Folha de Londrina

ENERGIA MUSICAL

Aos 88 anos, aluna do Festival Internacio­nal de Londrina faz curso de piano e garante que não falta energia para os estudos do instrument­o

- Carolina Avansini Reportagem Local

Aos 88 anos, a professora Elza Santos Elias esbanja disposição para fazer curso de piano da programaçã­o do Festival Internacio­nal de Música de Londrina. “Pedi a Deus que me dê muita saúde para honrar meu talento”, afirma a aposentada, que não esconde a ansiedade em se apresentar ao público

Desde criança, a professora aposentada Elza Santos Elias, 88, sabia que tinha um talento incomum para a música. Nascida em São Paulo, “em um apartament­o em cima do Viaduto do Chá”, como faz questão de ressaltar, ela foi apresentad­a aos solfejos por uma professora de artes da escola que identifico­u rapidament­e as habilidade­s incomuns da aluna. Essa professora, encantada com Elza, sugeriu ao pai dela que comprasse um piano. “Ele comprou e pediu a umas senhoras muito gentis, na época, para me ensinarem. Gostei muito de aprender com elas e foi assim que comecei a tocar”, contou.

Dona Elza é a aluna de mais idade entre todos os que fazem cursos do Festival Internacio­nal de Música de Londrina. Ela se motivou a estudar piano no evento quando soube que a professora Olga Kiun estaria entre os mestres. “Perguntei ao Marco Antônio de Almeida (diretor do Festival) se ele me aceitaria, por causa da minha idade. Ele não só aceitou como me incentivou”, alegra-se.

Ter aulas de piano é uma grande conquista para dona Elza. Formada em Letras pela USP (Universida­de de São Paulo), diploma que expõe na parede com muito orgulho, ela conta que a primeira opção era fazer vestibular para música, mas não havia esse curso à época. Além disso, não havia muito incentivo para que mocinhas estudassem outras áreas. “Eu até pensei em fazer medicina, mas desmaiava com sangue, não ia dar certo”, recorda.

Tornou-se professora, casou aos 31 anos de idade, quando já havia se mudado para Maringá (Noroeste) e nunca mais teve oportunida­de de se dedicar às partituras. Nasceram os filhos Rose e Paulo, ela passou a acumular obrigações domésticas com a carreira docente e ainda teve que conviver com a oposição do marido, que não gostava de música e não a apoiava na relação com o piano. “Esperei muito tempo para poder tocar de novo”, diz.

Viúva há 15 anos, ela retomou a prática musical e tornou o estudo do piano um objetivo de vida. Apesar de hoje reconhecer que nasceu com um talento especial, ela recorda que, na adolescênc­ia, não acreditava no próprio dom. A consciênci­a sobre este atributo aflorou na maturidade e, desde então, ela se dedica a honrar esse benefício que acredita ter sido concedido por Deus. “Já me entendi com Ele. Pedi que me dê muita saúde para honrar meu talento”, afirma.

A rotina para fazer jus ao dom inclui muitas horas diárias de prática, mas sempre depois das 9 horas, “para não incomodar os vizinhos”. “Tenho muita disposição. Poderia estudar até de madrugada, mas não quero incomodar o pessoal”, reforça a pianista, que também gosta de cuidar da casa, prepara as próprias refeições e exibe com orgulho a cozinha com decoração moderna que ela mesma escolheu com um arquiteto. “Amo cuidar da minha casa”, diz.

Na lista de coisas para aprender, ela destaca as sonatas Tempestade e Patética, de Bethoveen, que espera executar com a ajuda da professora do Festival. Outro plano é aprender violoncelo. “Já pensei em fazer vestibular para música na UEL (Universida­de Estadual de Londrina), mas ainda não me decidi”, avisa.

Apesar de se sentir um pouco incomodada “por estar velha”, ela garante que a música preenche a vida. “A música não depende das palavras para ser entendida. Na música, a tristeza e a alegria podem ser uma coisa só, por isso é muito importante aprendê-la. É uma linguagem universal”, filosofa.

Ansiosa para se apresentar ao público do Festival Internacio­nal de Música de Londrina, dona Elza conta que está ansiosa, mas não nervosa. “Estou me preparando para fazer o melhor possível”, avisa. Aos colegas de curso, todos muito mais jovens, ela só tem elogios. “Eles aprendem rápido e tocam muito bem. Alguns já disseram que virão me visitar depois do festival, acho que vou até pôr o telefone mais alto para não correr o risco de não escutar se alguém me ligar”, diverte-se.

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“Já me entendi com Ele. Pedi que me dê muita saúde para honrar meu talento”

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Anderson Coelho
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Fotos: Anderson Coelho “Na música, a tristeza e a alegria podem ser uma coisa só, por isso é muito importante aprendê-la; é uma linguagem universal”, afirma Elza Santos Elias

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