Esticar ao inimaginável
Em princípio estava marcado para esta terça-feria (11), depois de suspense, a unção de Fernando Haddad, o Andrade, como é chamado no Nordeste, como o regra três de Lula. Mas os acróbatas insistem em esticar o fio e na segunda (10) falava-se em novo documento da ONU, como se tivesse força, além do aspecto moral, para ter efeitos internos, o que é um outro debate e que nada tem a ver com a interdição que se faz de um condenado em disputar uma eleição presidencial, como se a civilidade o permitisse. Desde o princípio dessa novela sabem o PT e seus advogados e dirigentes que a tese era mais do que careta, ainda que sob o ponto de vista da mobilização eficaz no sentido de manter acesa a chama do político mais messiânico do Brasil, o que se valia inclusive do aparatoso bivaque dos seguidores em seu acampamento no entorno da prisão.
O atentado contra Bolsonaro é de efeitos colaterais mais eficazes do que essa resistência: o brasileiro curte o vitimalismo como decorrência de sua religiosidade e - por que não dizer? - de seu sentimentalismo e pieguice. A notícia de uma nova cirurgia aprofundou essa tensão desse país fantástico em que as suas mais idolatradas candidaturas presidenciais, a principal na prisão e a oposta em dura situação num hospital, é que sustentam o imaginário dominante.
País que precisa de salvadores não merece ser salvo e essa deformação é uma constante em nossa história, posto que às vezes tente o papel um ator pop como Collor ou um shakespeareano como Getúlio Vargas, autor da frase bufa “esse povo de quem fui escravo jamais será escravo de ninguém”, isso escrito à véspera do suicídio. Hamlet ou Macbeth jamais cederia a tamanha cafonice. E sobre essa condicionante do salvador e do homem providencial dá para recorrer ao que Galileu Galilei, em Brecht, levantou em torno da recorrência de heróis.