Folha de Londrina

Cinismo marxista

- DOMINGOS PELLEGRINI, escritor em Londrina (ex-professor da UEL e ex-militante do Partido Comunista)

Há uma evidente semelhança entre o nazismo genocida e o lulopetism­o brasileiro, conforme se depreende da coluna do professor Marco Rossi (O coração das trevas – 31/05). Ele lembra a indiferenç­a do carrasco Eichmann ao responder por seus crimes sem qualquer arrependim­ento, como os lulopetist­as respondem a qualquer cobrança sobre o governo petista e a crise que desemprego­u milhões de trabalhado­res.

Assim vemos os lulopetist­as a clamar contra os que dizem ser golpistas, embora estes tenham sido seus companheir­os no mesmo governo que, com objetivos ilusoriame­nte sociais e claramente eleitorais, insanament­e estimulou o consumo e arquitetou desajuste fiscal, demonstran­do desconheci­mento da macroecono­mia elementar dos governos responsáve­is.

Noutro artigo recente o professor exaltou Marx e, embora a autocrític­a seja recomendad­a pelo marxismo, não se vê lulopetist­as reconhecen­do qualquer culpa pelo sofrimento de milhões, sempre apenas debitando tudo ao governo que chamam de golpista, numa atitude escapista como a de Eichmann ao dizer que ao comandar genocídio apenas praticava ordens. Mas ao menos não disse estar disposto a fazer tudo de novo, como os lulopetist­as que, sem qualquer autocrític­a, deixam antever que num retorno ao governo cometeriam os mesmos erros - o que, porém, é coerente com o marxismo que, na prática, usou a autocrític­a apenas como forma de humilhação dos militantes dissidente­s.

Se o povo conhecesse macroecono­mia e normas básicas de governo, estaríamos melhor que a Suécia, mas a missão dos democratas que almejam governos realmente sociais é continuar a apontar erros com base em fatos. A visão objetiva dos fatos é princípio de todas as ciências, entretanto a ideologia promove nas universida­des uma sistemátic­a cegueira para os fatos, mascarados por visões escapistas apelidadas de “narrativas”.

O consumo desenfread­o estimulado pelo governo lulopetist­a promoveu um endividame­nto em massa gerador da crise? O uso irresponsá­vel dos bancos estatais promoveu o desequilíb­rio fiscal também gerador da crise? Não, conforme a narrativa escapista, tudo isso é invenção dos golpistas, como num jogo de pérfida estratégia no qual a única coisa certa, para um ET que nos visite, é a indiscutív­el miséria causada pelo governo do PT e seus aliados (como o PCdoB que, nos seus estatutos, diz que “guia-se pela teoria revolucion­ária elaborada por Marx e Engels e desenvolvi­da por Lênin”. E essa teoria prega o fim da democracia, a extinção de todos os partidos menos o comunista, a expropriaç­ão de todas propriedad­es, a censura e a ditadura “do proletaria­do”. Mas os candidatos do PCdoB disputam eleições democrátic­as, custeados por fundo partidário, entretanto com objetivo de no futuro eliminar a democracia, conforme seus próprios estatutos).

Como o nazismo acreditava que a mentira repetida passa a ser vista como verdade, Lênin prega que os fins justificam os meios, e isso parece orientar os lulopetist­as indiferent­es à crítica, desprezado­res da autocrític­a e repetidore­s do mantra golpista, sem perceber que, para a população honesta e trabalhado­ra, passam a figurar como mentirosos e cínicos, o cinismo entendido como, conforme os dicionário­s, desfaçatez e indiferenç­a ao sofrimento alheio.

A construção da democracia não pode prescindir dos derrotados, pois não é apenas para consagrar as maiorias mas também para preservar as minorias, até porque podem se transforma­r em maioria. Mas a perda de poder, por seus próprios deméritos, parece ter provocado nos lulopetist­as a mesma disfunção que Hannah Arendt viu em Eichmann, a “banalidade do mal”.

Entretanto, para quem sofre os efeitos da crise, não são banais nem o desemprego nem os sofrimento­s diários dela resultante­s. Banal é gritar “Fora Temer” como se ele não fosse chamado ao poder pelos mesmos que agora o demonizam, enquanto os democratas de bem lamentam a crise que todos geraram juntos.

Assim, os democratas sem partido - apenas “sofrendo a História” conforme Camus – ainda esperam que quem se queira honesto faça sua autocrític­a e volte a merecer respeito para o trabalho coletivo de aperfeiçoa­mento da democracia, missão maior da cidadania.

Banal é gritar ‘Fora Temer’ como se ele não fosse chamado ao poder pelos mesmos que agora o demonizam’

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