O CINÉFILO FIEL
Aproveitando o momento do protagonismo feminino, produção hollywoodiana mostra que está acordada com “Oito Mulheres e Um Segredo”, onde elas dão as cartas
Na produção hollywoodiana “Oito Mulheres e Um Segredo”, as mulheres dão as cartas
Em tempos de #MeToo e #TimesUp, a produção hollywoodiana deu mostras que está bem acordada e rápida nos reflexos. Aproveitando o momento do protagonismo feminino, deu à luz a este “Oito Mulheres e Um Segredo”, filme no qual as mulheres dão as cartas. Nem por isso “Ocean’s Eight” se mete a feminista. E deixa isso claro logo de saída, quando Debbie Ocean, a personagem de Sandra Bullock, o cérebro do golpe do século (pelo menos até agora, mas logologo virá trama ainda mais milionária), furta batons e perfumes numa grande loja de cosméticos. Questão de prioridades do sexo forte, que cuida do glamour antes de esvaziar os cofres alheios.
Depois de um bom tempo gestando o plano na penitenciária, Debbie, irmã daquele Danny/George Clooney da refilmagem de “Onze Homens e um Segredo” (2001), está pronta para por em prática aquilo que aprendeu com as malandragens da família Ocean em três filmes de Steven Soderberg – os outros são de 2004 e 2007. E o universo era então quase inteiramente masculino, misoginia quebrada por Julia Roberts.
Como nos filmes precedentes, o que também não falta agora é elenco. Ou como diria o espectador machão, último dos moicanos: “esta mulherada está impossível”. Ou um elogio mais pesado, bem mais pesado...
O plano das meninas é se apoderar da obra-prima da joalheria, um colar Cartier avaliado em 150 milhões de dólares. O cenário dos filmes anteriores – hotéis-cassinos de Las Vegas – foi substituído aqui pela exclusivíssima gala anual do Metropolitan Museum de Nova York. É como se o ambiente reproduzisse ao vivo, a cores e aromas das mais diversas grifes, sofisticadas edições das revistas Vanity Fair e Vogue.
A quadrilha montada por Debbie e sua amiga Lou (Cate Blanchett) é um leque de correção política, para não sair do tom agora imperante no show business, todo multiétnico e reverente às minorias. Todas as ladies convocadas têm lá suas expertises, como a surpreendente e enfumaçada rasta-hacker Rihanna (além do trabalho na quadrilha, ela rouba todas as cenas em que aparece).
Muito divertidas também estão Anne Hathaway e sua designer de moda pessoal, uma Helena Bonham-Carter aparentemente saída de um set estapafúrdio de um filme de seu ex-marido, o não menos bizarro Tim Burton. Como produção, “Oito Mulheres e Um Segredo” é impecável. Mas a mão indiferente, neutra do diretor Gary Ross (“Jogos Mortais”) não encontra o melhor caminho para construir o desejado suspense. Que se esperavam qualquer estilo, desde que fosse genuíno, é bom que se diga. Mas não é: há leveza em demasia, tudo está muito bem orquestradinho, a previsibilidade reina absoluta. Além das ladras de saias, nada de novo sob o sol.
Não chega a ser um thriler, ficando nas franjas da comédia de assalto. É um filme que não assume riscos, esperando sempre que o espectador acate aquele próximo movimento. Fazem falta as qualidades de Soderberg – leveza, ritmo, swing. Mais classe, como aquela que havia de sobra lá atrás, bem lá atrás. Em 1960, mais precisamente, quando o grande Lewis Milestone dirigiu nada menos que The Rat Pack – Frank Sinatra, Dean Martin, Sammy Davis Jr. e Peter Lawford, todos orquestrados pela sonoridade genial de Nelson Riddle. Aqui Soderberg assina apenas a produção executiva. E simplesmente as estrelas masculinas foram trocadas pelas femininas. E as participações especiais (Katie Holmes, Kim Kardashian, Heidi Klum) são... as participações especiais.
Para prestar atenção. Sandra Bullock e Cate Blanchett parecem disputar tacitamente um concurso de cirurgias plásticas. Lívidas, quase cerúleas: alguém se lembra da dupla antes dos passeios pelo botox? Bem, pelo menos La Bullock está menos parecida com Michael Jackson. Ponto a favor.