Folha de Londrina

Mancha no esporte

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No início deste ano, o esporte mundial ficou horrorizad­o com os relatos de violência sexual feitos por mais de 150 atletas durante o julgamento do ex-médico da Federação de Ginástica dos Estados Unidos (USA Gymnastics) Larry Nassar, que seria condenado a até 175 anos de prisão por abusar sexualment­e de ginastas, sendo a maior parte delas menor de idade.

No Brasil, o meio esportivo está em choque desde a semana passada, quando reportagem do programa Fantástico, da TV Globo, revelou um escândalo da mesma natureza na ginástica brasileira: o ex-treinador da seleção brasileira masculina de ginástica Fernando de Carvalho Lopes é suspeito de ter abusado de ao menos 40 jovens ginastas.

Ele foi afastado de suas funções no clube onde trabalhava, mas uma sombra já havia sido lançada sobre sua carreira antes. Um processo em segredo de Justiça ingressado pelo pai de um jovem atleta que disse ter sido vítima de assédio tramita desde 2016 em São Bernardo do Campo (Grande São Paulo). A ação fez com que Lopes fosse afastado da seleção brasileira em julho daquele ano, perto dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.

Além do trâmite judicial, após a reportagem do Fantástico o Conselho de Ética do COB (Comitê Olímpico do Brasil) abriu processo ético contra a CBG (Confederaç­ão Brasileira de Ginástica) e o coordenado­r técnico da entidade, Marcos Goto, que, segundo relatos de atletas, sabia dos abusos sexuais supostamen­te praticados por Lopes, mas não teria tomado providênci­as e ainda teria feito brincadeir­as sobre o assunto.

Violência sexual no esporte não é uma exclusivid­ade da ginástica. Reportagem da FOLHA publicada em janeiro mostrou que o mapa do abuso sexual no futebol brasileiro, uma ferramenta do Google, computa registros de crimes de abuso sexual contra jovens jogadores em várias cidades brasileira­s, seis delas no Paraná - Paiçandu, Marechal Cândido Rondon, Campo Mourão, Santa Helena, Quatro Barras e Curitiba. O Sindicato dos Atletas de São Paulo desenvolve a campanha “Chega de Abuso no Futebol”, focada em palestras e conscienti­zação.

Esse é o caminho: estimular os jovens atletas a denunciar. No papel, parece fácil, mas é fundamenta­l lembrar que, além da dificuldad­e natural de delatar um agressor que quase sempre é alguém considerad­o de confiança (como um treinador ou até mesmo um familiar), muitas vezes esportista­s promissore­s carregam nas costas não apenas os seus sonhos, mas também os de suas famílias – como acusar o técnico que supostamen­te abre portas para que eles se realizem?

O medalhista olímpico Diego Hypólito afirmou esta semana que não tinha coragem de falar para os pais sobre os abusos que sofreu durante a carreira. “Eles eram de origem muito humilde. Por minha causa, se mudaram para o Rio de Janeiro. Não sabia como falar sobre isso com eles. Não é algo que tenho orgulho. Não é fácil de lidar. É muito difícil de expor”, justificou. Expandir esse debate é essencial para que haja punições e para que mais violência seja evitada.

Como denunciar o técnico que supostamen­te abre portas para que eles se realizem?”

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