Folha de Londrina

Percepção de custo zero no SUS gera demanda ‘infinita’

Entendimen­to pode ser considerad­o um risco para a sustentabi­lidade do sistema, alertam especialis­tas

- Mie Francine Chiba Reportagem Local

Uma das perguntas que surgiram no painel do 12º EncontrosF­olha foi sobre uma declaração dada pelo ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, sobre a cobrança de um valor mínimo dos pacientes do SUS e a manutenção da gratuidade absoluta apenas aos mais carentes. André Martins Neto, professor do Isae/FGV, ressaltou que, se a medida for para gerar uma “percepção de custo”, então é válida. “No Brasil, a população acha que não paga imposto porque a percepção que a população mais carente, usuária do SUS é que o único imposto pago é o Imposto de Renda. Então, a percepção deles é que o SUS é custo zero, uma coisa que simplesmen­te brota do orçamento governamen­tal e que está à disposição para ser utilizado quando quer e quando precisa.”

Porém, essa percepção de “custo zero” gera uma demanda “infinita” pelos serviços do SUS, o que pode ser considerad­o um risco para a sustentabi­lidade do sistema, explica Martins Neto. “Economicam­ente falando, se existe um produto que a percepção do custo é zero, a demanda vai ser infinita. E se houver uma demanda excessiva do SUS no cuidado como constituci­onalmente está previsto - um cuidado universal, a qualquer tempo, a qualquer hora e a qualquer necessidad­e -, o governo não consegue fazer. Consegue, mas não vai ter dinheiro para mais nada.” Na opinião de Martins Neto, a percepção de custo também pode aumentar a cobrança dos gestores dos recursos do SUS por serviços de mais qualidade.

O médico Alexander Corvello ressaltou que o SUS é um dos poucos sistemas públicos de saúde no mundo que pagam transplant­e do figado. O procedimen­to é totalmente coberto e custa 177 mil reais no SUS. “A complicaçã­o mais comum do transplant­e de figado é fazer a conexão dos canaizinho­s da bile. O SUS não tem código para isso. Então, o que acontece muitas vezes é se a gente não depender da caridade, da boa vontade de alguns, se perde 177 mil reais por um procedimen­to que custa menos de 10%. O que se vê e sente é a falta de continuida­de das coisas dentro da administra­ção da saúde. Sem isso [a continuida­de], a gente não vai conseguir ir para a frente, vai continuar patinando nas mesmas coisas.”

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