As boas ações do fracasso
Em ‘As Virtudes do Fracasso’, o filósofo Charles Pépin aborda o lado positivo do fracasso nos dias atuais
Osucesso é amado por todos, ganha flores e abraços. O fracasso, por outro lado, é renegado como cão sarnento, recebe chutes e porradas.
O sucesso é acolhido e admirado, possui centenas de livros dedicados a ele. O fracasso, pelo contrário, é o patinho feio que ninguém deseja por perto.
Um dos raros livros dedicados a esse patinho feio acaba de ser lançado pela editora Estação Liberdade: “As Virtudes do Fracasso”. De autoria do filósofo francês Charles Pépin, a obra é um ensaio filosófico que revela o lado positivo do malogro, do insucesso, do erro, da derrota. Um dos livros mais vendidos na França em 2016, a obra já foi publicada em 14 países.
Nas palavras do autor, existem várias virtudes presentes no fracasso: “Há fracassos que acarretam um fortalecimento da vontade, outros que resultam em seu afrouxamento; há fracassos que nos dão força para perseverar no mesmo caminho, e os que oferecem o impulso para transformá-lo. Há os fracassos que nos tornam mais combativos, os que nos tornam mais sábios, e há também os que nos tornam simplesmente disponíveis para outra coisa.”
O sucesso pode ser a coisa mais agradável do mundo, mas geralmente possui ensinamentos menos ricos do que os ensinamentos do fracasso. Essa parece ser a tese apresentada por vários filósofos ao longo dos séculos. Charles Pépin escolhe várias vertentes, apresenta leituras epistemológica, dialética, cristã, estóica, existencialista e psicanalítica, entre outras.
A leitura existencialista e a psicanalítica são as duas que se completam, como duas faces de uma mesma moeda. A existencialista demonstra que fracassar é nos perguntar em que podemos nos transformar. A psicanalítica demonstra que fracassar é nos perguntar quem somos e qual o nosso desejo mais profundo.
Divulgador da filosofia para massas, Pépin consegue reunir em suas palestras um amplo leque de público. Uma de suas estratégias está em associar filosofia a referências da vida cotidiana e do mundo midiático. De um lado faz uso do pensamento de Marco Aurélio, Sartre, Kant, Freud, Nietzsche, Hegel, Bachelard e Lacan, de outro utiliza depoimentos de Steve Jobs, Rafael Nadal, Thomas Edison e J. K. Rowling.
A mais interessante abordagem presente em “As Virtudes do Fracasso” reside na ideia do fracasso como algo capaz de impulsionar os olhos para novos caminhos até então nunca vistos, inesperados: “Nossos fracassos podem ter a virtude de nos tornar disponíveis, de facilitar uma mudança de rumo, uma guinada existencial que terá resultados favoráveis. Às vezes, seu sentido se materializa nessa direção nova que eles dão à nossa vida. Essa é outra virtude do fracasso: ele não nos torna necessariamente mais sábios, mais humildes ou fortes, mas apenas disponíveis para uma coisa totalmente diferentes.”
Em sua obra, que pode ser considerada dentro da nova vertente da “autoajuda filosófica”, Charles Pépin não entra no campo do fracasso total. Aquele fracasso em que não há superação, onde não há sabedoria, não há transformação, não há salvação. Onde não há a volta por cima, apenas o velho e renegado cão sarnento tratado a chutes e porradas.
“As Virtudes do Fracasso” transpira o otimismo onde o fracasso só faz sentido quando superado. Só quando ele dá origem a algo maior que ele.