Discutindo ciência na mesa de bar
Londrina recebeu pela primeira vez evento que leva o assunto para ser debatido em ambientes mais descontraídos
Um telão, pessoas ao microfone ministrando palestras sobre ciência e um público bastante interessado no assunto. O Festival Pint of Science, que aconteceu nesta semana em Londrina, teve a participação de pesquisadores de diferentes áreas. A diferença, e o inusitado, é que as palestras foram realizadas em bares. O objetivo é ter conversas informais sobre temas científicos em um ambiente descontraído.
A ideia surgiu quando dois pesquisadores do Imperial College London, Michael Motskin e Praveen Paul, organizaram um evento em 2012, em que pessoas com Alzheimer, Parkinson, doenças neuromusculares e esclerose múltipla foram convidadas a conhecer os laboratórios dos cientistas e ver de perto o tipo de pesquisa que realizavam. A experiência foi tão inspiradora que a dupla decidiu propor um evento em que os pesquisadores pudessem sair das universidades e institutos de pesquisa para conversar diretamente com as pessoas. Assim, em maio de 2013, surgiu o Pint of Science.
De lá para cá, o evento cresceu – neste ano foram 21 países participantes – e a meta é ampliá-lo cada vez mais. O professor de física Eduardo Inocente Jussiani explica que docentes e alunos da UEL (Universidade Estadual de Londrina) foram os responsáveis pela organização da primeira edição londrinense, que começou na segunda-feira (14) e terminou na quarta. As palestras aconteceram no Cheers Irish Pub e no Pier Santa Mônica, dois locais movimentados da noite londrinense.
“Este festival é a cara de Londrina. A cidade tem muitos bares e vida noturna bastante movimentada. A ciência não precisa ser formal. A gente pode criar um ambiente informal para falar sobre pesquisas e descobertas. Acho que a ideia é justamente quebrar esse estigma, que discutir ciência requer ambientes formais e livros.”
“Para nós é uma grande honra poder debater esse conhecimento fora da universidade, levar os docentes e cientistas para conversar com a população em um ambiente descontraído. Esse é nosso maior objetivo”, apontou o farmacêutico André Bacchi, também da organização do festival. “Estudar não é castigo. Estudar, conhecer os assuntos e se aprofundar nos temas é gostoso”, destacou.
Segundo ele, a ciência usa linguagem científica e cada área tem seu aprofundamento próprio e usa jargões específicos. Ele explica que todas as ciências possuem suas aplicações e utilidades, mas falta gente para traduzir tudo isso. “É preciso se desprender da linguagem acadêmica para que todo mundo possa aprender. O Mundo de Beakman fazia muito isso e eu assistia muito isso”, apontou o farmacêutico, se referindo a um programa de TV em que eram realizadas experiências que podiam ser reproduzidas em casa. “A gente quer retomar esse tipo de linguagem para tornar a ciência mais acessível para a população.”
DIFERENTES PERFIS
Muita gente jovem, com diferentes perfis, participou do festival. O estudante de engenharia civil na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Alexandre Jarufe, 22, estava de passagem por Londrina quando recebeu o convite de amigos. “Em geral os professores reclamam que a gente não presta atenção na aula, mas aqui a gente veio aqui porque quis. Nós tivemos a iniciativa de querer aprender, livre do academicismo. Discuti ciência com os amigos sem ter a pressão de uma sala de aula, onde tudo é quieto”, declarou o jovem, que esteve no Cheers Irish Pub na noite de segunda-feira. Por ser aluno de engenharia, uma das palestras que ele mais gostou foi sobre a mecânica quântica, ministrada por Felipe Soares Sá, mestre em física pelo IFUSP (Instituto de Física da Universidade de São Paulo).
O estudante do 5º ano de psicologia Arthur Lorenzo, 23, gostou bastante do festival. “Parece que não combina, mas no fundo é bem legal. Geralmente a gente associa o aprender com acordar de manhã, carregar cadernos, mas aqui você está aprendendo e pode debater com a pessoa na mesa do bar.”
A psicóloga e mestranda em análise do comportamento Isabela Zanini, 26, ressaltou que o festival traz a proposta de divulgação de temas diversificados de maneira que atraia mais o público jovem pelo ambiente. “Isso só aumenta a probabilidade da gente vir e frequentar eventos desse tipo. Ele fala de temas que são relativamente difíceis de serem entendidos de uma maneira fácil”, observou.
O estudante de letras Marcos de Oliveira Gonçalves Santos, 22, gosta muito de ciência e foi isso que o atraiu para o evento. “Vim pelo tema ‘Pseudociência e a era do irracionalismo’. A pseudociência é um mau uso da ciência que pega um pedacinho de jargões científicos para dar credibilidade, mas acaba fornecendo informações erradas sobre o mundo. O que eles fazem aqui no evento é trazer a informação correta para o público”, reforçou.
“Discuti ciência com os amigos sem a pressão de uma sala de aula, onde tudo é quieto”
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