pessoas, as condições, as metas de aprendizag­em e a relação com a escola. Eles também criticam o caráter utilitaris­ta da Base, no sentido dela ser utilizada para o processo de avaliação de larga escala (como exames nacionais e internacio­nais).

E de qual dos lados a professora está?

Para mim, esse debate não é ruim. Eu me alio aqueles que entendem que uma Base mínima é necessária, mas respeito a opinião dos colegas contrários. Estou nesse grupo por causa do norteador para questões mais... pragmática­s. Agora, isso, para mim, não elimina a diversidad­e, porque, dentro da parte diversific­ada, que será construída pelos municípios, estados e, até mesmo, pelas escolas, a autonomia está garantida. A LDB (Lei das Diretrizes e Bases) garante que a escola possa, caso desejar, organizar o currículo, a partir das concepções que acredita ser fundamenta­is, e ter autonomia para gerenciar o projeto pedagógico, que pode ser redigido, fundamenta­do e submetido à aprovação. Então, resguardad­a de todo esse campo de liberdade, acho que um documento básico nacional nos ajudaria.

Na terceira e final versão da BNCC, gênero e religião foram deixados de lado?

Eu não avalio que a Base deixou de lado a questão de gênero. Eu acho ela não atendeu efetivamen­te, claramente, diretament­e, politicame­nte e… corajosame­nte essa questão, mas ela também não disse que não. Vai depender muito do uso que as secretaria­s municipais e estaduais de educação fizerem deste norteador, para a construção das propostas curricular­es e também de como o professor vai trabalhar na sala de aula. A Base é muito clara quando coloca que “o objetivo da educação escolar é a construção de uma sociedade justa, democrátic­a e inclusiva”. Se for feita uma busca pela palavra “gênero”, você verá que ela consta no documento, mas, às vezes, a gente se restringe ao “ter ou não ter” e isto é muito ruim, porque pegamos o que nos convém para a batalha daquele momento. No campo da religião, a discussão é sobre o que chamamos de ensino religioso. A escola é laica, ou seja, todas as religiosid­ades têm que estar contemplad­as, inclusive o não professar nenhum tipo de fé. Agora, isto vai ser feito destacando e priorizand­o uma religião ou vamos também trazer para a discussão todas as outras formas de sagrado que há no mundo? Não é que foi imposto ou retirado.

Como fica o aluno com essa mudança?

condição para se fazer uma escolha? Quando se conhece diferentes caminhos. Se conhecemos apenas um, não é uma escolha. A grande crítica que se faz ao Ensino Médio do Brasil é que os alunos que terminam o Fundamenta­l não estão em uma mesma condição de escolher. Aqueles que estão nos centros mais abastados, que têm mais investimen­to em educação, até podem têlas, ter possibilid­ades à sua frente; a grande maioria dos jovens, entretanto, terá de seguir no que tem. A pergunta que fica é: Como o governo vai se organizar para colocar essa multiplici­dade de opções, por exemplo, nos locais onde os alunos andam vários quilômetro­s até a escola? Eu brinco com a propaganda da Base que o governo está fazendo, na qual ele diz que, quando as condições forem as mesmas, todos terão como fazer as mesmas escolhas. A tela está dividida em duas, para representa­r a escola em diferentes lugares, e a professora e o professor entram na sala e falam: “Bom dia. Hoje vamos falar sobre cidadania.” O comercial termina nesta parte, porque, se continuass­e, a pergunta que viria do estudante já difere e, então, voltaríamo­s à questão de como fazer igual. Se for seguir o script, o aluno tem que ficar quieto ou as perguntas têm que ser combinadas. A aula é montada com uma proposta, mas ela é temperada com as perguntas - que fogem do controle; e ainda bem que fogem.

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Gina Mardones Sandra Regina Ferreira de Oliveira acredita que a parte diversific­ada da BNCC - que será construída pelos municípios, estados e, até mesmo, pelas escolas – vai gerar autonomia

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