Memórias impressas
1954. Joaçaba, interior de Santa Catarina, cidade hoje com 28 mil habitantes. Aos sete anos, o pequeno Rogério Sganzerla maravilhava-se com a edição de seu primeiro livro em mãos. “Novos Contos”, impresso sem o conhecimendo dos pais na tipografia da cidade – apesar de que o pai, Albino Sganzerla, então prefeito da cidadezinha, precisou pagar pela obra de estreia do filho. Uma reunião de quatro contos escritos às escondidas por Rogério, como diz sua mãe, Zenaide Sganzerla, aos 99 anos, em relato transformado em carta para a reedição de “Novos Contos”.
14 anos depois, com apenas 22 anos, Rogério seria reconhecido como um dos mais inventivos e radicais cineastas do país ao lançar seu primeiro filme, “O Bandido da Luz Vermelha”, em 1968. Um grande sucesso de crítica e público à época. “O Terceiro Mundo vai explodir e quem tiver de sapato não sobra.”
Nesta terça-feira (24), o Grafatório Edições, em parceria com a Miríade Edições, de Florianópolis, promove o relançamento da primeira obra de Sganzerla. Em edição fac-similar, tentando se aproximar ao máximo da original, foram feitas 500 cópias de “Novos Contos”, impressas em tipografia. O evento de lançamento do livro será na Vila Cultural Grafatório (avenida Paul Harris, 1575), às 19h30, e contará com um bate-papo com Carlos Ebert, amigo pessoal de Sganzerla e diretor de fotografia de alguns de seus filmes, incluindo “O Bandido da Luz Vermelha”.
Além dos contos, a edição vem em formato de carta, tendo Zenaide como remetente e um bilhete dela endereçado para quem abrir o envelope. Selos e carimbos fazem referências a outras obras de Sganzerla e a ídolos do artista, como Godard, José Mojica Marins e Orson Welles. Em meio às páginas, uma foto da infância de Rogério. Todos os detalhes feitos artesanalmente pelo Grafatório.
Rogério comentava sobre o livro de forma jocosa, diz Carlos Ebert, o levando como uma “prova de cabotinice infantil”. “Relançar essa obra ajuda a entender aspectos fundamentais da obra de Rogério, principalmente no que diz respeito ao entendimento e a aceitação da mesma pelo público. Ao mesmo tempo que ele desprezava essa aceitação, ele a ambicionava”, diz Ebert.
A ideia nasceu com Gabriela Bresola, da Miríade Edições. Natural de Joaçaçaba, o interesse dela por Sganzerla surge principalmente em pensar a cidade em diferentes épocas. “Sempre contam que ele ia ao cinema mais de uma vez por dia. Joaçaba tinha três cinemas. Hoje, dois são igrejas universais e um virou uma loja de móveis. Ou quando ele viajava sozinho de trem, criança, pelas cidades vizinhas, e eu só conheci os trilhos de trem abandonados.”
O interesse pelo “Novos Contos” veio durante entrevistas com a família de Rogério para a produção de um documentário, quando teve acesso a uma cópia da edição original do livro.
O Grafatório entrou na história quando Felipe Melhado, co-editor do livro pelo Grafatório, participou de uma feira em São Paulo com a Miríade Edições. Foi assim que conheceu Gabriela e se interessou pelo projeto.
*Supervisão:
Célia Musilli Editora da Folha 2
A amizade é como dinheiro: é mais fácil de conseguir do que de manter”
(Samuel Butler)