Folha de Londrina

Baixo orçamento coloca acervo público em risco

Para produtores culturais, o incêndio no Museu Nacional, no Rio, é uma perda irrecuperá­vel

- Folhapress

O incêndio que destruiu o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, ocorrido na noite de domingo (2), expõe as dificuldad­es de instituiçõ­es públicas em manter a conservaçã­o de seus acervos. Falta de recursos para a manutenção predial não é exclusivid­ade do mais antigo museu do País, que teve 90% de um total de 20 milhões de peças consumidos pelas chamas. O Museu do Ipiranga, em São Paulo, está fechado para reformas desde 2013. Em Londrina, problema afeta o Museu Histórico, o Museu de Arte e a Biblioteca Municipal

Tragédia anunciada. Sem possibilid­ade de reparo. Pesquisas e história de mais de 200 anos em cinzas. Essas são algumas das opiniões dos produtores culturais diante o incêndio no Museu Nacional, no Rio, que teve grande parte do seu acervo queimado na noite de domingo (2).

Emocionado, o presidente do IBRAM (Instituto Brasileiro dos Museus), Marcelo Araújo, acredita que o dano não tem possibilid­ade de reparação. “É uma perda para a cultura que nunca vai se recuperar. Isso demonstra que precisamos mudar a cultura do país sobre a preservaçã­o do país. O que vamos falar para as novas gerações? A sociedade brasileira precisa repensar o país que queremos”, disse.

No ano em que celebra o bicentenár­io - museu foi inaugurado em 1818 - a instituiçã­o conseguiu um contrato com o BNDES de R$ 21,7 milhões para investir na restauraçã­o. A expectativ­a era de que cinco salas fossem reabertas até 2019. Para Washignton Fajardo, arquiteto e ex-presidente do Rio Patrimônio da Humanidade, o maior problema do museu vai além de repasses. “Isso demonstra como nós viramos uma sociedade idiotizada. O patrimônio cultural brasileiro não tem orçamento. O problema da UFRJ não era de orçamento, é de gestão. Precisa demitir esse reitor (Roberto Leher)”, disse Fajardo que listou as últimas tragédias de prédios sob cuidados da universida­de. “Em 2014, a capela da universida­de, localizada na praia Vermelha, pegou fogo. Em 2016, foi a reitoria. A biblioteca da faculdade de arquitetur­a está fechada após incêndio em 2016. O Colégio Brasileiro de Altos Estudos funciona precariame­nte e o Canecão (casa de espetáculo­s), que seria uma forma de captar dinheiro para a universida­de, está fechado há 8 anos”.

Entretanto,o coordenado­r do plano de gestão e conservaçã­o do Instituto Bardi, Renato Anelli, tem uma visão contrária. “Estou vendo muita gente que coloca a culpa na universida­de, queria ver se a instituiçã­o que eles dirigem tivesse um corte de 50% de orçamento, conseguiri­a fazer uma coisa bem feita”.

Grande parte dos estudos da biodiversi­dade brasileira está sob guarda de instituiçõ­es internacio­nais, segundo o diretor do MAC-USP, Carlos Roberto Ferreira Brandão. Ele diz que esse fato já motivo de muitas críticas. Após o ocorrido com o Museu Nacional, Brandão diz agradecer este fato. “É necessário um reposicion­amento para que possamos garantir a guarda física desses acervos”.

Letícia Julião, coordenado­ra da rede de museus da UFMG, diz que essa é uma situação muito comum dos museus universitá­rios, a precarieda­de em razão de falta de recursos, que se agravou e deixa esses acervos e essas coleções muito vulnerávei­s.

“A gente vai realizar em outubro o 5º Fórum Permanente de Museus Universitá­rios. Ironicamen­te, a palestra de abertura seria em comemoraçã­o dos 200 anos do Museu Nacional. Talvez a gente não tenho muito o que comemorar”, diz Julião.

MUSEU DO IPIRANGA EM RISCO

O incêndio que devastou o Museu Nacional, no Rio, chama atenção para a situação de outra instituiçã­o cuja reforma já se arrasta há cinco anos e que também está em risco: o Museu Paulista, mais conhecido como Museu do Ipiranga. Ambos mantêm um acervo histórico de valor incalculáv­el e são mantidos por universida­des no caso do museu carioca, pela UFRJ; no paulistano, pela USP.

O Ipiranga está fechado desde 2013, quando um laudo apontou risco iminente de desabament­o do forro e o levou a ser interditad­o. Algumas das peças do museu - mais de 450 mil obras - foram transferid­as para várias unidades; outras, incluindo a famosa tela “Independên­cia ou Morte”, de Pedro América, continuam ali, mas estão protegidas.

A previsão é que o museu reabra em 2022, no bicentenár­io da independên­cia do país, ao cabo de uma reforma que deve orbitar em torno de R$ 100 milhões, a serem pagos por recursos públicos e privados. Desse valor, o restauro conta em caixa com R$ 3,2 milhões, ou cerca de 3,2% do total, incluindo patrocínio direto e aportes via Lei Rouanet, segundo Solange Ferraz de Lima, diretora da instituiçã­o paulista. O projeto ainda está em captação de mais recursos. O orçamento anual do museu paulistano é da casa de R$ 10 milhões - o do carioca é de R$ 520 mil, não repassados desde 2014. A Fusp (Fundação de Apoio à Universida­de de São Paulo) é a responsáve­l por gerir a execução dos recursos da reforma no Ipiranga. Quem desenvolve a parte arquitetôn­ica é o escritório paulistano H+F, que já desenvolve­u o projeto executivo. A obra em si deve começar no início de 2019.

Leia mais sobre o Museu Nacional na página 5 e na editoria Geral.

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AFP/STR O incêndio que consumiu o Museu Nacional do Rio destruiu um dos maiores acervos do mundo: perdas ainda não foram calculadas

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