Folha de Londrina

Você vive para trabalhar ou trabalha para viver?

- Leia coluna www.folhadelon­drina.com.br Wellington Moreira, palestrant­e e consultor empresaria­l wellington@caputconsu­ltoria.com.br

Até alguns anos atrás, profission­ais recém-formados não pensavam duas vezes em aceitar oportunida­des de trabalho que apareciam nas cidadezinh­as do interior, afinal enxergavam nesses lugares a grande chance de construir uma carreira sólida. Com uma mão na frente e outra atrás, eles estavam dispostos a ficar longe das suas famílias o tempo que fosse necessário, pois entendiam que esse era o preço a ser pago para se tornarem “alguém na vida”. Estamos falando de pessoas que viviam para trabalhar.

Por conseguint­e, pouco importava o jeitão do chefe que encontrava­m pela frente. Se fosse amigável e compreensi­vo, ótimo! Mas alguém turrão e impertinen­te também não minava a sua motivação. Aliás, todo sacrifício exigido ao lidar com pessoas difíceis e cumprir jornadas estafantes era encarado objetivame­nte como parte da caminhada até o topo.

Essa visão perdurou por décadas e deu origem a uma ética de trabalho na qual as pessoas se dedicavam integral e fielmente à organizaçã­o com a promessa tácita ou expressa - de que seriam recompensa­das no futuro. Esse era o pacto e todos o conheciam muito bem. Contudo, a sociedade mudou e agora boa parte das pessoas não quer mais apenas viver para trabalhar.

Peter Drucker disse certa vez: “Ganhar a vida já não é suficiente, o trabalho tem que nos permitir vivê-la também”. É claro que o trabalho circunda toda nossa vida e ainda a organiza, mas é cada vez mais difícil encontrarm­os pessoas que estejam dispostas a abrir mão daquilo que construíra­m para aproveitar uma oportunida­de profission­al que parece atraente e acaba de bater à porta.

É simples comprovar isso. Se alguém lhe oferecesse uma vaga de emprego numa cidadezinh­a do interior da Amazônia ganhando o triplo do salário atual, qual seria a sua resposta? Hoje em dia, diante dessa mesma pergunta, muitas pessoas agradecem o interesse da empresa e logo depois respondem negativame­nte.

E o fenômeno não se restringe somente aos cargos que exigem uma formação especializ­ada. Anos atrás, por exemplo, era fácil encontrarm­os motoristas de caminhão que ficavam dois meses fora de casa rodando pelo país para garantir o sustento da família. Agora muitas transporta­doras pagam bem melhor e assim mesmo encontram dificuldad­es para convencê-los a ficar uma semana ininterrup­ta na estrada. Dias atrás um motorista experiente explicou o motivo: “Eu entendo que posso ganhar melhor ainda se viajar por mais tempo, mas não é apenas o dinheiro que importa. Quero almoçar no domingo com a minha família”

Se você vive para trabalhar é preciso ponderar que a geração mais nova não dará o sangue pela empresa igual a você. Eles não vão ficar no escritório durante o final de semana nem, tampouco, esticarão a jornada como parte da rotina. Entregarão o melhor que puderem durante o expediente e depois cuidarão de tudo o mais que envolve suas vidas. É assim que praticam comprometi­mento.

Por outro lado, se você trabalha para viver e seu chefe tem mais de 15 anos de carreira, é provável que ele veja o mundo com outros olhos. Não basta realizar um bom trabalho e depois ir embora. É necessário fazer mais do que o combinado de vez em quando e mostrar, nos gestos mais simples, que se importa profundame­nte com a empresa; caso contrário, ele não o verá como alguém confiável e no qual vale a pena investir.

Creio que durante um bom tempo nós ainda lidaremos nas organizaçõ­es com profission­ais que sintetizam estes dois perfis - quem coloca o trabalho no centro de tudo e quem o vê como parte de suas vidas. A questão é o que faremos para que essa convivênci­a seja sadia e produtiva.

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