Em busca da produtividade brasileira
Mudanças no posicionamento de mercado e a sistematização das informações e processos são pontos-chave para o Brasil avançar em inovação na saúde, segundo Rodrigo Silvestre, diretor industrial do Tecpar
Os últimos dez anos são emblemáticos para a área de inovação no Brasil. Foi a partir da Lei da Inovação, decretos e marcos regulatórios, que se permitiu a criação de um ambiente inovador no País. O próximo passo agora, é focar nos resultados a partir de questionamentos objetivos e sistematizados.
Foi essa análise que Rodrigo Silvestre, diretor industrial do Tecpar (Instituto de Tecnologia do Paraná), levou ao palco do EncontrosFOLHA, no dia 27 de julho. O projeto que é realizado há quatro anos pela FOLHA, e nesta 12ª edição debateu o “Mercado da Saúde em Londrina - Tecnologia e Inovação para serviços e produtos”.
Com amplo conhecimento em desenvolvimento econômico e inovação, associado à experiência na formulação de projetos da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, o palestrante discutiu pontos-chave no campo da inovação em saúde no País.
Em curto prazo, Silvestre defende a criação de um diálogo entre governo, empresas e academia. Em médio prazo, melhorias nos projetos em desenvolvimento e em um período mais estendido, a mudança do modelo mental entre todos os envolvidos.
“A inovação só pode ser avaliada depois de ter resultado em melhoria no posicionamento de mercado e acesso da população às oportunidades. Os trabalhos das universidades são elementos fundamentais, mas não únicos. Precisamos fazer isso de forma sistemática”, reflete.
Mas para buscar soluções é preciso identificar as vulnerabilidades e nesse ponto, ele foi bem detalhista e apontou como principais obstáculos, a ausência de política industrial e de foco para o País se posicionar no setor; a falta de diálogo entre os interessados; a indisponibilidade tanto do governo quanto de empresários brasileiros para assumir riscos e as limitações na esfera regulatória. Tudo isso, torna o Brasil muito dependente de tecnologias e conhecimento externos.
“Toda inovação tecnológica pressupõe risco e o risco é diretamente proporcional ao resultado. Quando o cenário está ruim, o empresariado adota uma política de baixo risco, enquanto que em outros mercados isso não existe. Essa característica brasileira é difícil de mudar e é um empecilho para conseguir inovar”, reforça.
Segundo Silvestre, essa postura decorre do fato do Brasil ter um mercado financeiro muito forte que eleva as taxas de juros. “E isso é de fato, um comparador muito ruim para as empresas assumirem riscos”, reconhece.
Nesse contexto, a noção de Estado empreendedor se torna fundamental, no entendimento do especialista. “O Estado precisa ser regulador em algumas atuações e em outras, protagonista. Existe uma fase onde o risco tecnológico e empresarial é intransponível. Ele precisa ser feito pelo Estado, que tem o papel também de manter universidades e pesquisas”, aponta.
ÉTICA E LEGISLAÇÃO
Silvestre lembra que quanto mais disruptiva é a inovação em saúde, mais ela se aproxima de questões antiéticas. “Porque eu preciso testar um produto, por exemplo, sem criar a expectativa de gerar uma cura aonde eu não vou conseguir”, afirma.
Para ele, a saída é uma maior prevalência de estudos clínicos no Brasil, o que aliás, tem sido um dos maiores empenhos do Tecpar. “Temos empresários inovadores, tentando fazer produtos novos, mas criamos uma legislação que é extremamente austera em termos de proteção às pessoas. E isso é fantástico, porém, há detalhes que geram uma demora no tempo de resposta de aprovação de um projeto e dificultam os estudos clínicos na fase I”, elenca.
Para fins comparativos, a duração dos processos de autorização e condução dos protocolos de pesquisas no Brasil tem um prazo entre 10 e 15 meses de espera, enquanto que no restante do mundo, varia de três a no máximo seis meses.
Em 2015, o plenário do Senado aprovou o PL (Projeto de Lei) 200, que acelera a liberação de pesquisas clínicas no Brasil, por meio da criação de um marco regulatório para análise e registro de novos medicamentos no tratamento de câncer, Alzheimer, diabetes e outras doenças, além de fixar regras a serem cumpridas nos estudos em seres humanos.
Enquanto a proposta segue para análise da Câmara dos Deputados, o Brasil segue dependendo muito de tecnologia externa. Por exemplo, na produção de remédios convencionais, cerca de 80% dos genéricos e sintéticos são produzidos por empresas nacionais, mas os insumos farmacêuticos, não.
Na visão do palestrante, outra questão é que com as limitações na legislação, empresários e pesquisadores são desmotivados a fazer estudos clínicos no Brasil. “Então, ele faz fora do País e nossa legislação aceita que um produto registrado no FDA ou no EMA seja rapidamente registrado aqui. Ou seja, como que a legislação não permite que eu teste o produto nas características da população brasileira, mas permite que depois o utilizemos amplamente no mercado? Isso é um contrassenso”, comenta.
Silvestre ainda ressalta que os recursos para Ciência, Tecnologia e Inovação sempre são cortados em um cenário problemático. “Porque os efeitos imediatos são zero. Estamos discutindo aqui, coisas para 30, 50 anos. Para se ter uma ideia, um projeto rápido em saúde leva cerca de 15 anos para acontecer. Sou extremamente pessimista no curto prazo e extremamente otimista no longo prazo”, sustenta.
E o futuro, como ele mesmo citou, depende de uma mudança na mentalidade de todos os setores envolvidos. “A inovação não morre na área de engenharia, mas na administrativa, jurídica. Precisamos superar esses pontos. O que a gente espera é que muita informação e mudanças de processos sejam tratados antes, para que possamos entregar para cada paciente aquilo que ele realmente precisa”, finaliza.
Quando o cenário está ruim, o empresariado adota uma política de baixo risco (...). Essa característica brasileira é difícil demudareéum empecilho para conseguir inovar”