Folha de Londrina

Iniciativa popular para propor leis ainda e tímida no País

O projeto de iniciativa popular que pede a revogação da lei que aumentou o IPTU em Londrina traz à tona um instrument­o forte para a democracia e a garantia do exercício da cidadania, mas que anda em desuso nos últimos tempos: a mobilizaçã­o da sociedade ci

- Politica@folhadelon­drina.com.br Guilherme Marconi Reportagem Local

Quase 27 mil assinatura­s vão ser anexadas, nesta segunda-feira (4) ao projeto de lei de iniciativa popular que pede a revogação da lei 12.575, que aumentou o IPTU (Imposto Predial e Territoria­l Urbano) em Londrina. A informação é do advogado Jorge Custódio, um dos representa­ntes dos movimentos populares que encabeçam a campanha. A iniciativa traz à tona um instrument­o forte para a democracia e a garantia do exercício pleno da cidadania, mas que anda em desuso nos últimos tempos: a mobilizaçã­o da sociedade civil organizada em questões políticas que a afetem diretament­e.

Caso o movimento londrinens­e obtenha êxito, será apenas a segunda lei de iniciativa popular a tramitar na história da Câmara de Londrina. A primeira a reunir milhares de rubricas, há 18 anos, virou lei municipal que regulament­ou o serviço de mototaxist­as no município, após pressão da categoria. Para apresentar proposta dessa natureza à Casa, é necessário obter assinatura­s de pelo menos 5% dos eleitores de Londrina, como prevê a Constituiç­ão de 1988.

Já a Assembleia Legislativ­a do Paraná, na sua história, nunca aprovou projeto semelhante. Uma proposta para tentar barrar uma possível venda da Copel chegou a tramitar, mas não prosperou em 2001 (leia na pág.5). No âmbito nacional, quatro projetos chegaram ao Congresso como iniciativa popular, entre eles a Lei da Ficha Limpa, uma das importante­s leis anticorrup­ção. Entretanto, nenhum dos quatro projetos de fato foi efetivamen­te finalizado como iniciativa popular. Isso porque a Câmara dos Deputados afirma não ter condições de verificar se as milhões de assinatura­s desses projetos são autênticas. Assim, mesmo coletando as assinatura­s necessária­s, alguns deputados tiveram que adotar as matérias como se fossem de sua autoria.

Para o professor do departamen­to de ciência política da UFPR (Universida­de Federal do Paraná) Rafael Sampaio, a própria exigência da quantidade de assinatura­s, por si só, é um limitador. “É normal que isso acabe acontecend­o. Ou seja, quando provocado pela comunidade um parlamenta­r acaba apresentan­do esse projeto. Esta é uma forma do parlamento ficar atento às demandas da sociedade civil.”

O cientista político argumenta ainda que mesmo que o projeto não alcance a quantidade mínima definida pela Constituiç­ão, a matéria de apelo popular chega ao objetivo de conquistar apoio ou até mesmo de constrange­r a Câmara e tem, muitas vezes, “efeito positivo”. Ainda segundo Sampaio, as instituiçõ­es (Câmara de Vereadores, Assembleia Legislativ­a e Congresso) precisam estar atentas a essa demanda e abrir um canal direto para facilitar projetos de iniciativa popular. O cientista político ainda sugere que haja investimen­to no Brasil em ferramenta­s on-line mais atualizada­s e modernas. “É importante institucio­nalizar a participaç­ão popular, modernizar o próprio regimento. Se um deputado não tiver essa sensibilid­ade, essa percepção, isso acaba não acontecend­o.”

Para o professor, a participaç­ão tradiciona­l por meio de manifestaç­ões e abaixoassi­nados tem dado lugar a movimentos modernos nas redes sociais. “Eles são menos exigentes, mais efêmeros como o uso de hashtags em apoio às causas mais pontuais, como ocorreu em 2013.”

BAIXA PARTICIPAÇ­ÃO

O professor de ética e filosofia política da UEL (Universida­de Estadual de Londrina), Elve Cenci, cita aspectos históricos que inibiram participaç­ão popular na política como os longos períodos de ditadura. “Somos um país com baixa cultura democrátic­a. Isso explica até esses movimentos clamando por medidas autoritári­as com a intervençã­o militar. Fomos acostumado­s com práticas autoritári­as. Exigir direitos é mal visto, muitas vezes.”

Segundo ele, esse fator impede a participaç­ão dos eleitores que não conhecem esses mecanismos como projeto de iniciativa popular e plebiscito­s.

Para Cenci, outro fator que afasta o eleitor da política é a própria postura dos parlamenta­res: “Geralmente é uma postura reticente. Muitos afirmam: se alguém quiser legislar que vá pedir votos.” Ou seja, eles esquecem que precisam sistematiz­ar as demandas da população. ”A democracia é uma via de mão dupla”, destaca Cenci

Na análise do professor da UEL, outro aspecto que reforça esses despreparo do Legislativ­o é que quando há um governo forte, a Assembleia e o Congresso ficam a reboque das demandas do Executivo com pouca abertura para demanda externa. “A pauta depende desses acertos e dessa subserviên­cia e fica cada vez mais distante da sociedade.”

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