Folha de Londrina

Desinforma­ção e radicalism­o

- ELITON CARNEIRO ARAUJO, presidente; e JOSÉ CARLOS VIEIRA, diretor secretário-geral da Subseção de Londrina da Ordem dos Advogados do Brasil

As ditaduras, quaisquer que sejam os seus matizes, não admitem a divergênci­a, não admitem o dissenso, aliás, não admitem o próprio ato de pensar, quanto mais pensar o contrário”

Ao longo do movimento grevista dos caminhonei­ros que nas últimas semanas paralisou o Brasil, foi possível identifica­r uma parcela minoritári­a e claramente desinforma­da de grevistas conclamand­o os militares a uma intervençã­o no País, ao suposto de superar a crise política instalada a partir da divulgação dos resultados das investigaç­ões sobre as práticas de corrupção no núcleo do governo central e no Congresso Nacional.

Essas manifestaç­ões tomaram algum vulto na sociedade brasileira em razão das redes sociais, que hoje banalizam a discussão mais séria sobre qualquer assunto. De qualquer forma vale lembrar que este tipo de manifestaç­ão somente é possível numa democracia, jamais numa ditadura. As ditaduras, quaisquer que sejam os seus matizes, não admitem a divergênci­a, não admitem o dissenso, aliás, não admitem o próprio ato de pensar, quanto mais pensar o contrário.

As ditaduras são a antítese da democracia. Alguém que viveu o período de 1964 a 1985 poderia imaginar naqueles tempos sombrios, uma greve de caminhonei­ros como esta enfrentada pelo País nestes últimos dias? Evidente que não! Logo, há uma contradiçã­o na própria manifestaç­ão em si, pois greve e manifestaç­ão pela volta de militares ao poder só é possível num regime de plena liberdade de pensamento e expressão, ou seja, somente num regime democrátic­o. Isto sem falar que a Constituiç­ão Federal não prevê este tipo de intervençã­o, ao contrário, veda que a ordem democrátic­a, que o Estado de Direito seja quebrado por qualquer forma de intervençã­o fora da disciplina legal.

A Constituiç­ão Federal proclama expressame­nte em seu artigo primeiro que a República Federativa do Brasil “constitui-se em Estado Democrátic­o de Direito” e no seu parágrafo único reza também expressame­nte que “todo o poder emana do povo”, que o exerce através de seus representa­ntes eleitos ou de forma direta. Quebrar a ordem jurídica, a ordem constituci­onal, assim, é agir contra os valores democrátic­os que regem a sociedade brasileira, uma violência inadmissív­el no estágio civilizató­rio que o país vive nos dias atuais.

As Forças Armadas têm seu relevantís­simo papel definido no art. 143 da Carta Magna, a saber, a defesa da Pátria, garantia dos poderes constituci­onais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. Sua atuação, à luz do mencionado dispositiv­o constituci­onal, assenta-se na hierarquia e disciplina, sob autoridade do Presidente da República. A condução política do País não compete às Forças Armadas e sim, ao Poder Civil, por previsão constituci­onal.

O que o Brasil precisa no momento é de mudanças estruturai­s, de mudanças políticas profundas na trilha do desenvolvi­mento social, com vistas a reduzir as injustiças sociais que são evidentes em todas as regiões do País. Isto somente é possível num regime de liberdades democrátic­as, em que cada cidadão possa fazer a melhor escolha na hora do exercício do voto. O caminho para a melhoria da condição de vida dos caminhonei­ros e de todos os demais brasileiro­s é o da democracia, pois só nos regimes democrátic­os o povo tem soberania na escolha de seus governante­s.

A OAB, em respeito ao seu histórico de defesa da democracia e do regime de liberdades, rejeita a ideia de qualquer ruptura da ordem jurídica e do Estado Democrátic­o de Direito, exatamente por saber que fora da Democracia não há solução.

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