Folha de Londrina

Promessa de bumbum e seios perfeitos

Estratégia­s veiculadas no mercado virtual da beleza vão de promoções a mutirões de procedimen­tos

- Júlia Marques Roberta Jansen

Rio - No mercado virtual da beleza, anúncios de perfis com milhares de seguidores prometem bumbum, rostos e seios perfeitos. As estratégia­s vão de promoções a sorteios e há até “mutirões” para fazer os procedimen­tos estéticos. Os grupos também servem de arenas de batalha: de um lado, médicos, a maioria não especialis­tas, e de outro as chamadas “bombadeira­s”, sem diploma na área. Na última semana, esse universo veio à tona após a prisão do médico Denis Furtado, o Doutor Bumbum, acusado pela morte da bancária Lílian Calixto.

O preenchime­nto do bumbum, técnica aplicada por Furtado em Calixto, é o carrochefe de quem faz a bioplastia. E o PMMA (polimetilm­etacrilato) é a substância mais anunciada nas redes sociais, embora não seja recomendad­a por entidades médicas. “Não tenho vergonha de falar que faço bioplastia”, diz Eduardo Costa, pediatra, sem especializ­ação em cirurgia, que realiza o procedimen­to com PMMA em quatro capitais.

Nas redes, ele e outros profission­ais interagem com pacientes e tiram dúvidas em textos e vídeos ao vivo. “Tudo é feito em poucas horas, sem internação e somente com anestesia local”, escreveu outro médico em sua página no Facebook, com 41 mil inscritos. Em grupos privados, não é raro ver imagens de bumbuns definidos e comparaçõe­s do tipo “antes e depois” - o que é vedado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina). O agendament­o dos procedimen­tos também é simples.

Em comum, quem faz as bioplastia­s oferece canais de atendiment­o via WhatsApp. Basta mandar uma mensagem para receber instruções. Para acelerar, é possível fazer o que chamam de “pré-atendiment­o” online, com envio de fotos de costas e de lado. Depois, é feita uma consulta presencial e o procedimen­to pode ser realizado no mesmo dia ou no dia seguinte.

PROMOÇÃO

Mulheres que supostamen­te já fizeram a bioplastia se tornam promoters do procedimen­to e enviam às outras a lista de médicos parceiros

do grupo, onde é possível obter desconto. Em fórum no WhatsApp com mais de 200 membros, são anunciados quatro profission­ais - um no Rio, dois em São Paulo e outro em Porto Alegre. Segundo o anúncio, seriam cobrados R$ 10 mil para aplicar

200 mililitros de PMMA em cada nádega. Outro tópico indica uma mulher, identifica­da só pelo primeiro nome, que faz a aplicação do “bumbum padrão” - de 800 ml, a R$ 14,4 mil.

Também há sorteios de bioplastia entre autoras dos primeiros comentário­s em grupos fechados no Facebook e a organizaçã­o de mutirões. “Eu e duas amigas nos juntamos e pagamos as passagens aéreas e hospedagem dela (autora da página). Ela fez nossa bioplastia com todo conforto”, disse uma jovem em um desses grupos.

Um dos temas nesses fóruns são os riscos e vantagens de se fazer esse tipo de procedimen­to com médicos ou outros profission­ais, como enfermeiro­s, biomédicos e esteticist­as. “Todo mundo está injetando tudo em todo mundo. As pessoas começaram a se aventurar e tem o ‘braço’ (vertente) das ‘bombadeira­s’, diz Costa, em referência a mulheres que não têm formação médica. Ele defende a exclusivid­ade dos médicos e diz “seguir o bom senso” ao definir a quantidade de PMMA.

‘TIRO NO ESCURO’

Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Níveo Steffen diz que o procedimen­to não é recomendad­o. “A bioplastia dentro da cirurgia plástica é muito pontual. Não há recomendaç­ão disso com finalidade estética.” Ele explica que, embora não exija cortes, o procedimen­to deveria pressupor cuidados semelhante­s aos de cirurgias, como assepsia do local de aplicação, o que nem sempre ocorre. Outro problema é o tiro no escuro. “O paciente não sabe o que está sendo injetado. Em vez de colocar PMMA, pode colocar substância­s piores.”

Corregedor do CFM, José Fernandes Vinagre explica que a promessa de resultados, comuns nos anúncios, é vedada. “Há o ‘Vai entrar cheia de celulite e sair sem nenhuma’. Esse tipo de coisa não pode ser prometida.” Sobre o PMMA, o CFM indica que a substância só pode ser injetada em pequenas doses - sem especifica­r quantidade­s -, por médicos, e não há estudos sobre a ação a longo prazo do produto. O Conselho Federal de Enfermagem não prevê a prática entre seus profission­ais. Já a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) informou que o PMMA é classifica­do como de “máximo risco” e o procedimen­to deve ser feito por um profission­al habilitado.

“O paciente não sabe o que está sendo injetado. Em vez de colocar PMMA, pode colocar substância­s piores”

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