AVENIDA PARANÁ
Não ganharam a Copa, não levantaram a taça, mas ganharam a admiração de todos.
A vida é uma grande Copa feita do suor de derrotas e vitórias, das lágrimas de alegria e tristeza, do sangue dos pais e filhos
1. Filho, confesso que fui um péssimo jogador de futebol. Na infância, quase sempre era o penúltimo a ser escolhido na hora de formar os times (em geral só havia um outro mais grosso que eu na turma). Essa inabilidade acabou me conduzindo à mais sofrida das posições: goleiro. E assim me tornei um goleiro frangueiro. Jamais cheguei às oitavas de final de nenhum campeonato; depois de levar muitos e muitos gols defensáveis, aposentei as luvas e abandonei os gramados aos 15 anos. Quando voltei a entrar em um campo de futebol, foi apenas até à beira do gramado, na condição de repórter.
2. Quando você decidiu jogar futebol, filho, temi que sofresse uma decepção igual à minha. Felizmente, eu estava errado. Você treinou bastante e agora foi um dos artilheiros da Copa de sua escola. Gostei particularmente do nome que vocês escolheram para o time: Futeboys. Nos últimos dias, você chegava em casa sempre com boas notícias: “O Futeboys ganhou de de 7 a 0!” “O Futeboys fez 5 a 1!” “Ganhamos de 5 a 4 e eu marquei o gol decisivo!” Acho que você puxou o seu avô Lourenço, que até hoje entra em campo nos Clube dos 20.
3. Nesta quinta-feira, fomos assistir à final da sua Copa. Foi um jogo emocionante, para dizer o mínimo. Seu time abriu o marcador, mas o adversário empatou no final do primeiro do tempo. Os dois goleiros brilharam com defesas inacreditáveis (não eram frangueiros como seu pai...). O jogo terminou empatado em 2 a 2 e foi para a prorrogação. O outro time fez 3 a 2, mas vocês encontraram força para empatar. No finalzinho, eles fizeram 4 a 3. Foi um jogaço, digno de Copa.
4. Você, que havia chorado de alegria no 5 a 4, agora chorava de tristeza no 4 a 3. Todos viram a bravura e a habilidade que você e seus companheiros mostraram na partida. Além disso, os Futeboys foram leais e respeitaram o adversário (também irrepreensível). Não ganharam a Copa, não levantaram a taça, mas ganharam a admiração de todos.
5. Foi então que eu percebi: estávamos no dia 5 de julho. Na mesma data, há 36 anos, eu chorei de tristeza quando o Brasil perdeu de 3 a 2 para a Itália no jogo que ficou conhecido como a “tragédia do Sarriá”, na Copa do Mundo da Espanha. Aquela geração de craques — em que brilharam Zico, Falcão, Sócrates — ficou sem a taça. Mas eu nunca esqueci as emoções que a seleção de 1982 me proporcionou.
6. Agora era outro menino que chorava no dia 5 de julho. Então eu o abracei, e com aquele abraço queria dizer que a vida é assim mesmo, uma grande Copa feita do suor de derrotas e vitórias, das lágrimas de alegria e tristeza, do sangue dos pais e filhos, do tempo das viradas e prorrogações, de tudo isso que parece óbvio, que parece trivial, que parece irrelevante, mas que deve ser lembrado sempre, para jamais se perder no vão do esquecimento.
7. Obrigado, meu filho, por me tornar torcedor outra vez. Obrigado por me lembrar do inesquecível.