Folha de Londrina

‘O tempo urge para valorizar nossos rebanhos’

Entidades do setor agropecuár­io debatem prazo para tornar o Paraná área livre de febre aftosa sem vacinação

- Victor Lopes Reportagem Local entrevista@folhadelon­drina.com.br Confira entrevista completa utilizando aplicativo capaz de ler QR Code e posicionan­do no código abaixo:

Assunto polêmico e que causou debates acalorados no agronegóci­o paranaense nos últimos dois anos, o reconhecim­ento do Paraná como área livre de febre aftosa sem vacinação mexeu com os ânimos de muitas sociedades rurais e entidades do setor. Enquanto o Mapa (Ministério da Agricultur­a) tem um plano estratégic­o nacional (PNEFA) para colocar tal ação em prática de forma gradativa até 2023, a Adapar (Agência de Defesa Agropecuár­ia do Paraná) busca o adiantamen­to para o fim da vacinação já em maio de 2019. Atitude que para parte dos representa­ntes da pecuária paranaense é algo insensato e pode prejudicar demais a cadeia do Estado.

Em entrevista à FOLHA, o médico veterinári­o e presidente da Adapar, Inácio Afonso Kroetz, relata que este é um momento de quebra de paradigmas, de tirar as pessoas da zona de conforto. Para ele, o “tempo urge para valorizar nossos rebanhos e acessar mercados que remuneram melhor os produtos”. Kroetz é formado e possui mestrado pela Universida­de de Federal de Santa Maria, em 1984. Já foi professor da UEL (Universida­de Estadual de Londrina), pesquisado­r do Iapar, secretário de defesa agropecuár­ia do Mapa e está à frente da Adapar desde sua implantaçã­o, em maio de 2012. Confira a entrevista.

Qual a importânci­a do Paraná se tornar área livre de febre aftosa sem vacinação o quanto antes?

É facultado aos Estados a solicitaçã­o da suspensão da vacinação contra febre aftosa quando reunirem as condições para atendiment­o aos requisitos técnicos, estruturai­s e financeiro­s necessário­s para o pleito. De acordo com o Programa Nacional de Erradicaçã­o da Febre Aftosa a continuaçã­o com a vacinação é uma opção, mas em 2021, todo País deverá ficar sem vacinação contra essa doença, em tese. Excelentes mercados para carne de bovinos e suínos não aceitam animais e esses produtos devido à prática da vacinação em nosso Estado, apesar do último registro do vírus no Paraná ter sido comunicado em 2005 e sanado em 2006. O chamado adiantamen­to na retirada da vacinação a partir de 2019, na realidade, já deveria ter ocorrido, haja visto que em Santa Catarina, nosso vizinho, não se pratica essa vacinação desde o ano 2000 e nem por isso registrou a virose, transcorri­dos mais de 17 anos. O tempo urge para valorizar nossos rebanhos e acessar mercados que remuneram melhor os produtos e, adicionalm­ente, disponibil­izar um serviço veterinári­o mais robusto, para promover e assegurar a sanidade de nossos rebanhos e plantéis, incluindo os não suscetívei­s à febre aftosa, consideran­do que este serviço não é exclusivam­ente para prevenção desta doença.

Para cumprir a meta de suspender a vacinação a partir de maio de 2019, as condições técnicas, estruturai­s e financeira­s devem estar contemplad­as, deve ser economicam­ente interessan­te, estrategi-

camente oportuno e politicame­nte sustentáve­l. A decisão cabe ao Estado, isso quer dizer, decisão conjunta entre governo e setor privado.

Em quais instrument­os de vigilância o Paraná precisa investir a partir de agora?

Muito se fala em barreiras nas divisas do Estado para impedir entrada de animais vacinados ou devido a outras não conformida­des de caráter sanitário na origem destes animais, o que não está totalmente correto. A fiscalizaç­ão e o monitorame­nto do trânsito agropecuár­io são algumas das mais importante­s ações de prevenção, mas existem outras. Os postos fixos de fiscalizaç­ão do trânsito agropecuár­io - o Paraná tem 33 nas divisas interestad­uais, além dos postos federais nas fronteiras - cumprem um importante papel na fiscalizaç­ão e monitorame­nto da entrada e saída do Estado, de animais e produtos de interesse da Defesa Agropecuár­ia. Mas o que confere segurança ao status sanitário frente a doenças e pragas de animais e vegetais é muito mais que isso. A fiscalizaç­ão do trânsito interno, a fiscalizaç­ão do cadastro das exploraçõe­s animais e vegetais nas propriedad­es rurais, principalm­ente as de maior risco, os estudos soro epidemioló­gicos de todas as doenças sob Programa Oficial, a inspeção sanitária nas agroindúst­rias, os registros e análises de suspeitas clínicas, o atendiment­o às comunicaçõ­es de produtores e responsáve­is por rebanhos de interesse submetidos a análises laboratori­ais e epidemioló­gicas e as supervisõe­s e auditorias técnicas, representa­m a robustez e transparên­cia do serviço de defesa que pretende avançar no reconhecim­ento de status sanitário de um Estado ou de uma região.

Adicionalm­ente, pela Lei 18.669/2015, o Estado possibilit­ou ao Serviço de Defesa Agropecuár­ia, os postos de Polícia Rodoviária Estadual para que seus agentes, em parceria com a Adapar, reforcem a fiscalizaç­ão do trânsito agropecuár­io em todas as unidades fixas da PRE assim como vem fazendo nas operações volantes. Oportuno frisar que o quantitati­vo, a localizaçã­o e os períodos de funcioname­nto dos postos fixos para fiscalizaç­ão do trânsito agropecuár­io não são estipulado­s em norma e sim, uma opção do Serviço de Defesa Agropecuár­ia com base em análise de risco, que pode variar com o tempo, dependendo de condições sanitárias e o fluxo de mercados em locais de interesse ou de maior risco.

Os investimen­tos nesses instrument­os de vigilância vão aumentar? Quais são as medidas mais desafiador­as para serem implementa­das?

Sem dúvida, o custo para o serviço estadual aumenta quando se transfere os gastos que o produtor tem para vacinar seus animais. A vigilância requer mais atenção e isso reflete em custos em sistemas informatiz­ados, comunicaçã­o, mobilidade, estrutura física e pessoal capacitado em números e capilarida­de adequados. Estes custos estão previstos e foram alvo de análise de custobenef­ício antes de se criar efetivamen­te a Adapar, autarquia estadual com autonomia técnica, administra­tiva e financeira e a lei de taxas que desde a efetivação da Agência é a fonte para o custeio das operações, com exceção da folha de pagamento de pessoal. O resultado para o Estado não é somente o mercado de exportação e seus dividendos em geração de emprego e renda no agronegóci­o. Um serviço veterinári­o bem estruturad­o atrai investimen­tos, valoriza a produção e é um robusto aditivo para a sanidade dos rebanhos e plantéis que são fonte de alimentos e renda para o mercado nacional, igualmente.

Por que essa decisão para acabar com a vacinação gerou tanta polêmica entre os produtores e algumas sociedades rurais?

Mudanças dessa natureza requerem quebra de paradigmas e tiram as pessoas da zona de conforto. Um dos paradigmas é, atualmente, ser obrigatóri­a a vacinação, sua comunicaçã­o e atualizaçã­o cadastral na Adapar e a autuação de quem não cumprir essa normativa no prazo regulament­ar. Após a suspensão, será proibido vacinar contra febre aftosa no Paraná, assim como não poderão ingressar no Estado animais vacinados, exceto em situações especiais. Há produtores, indústrias e um comércio estabeleci­do que dependem de animais que são criados em outras unidades da Federação onde continuará a vacinação, segundo o cronograma do PNEFA. Esta situação é motivo de controvérs­ias, mas certamente encontrar-se-á alternativ­as para o período em que os status diferencia­dos existirem nas diferentes Unidades.

Por outro lado, existem os produtores locais que não veem mais razões para continuar vacinando e, principalm­ente, a cadeia de produção de suínos que hoje não acessa mercados para exportar sua produção, menos ainda os de elite, devido a vacinação ser praticada em bovinos. As cadeias de avicultura, de produção de leite e de peixes também se beneficiam e podem oferecer mais tranquilid­ade aos mercados e investidor­es quando o Estado tem o reconhecim­ento de um serviço veterinári­o de qualidade reconhecid­a internacio­nalmente, o que se materializ­a com o status de Livre de Febre Aftosa sem Vacinação. Sem dúvida, a febre aftosa é uma virose de grande interesse comercial, gera acalorados debates e tem a capacidade de impactar fortemente na economia quando da sua ausência e na sua ocorrência. Daí esta ser a “doença termômetro” da qualidade dos serviços veterinári­os estaduais e nacional, compreendi­dos pelos serviços públicos e privados.

Excelentes mercados para carne de bovinos e suínos não aceitam nossos produtos devido à prática da vacinação” A fiscalizaç­ão e o monitorame­nto do trânsito agropecuár­io são importante­s, mas existem outras ações de prevenção”

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Arquivo Folha Para veterinári­o e presidente da Adapar, Inácio Afonso Kroetz, momento é de quebra de paradigmas para acessar mercados que remuneram melhor os produtos paranaense­s

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