TRANSFORMAÇÃO
Partituras, canto e instrumentos musicais oferecem oportunidades de realizar sonhos a alunos do Festival de Londrina
Onze jovens do Rio de Janeiro participam do Festival de Música de Londrina. Time faz parte de ONG que atende moradores de áreas de vulnerabilidade social. Sonho de David Nascimento, 21, é tocar nos EUA
Transformação. Foi com essa palavra que o jovem musicista David Nascimento, 21, definiu a importância da música na própria vida. Integrante da ONG Ação Social pela Música do Brasil, que atende crianças e jovens de comunidades pacificadas do Rio de Janeiro, ele participa em Londrina, com outros dez jovens cariocas, das aulas do Festival Internacional de Música de Londrina. No dia 28, às 20h30 no teatro Ouro Verde, apresentam com a orquestra do Festival a ópera Carmen, de Bizet, no espetáculo de encerramento do evento. A ONG da qual fazem parte visa à inclusão social e à formação da cidadania, através do ensino da música clássica, para crianças, adolescentes e jovens residentes em comunidades em situação de vulnerabilidade social em várias cidades do Brasil.
O time do projeto que está em Londrina é composto também por Mariana Pereira, 18, Lucas Freitas, 20, Anna Eliza, 17, Gabriel Paixão, 16, Jean Barreto, 20, Rodrigo Silva, 21, Gilbert Vilela, Gabriel Veloso, Natanael Paixão, 18, e Pablo Alisson, 21. Todos aprendem música há pelo menos quatro anos e alguns já estão na Ação Social pela Música a mais tempo. Morro dos Macacos, Morro do Alemão, Babilônia e Providência são alguns dos endereços do grupo.
A história dos jovens músicos cariocas têm muitas semelhanças. Moradores de comunidades pacificadas, eles encontraram nas aulas a oportunidade para superar dificuldades e adversidades. “Muitos de nós fomos encaminhados por assistentes sociais”, contam.
Nascimento, por exemplo, diz que na infância “fazia muita besteira”. “Repeti de ano quatro vezes, fugi de casa, fui parar no juizado porque tentei agredir uma professora. A música me transformou porque foi através dela que aprendi disciplina e educação”, considera. Selecionado para estudar na Alemanha com uma bolsa de estudos, ele conta que a música também trouxe perspectiva de futuro. “Me vejo em dez anos tocando na Orquestra Filarmônica de Nova Iorque e frequentando clubes de jazz”, afirma.
Paixão conta que costumava ficar em casa enquanto o irmão Natanael ia para o projeto. “Um dia decidi conhecer e resolvi ficar. Eu queria tocar viola como meu irmão, mas acharam que eu era pequeno e me ensinaram violino”, recorda. Anna Eliza tinha uma amiga que frequentava as aulas e também a convidou. “Fui por curiosidade e acabei ficando”, conta ela.
Silva foi apresentado pelo irmão mais novo que, segundo ele, chegava em casa e o corrigia no violão. “Me deu vontade de aprender mais e foi assim que conheci o violoncelo”, conta. Pereira resume que “música é tudo”. “Tudo que sou hoje devo à música. Meu plano para o futuro é continuar estudando e fazer faculdade”, planeja.
Para Nascimento, a música, com toda a rigidez e disciplina exigidas dos estudantes, trouxe liberdade. “É uma linguagem através da qual me expresso e me trouxe oportunidades que eu nunca tinha imaginado, como participar de festivais e viajar. São experiências que eu jamais teria tido”, diz.
Aos 14 anos, o pianista Estefan Iatcekiw, de Curitiba, coleciona prêmios em concursos de música no Brasil e no exterior. Aluno da professora Olga Kiun, do Festival Internacional de Música de Londrina, ele está na cidade participando das aulas da mentora que também o ensina na capital. Souza Lima, Edna Bassetti Habith, concurso Mackenzie, Sinfônica de Goiânia, concurso Prelúdio, da TV Cultura, o prêmio internacional Rachmaninov e o segundo lugar no concurso Santa Cecília, que ele recebeu há poucos dias em Portugal, são algumas conquistas deste pianista prodígio que se interessou por piano aos cinco anos de idade.
“Minha mãe queria me dar uma bicicleta no Dias das Crianças, mas eu pedi um piano. Ganhei um teclado e comecei a tocar músicas que via na televisão. Ela percebeu que eu tinha algo diferente e procurou aulas de piano. Foi assim que descobri possuir ‘ouvido absoluto’. Eu sentia uma angústia quando ouvia os sons, mas não sabia explicar. Aquele teclado me libertou”, relata.
Estefan foi criado apenas pela mãe, Josiane Alanis, que atualmente o acompanha em aulas, concursos e festivais. “Minha mãe deu a vida dela por mim. Eu não estaria aqui se tivesse outra mãe”, agradece ele, que aos 9 anos foi orientado pelo professor de piano a procurar a pianista Olga Kiun. “Ele disse que não podia me ensinar mais nada e me indicou a Olga. Foi assim que a conheci.”
No primeiro encontro, a professora executou uma peça e pediu para ele dizer as notas tocadas, o que o adolescente realizou. “Eu estava muito nervoso, porque queria me desenvolver mais e não estava conseguindo com meu antigo professor. Depois que citei todas as notas, ela disse que ia me ensinar porque eu tinha talento, dedicação e ouvido absoluto, o que é muito raro”, contou.
Desde então, a carreira de Estefan deslanchou. “Passei a participar de concursos e concertos. Agora me preparo para estudar na Europa”, comemora. Apesar dos 14 anos, o pianista está terminando o ensino médio. Após passar por testes, ele foi diagnosticado com altas habilidades e, por isso, fez testes para avançar as séries escolares. “No ano que vem, poderei me dedicar apenas à música”, comemora ele, para quem tocar piano não é uma escolha. “É a única opção. Nunca imaginei fazer outra coisa.”