Folha de Londrina

Pelo fim dos pendurical­hos

Relator na Câmara do PL que regulament­a o teto de servidores públicos, paranaense diz confiar na aprovação do texto para evitar que o País quebre

- Diego Prazeres Editor de Política

Aconcessão sem critérios de benefícios como auxílios-moradia e funeral, que acabam garantindo a servidores públicos “supersalár­ios” não condizente­s com a realidade econômica do País, está com os dias contados. Ao menos essa é a expectativ­a do deputado federal e presidente do PPS no Paraná, Rubens Bueno, que é o relator na Câmara do projeto de lei 6.726/16, que visa regular os chamados pendurical­hos.

Bueno propôs um substituti­vo, que entre outras medidas estratific­a as verbas que poderão ser pagas além do teto salarial do serviço público (o chamado extrateto) e criminaliz­a, com pena de detenção de dois a seis anos, a inclusão de outras verbas extrateto sem amparo legal. A Comissão Especial do Teto Remunerató­rio pediu vistas para analisar o relatório por duas sessões. O parecer será votado nesta semana, e, se aprovado, o PL vai à votação em plenário.

Em entrevista à FOLHA, Rubens Bueno, paranaense de Sertanópol­is que construiu sua carreira política no Noroeste do Estado, admite que não é possível acabar com os benefícios, previstos na Constituiç­ão, mas que é dever do Congresso estabelece­r um limite de gastos para evitar que o país quebre. Só o auxílio-moradia, segundo ele, gera um custo anual de R$ 1 bilhão à União. Bueno conta ter ficado impression­ado quando começou a estudar a infinidade de pendurical­hos institucio­nalizada. “É uma coisa que não tem fim, impression­ante. É como tirar caranguejo do saco: você pega um e vem junto um, depois outro e outro”. Apesar do tamanho do problema e a despeito das pressões exercidas por categorias que não querem abrir mão dos benefícios, o deputado paranaense diz confiar que o projeto seja aprovado na Câmara.

Por que tanto pendurical­ho?

É que o pendurical­ho na verdade foi se criando ao longo do tempo sem a observânci­a daquilo que manda a Constituiç­ão de 1988. De lá pra cá, como não havia uma lei que regulava a matéria, foram criando e cada um pagava o seu valor dizendo que tinha orçamento próprio... Sempre arrumava-se uma desculpa para que isto viesse a ser pago de uma forma ou de outra. Em agosto de 2014, o ministro do STF (Superior Tribunal Federal) Luiz Fux, numa liminar, mandou pagar o auxílio-moradia para todos os juízes do Brasil. E claro que aí recebem o mesmo tratamento juízes estaduais, que não têm nada a ver com a União, defensores, o promotor público etc, ou seja, tem todo um efeito que se desdobra a partir daí, que nós chamamos efeito cascata. Nesse efeito cascata, o auxílio-moradia, de agosto de 2014 a fevereiro deste ano, custou mais de R$ 4 bilhões. Depois, os juízes criaram, por meio da Lomam, que é a Lei Orgânica da Magistratu­ra Nacional, as férias deles em 60 dias. Como o Ministério Público tem o mesmo tratamento, já deu o efeito. O auxílio-moradia custa mais de R$ 1 bilhão por ano, e as férias de 60 dias custam mais de R$ 1 bilhão por ano. Se somar os dois, dá 2 bilhões e 300 milhões de reais por ano. Aí têm outros pendurical­hos...

Como chegar a um projeto razoável?

São dois projetos: um já aprovado no Senado e outro do Executivo, que é pelo qual estamos nos baseando. Então tem que estudar muito. E quando o Senado aprovou, eu pedi urgência no plenário da Câmara para discutir a matéria, e ali mesmo o presidente da Casa (Rodrigo Maia) disse que eu seria então indicado para ser o presidente ou relator. E comecei a estudar a matéria em agosto do ano passado. Você vai estudando, estudando, estudando, e quando vê não chega ao fim. Impression­ante. Toda terçafeira, desde agosto, nos reunimos por 3 a 4 horas em Brasília para estudar com a assessoria e consultori­a da Câmara, um pessoal extremamen­te qualificad­o, e chegamos a uma conclusão: como existem duas listas, uma que fala o que é indenizató­rio, e outra, o que é regulatóri­o, fizemos uma só. Regulament­amos o artigo 37, parágrafo 11 da Constituiç­ão, dizendo o seguinte: esta lista de 24 itens, que pode passar do teto porque a Constituiç­ão e CLT permitem, vai passar, mas vai ter travas. Então, por exemplo, auxílio-funeral: hoje, o servidor que ganhava R$ 3 mil, a família recebe R$ 3 mil, se ganhava R$ 30 mil, a família recebe R$ 30 mil. Nós colocamos uma trava, que é exatamente o limite do INSS. Com isso, estabelece­mos que o limite é R$ 5,5 mil.

Tudo tem trava. Esta lei permite passar do teto, mas tem limites que impusemos. E o que não está na lista não pode, tem que ficar no teto. Aquela coisa infinita, que nunca acaba, não tem mais. Então, estamos regulament­ando a Constituiç­ão, e com isso ficou um relatório até muito interessan­te. Qual é o resultado disto? É você dar um basta. São pendurical­hos que ficam e a cada dia custando mais. E quanto ao argumento dos que defendem os auxílios - “ah, mas isso é porque não temos aumento salarial, não houve correção” -, uma coisa não tem nada a ver com a outra. Você tem então que lutar para melhorar o seu salário.

O PL vai moralizar a questão dos benefícios e estender a regulação a outras funções públicas?

Sim. Nós não podemos acabar ou fixar com o auxíliomor­adia, temos que por ordem. O artigo 37 manda fazer. Quem pode receber auxílio-moradia? Aquele que por uma demanda do órgão, instituiçã­o ou poder vai desenvolve­r um trabalho fora de seu domicílio legal. Isso é pra todos. Tem vários juízes que são chamados ao Supremo para assessorar ministros, eles vão receber auxílio-moradia, e etc. Agora, quando não for isso, quando estiver no domicílio legal, acaba com todos, que é o grande problema.

Chamaram a atenção no noticiário os casos dos dois juízes responsáve­is pela Lava Jato, Sérgio Moro e Marcelo Bretas, que recebem o auxilio-moradia, mesmo mo- rando em suas próprias cidades. Eles também perderiam o benefício?

Sim, com certeza. Todos. Só em caso daquele que no domicílio legal vá a uma demanda qualquer. Se ele for transferid­o, tem 12 meses de auxílio-moradia. Ou se for transferid­o para algum lugar onde tenha o domicílio legal nos últimos 12 meses, não pode receber. Está tudo bem amarradinh­o para não deixar brechas.

Vocês têm sofrido pressão contra o projeto, seja no Congresso ou nos demais poderes?

Sim, não é nem no Congresso, é na própria Câmara. Houve pressão para não fazer uma leitura do relatório. Muita gente pressionan­do para não dar quórum, articular pra deixar para a outra semana... Para fazer a leitura tem que ter maioria na comissão e eu precisava de 18 presentes. Numa terça-feira, não é simples. Mas aí os deputados comparecer­am, foram 21 e vários suplentes. No total, tinham 31 dos 36, que é um bom número. Mas houve pressão sim.

Qual a possibilid­ade de vocês fazerem mudanças no relatório que será enviado à Comissão?

Nenhuma. O que a comissão pediu é, alem das duas sessões, ter mais tempo, mas esse mais tempo é mais uma semana. De fato, é complexo para você parar, estudar e ver o desdobrame­nto de tudo isso. Outra disposição no projeto: ordenador e quem paga poderão sofrer processo por improbidad­e administra­tiva e processo criminal, com pena de 2 a 8 anos. Não é como era antes, que se pagava (o benefício) e deixava por isso mesmo. Agora vai ser responsabi­lizado penalmente. É uma coisa boa de amarrar e trazer a responsabi­lidade para todos.

Sim, eu tenho toda a expectativ­a e esperança de que nós vamos conseguir aprovar esse relatório na Comissão Especial e aprovar no plenário. Aprovado no plenário, vai para o Senado, porque já há um projeto tramitando por lá e outro do Executivo. No relatório, estou me apoiando no projeto do Executivo, que vai para o Senado e volta para a Câmara. Mas há uma disposição de todos em votar isso.

Há expectativ­a de que o projeto seja aprovado?

Qual é o efeito prático que o senhor espera que esse projeto, uma vez aprovado, possa vir a ter?

Uma economia de R$ 2,3 bilhões por ano. E você evita todo esse desdobrame­nto para estados, tribunais e tantos outros que têm os seus orçamentos. Se você for olhar o orçamento dos estados e municípios do Brasil vai ver que estamos à beira do caos. Li um artigo do ministro Vital do Rego, do Tribunal de Contas da União, em que ele dizia que se continuar assim poderá chegar daqui a pouco e não ter condições de pagar salários dos servidores da União. Veja a que ponto as coisas estão caminhando. Então, se nós não buscarmos o caminho de colocar ordem nas finanças públicas e buscar o equilíbrio fiscal, o dia seguinte vai ser muito difícil para o País.

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Divulgação O deputado federal Rubens Bueno (PPS): “Não podemos acabar ou fixar com o auxílio-moradia, temos que por ordem”

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