Ateliê do artista Ai Weiwei é destruído na China
Artista dissidente que trabalhou no projeto do estádio ‘Ninho de Pássaro’, para as Olimpíadas, foi perseguido por criticar o regime
Quando uma escavadora começou a derrubar as paredes do ateliê de Ai Weiwei em Pequim, seus assistentes dentro do prédio corriam para embrulhar e salvar as obras dele ainda armazenadas ali.
Há três dias, o maior estúdio desse artista e dissidente chinês, hoje radicado em Berlim, foi destruído por ordem das autoridades de seu país.
Horas antes, Weiwei havia publicado um vídeo no Instagram em que aparecem tratores em ação e vários homens caminhando pelo interior do edifício então quase deserto.
“Hoje começaram a derrubar meu ateliê sem aviso prévio”, escreveu o artista, em inglês, na rede social, que é bloqueada na China. “Adeus.”
Não está claro se a demolição do ateliê usado por Weiwei ao longo dos últimos 12 anos tem como propósito atingir o artista. As autoridades da capital chinesa demoliram grandes áreas dos subúrbios no ano passado em uma campanha de segurança de edifícios, porém com aviso prévio.
Filho de um poeta venerado pelos ex-dirigentes comunistas, Ai Weiwei participou como arquiteto no desenho do célebre estádio “Ninho de Pássaro” construído para os Jogos Olímpicos de Pequim há dez anos, mas passou a ser perseguido por criticar o regime.
Em 2011, ele ficou 81 dias na cadeia depois de ser preso no aeroporto de Pequim, quando pretendia embarcar em um voo para Hong Kong. As autoridades destruíram o seu ateliê nos arredores de Xangai naquele mesmo ano.
Weiwei não demonstrou raiva ou surpresa com a destruição do ateliê, já que o contrato de aluguel desse espaço havia expirado no final de 2017, indicou Ga Rang, uma assistente que trabalhou ao seu lado em Pequim por dez anos.
Segundo ela, que cuidava do ateliê, era impossível se mudar nesse período devido à grande quantidade de objetos armazenados no estúdio. As autoridades encarregadas da destruição “vieram e começaram a romper as janelas sem nos avisar, mas restam muitas coisas no interior”, disse.
Os membros do ateliê haviam sido avisados de que a mudança era iminente, mas ninguém informou a data em que as escavadoras chegariam.
Na última sexta, perto do edifício, entre os escombros, restos de obras famosas do artista formavam uma estranha retrospectiva fantasmagórica.
Altas colunas de cerâmica verdes, amarelas e azuis, como as que usou na série “Pillar”, em 2006, apareciam com barras de ferro retorcidas, recuperadas nas escolas destruídas em 2008 pelo devastador terremoto de Sichuan, tudo cercado por um coro silencioso de raízes enormes e retorcidas semelhantes às de seu trabalho “Rooted Upon”, de 2009, uma reflexão abstrata sobre a invasão da modernidade e do deslocamento.
“Dizem que querem ampliar a área, construir centros comerciais e escritórios. Mas é uma lástima. Seria impossível encontrar outro lugar assim em Pequim”, lamentava Ga Rang. “O senhor Ai criou numerosas obras neste espaço”.
Afastado do centro da capital chinesa, o ateliê do artista fica numa zona industrial cheia de edifícios antigos, onde vendedores de melancia perambulam pelas ruas.
O estúdio de Ai Weiwei domina o bairro em que muitos dos outros edifícios dos anos 1960 e 1970 já estão em ruínas.