Iniciativa popular para propor leis ainda e tímida no País
O projeto de iniciativa popular que pede a revogação da lei que aumentou o IPTU em Londrina traz à tona um instrumento forte para a democracia e a garantia do exercício da cidadania, mas que anda em desuso nos últimos tempos: a mobilização da sociedade ci
Quase 27 mil assinaturas vão ser anexadas, nesta segunda-feira (4) ao projeto de lei de iniciativa popular que pede a revogação da lei 12.575, que aumentou o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) em Londrina. A informação é do advogado Jorge Custódio, um dos representantes dos movimentos populares que encabeçam a campanha. A iniciativa traz à tona um instrumento forte para a democracia e a garantia do exercício pleno da cidadania, mas que anda em desuso nos últimos tempos: a mobilização da sociedade civil organizada em questões políticas que a afetem diretamente.
Caso o movimento londrinense obtenha êxito, será apenas a segunda lei de iniciativa popular a tramitar na história da Câmara de Londrina. A primeira a reunir milhares de rubricas, há 18 anos, virou lei municipal que regulamentou o serviço de mototaxistas no município, após pressão da categoria. Para apresentar proposta dessa natureza à Casa, é necessário obter assinaturas de pelo menos 5% dos eleitores de Londrina, como prevê a Constituição de 1988.
Já a Assembleia Legislativa do Paraná, na sua história, nunca aprovou projeto semelhante. Uma proposta para tentar barrar uma possível venda da Copel chegou a tramitar, mas não prosperou em 2001 (leia na pág.5). No âmbito nacional, quatro projetos chegaram ao Congresso como iniciativa popular, entre eles a Lei da Ficha Limpa, uma das importantes leis anticorrupção. Entretanto, nenhum dos quatro projetos de fato foi efetivamente finalizado como iniciativa popular. Isso porque a Câmara dos Deputados afirma não ter condições de verificar se as milhões de assinaturas desses projetos são autênticas. Assim, mesmo coletando as assinaturas necessárias, alguns deputados tiveram que adotar as matérias como se fossem de sua autoria.
Para o professor do departamento de ciência política da UFPR (Universidade Federal do Paraná) Rafael Sampaio, a própria exigência da quantidade de assinaturas, por si só, é um limitador. “É normal que isso acabe acontecendo. Ou seja, quando provocado pela comunidade um parlamentar acaba apresentando esse projeto. Esta é uma forma do parlamento ficar atento às demandas da sociedade civil.”
O cientista político argumenta ainda que mesmo que o projeto não alcance a quantidade mínima definida pela Constituição, a matéria de apelo popular chega ao objetivo de conquistar apoio ou até mesmo de constranger a Câmara e tem, muitas vezes, “efeito positivo”. Ainda segundo Sampaio, as instituições (Câmara de Vereadores, Assembleia Legislativa e Congresso) precisam estar atentas a essa demanda e abrir um canal direto para facilitar projetos de iniciativa popular. O cientista político ainda sugere que haja investimento no Brasil em ferramentas on-line mais atualizadas e modernas. “É importante institucionalizar a participação popular, modernizar o próprio regimento. Se um deputado não tiver essa sensibilidade, essa percepção, isso acaba não acontecendo.”
Para o professor, a participação tradicional por meio de manifestações e abaixoassinados tem dado lugar a movimentos modernos nas redes sociais. “Eles são menos exigentes, mais efêmeros como o uso de hashtags em apoio às causas mais pontuais, como ocorreu em 2013.”
BAIXA PARTICIPAÇÃO
O professor de ética e filosofia política da UEL (Universidade Estadual de Londrina), Elve Cenci, cita aspectos históricos que inibiram participação popular na política como os longos períodos de ditadura. “Somos um país com baixa cultura democrática. Isso explica até esses movimentos clamando por medidas autoritárias com a intervenção militar. Fomos acostumados com práticas autoritárias. Exigir direitos é mal visto, muitas vezes.”
Segundo ele, esse fator impede a participação dos eleitores que não conhecem esses mecanismos como projeto de iniciativa popular e plebiscitos.
Para Cenci, outro fator que afasta o eleitor da política é a própria postura dos parlamentares: “Geralmente é uma postura reticente. Muitos afirmam: se alguém quiser legislar que vá pedir votos.” Ou seja, eles esquecem que precisam sistematizar as demandas da população. ”A democracia é uma via de mão dupla”, destaca Cenci
Na análise do professor da UEL, outro aspecto que reforça esses despreparo do Legislativo é que quando há um governo forte, a Assembleia e o Congresso ficam a reboque das demandas do Executivo com pouca abertura para demanda externa. “A pauta depende desses acertos e dessa subserviência e fica cada vez mais distante da sociedade.”