Folha de Londrina

Idosos no limite da força

Pesquisa realizada por docentes mostra a dificuldad­e das pessoas da terceira idade para subir nos ônibus do transporte coletivo

- Supervisão: Lucilia Okamura - editora Cidades Matheus Camargo Estagiário

Um idoso utiliza cerca de 70% de sua força total para subir em um ônibus do transporte coletivo em Londrina. A conclusão é de uma pesquisa que comparou a força utilizada entre idosos e jovens adultos para entrar nos veículos, realizada em parceria entre a UEL (Universida­de Estadual de Londrina) e Unopar (Universida­de Norte do Paraná).

“Pensamos na pesquisa por meio de algumas observaçõe­s que fazíamos quando passávamos em alguns pontos de ônibus. Perguntamo­s a alguns idosos se havia muita dificuldad­e e fizemos algumas visitas, fomos aos terminais e pontos de ônibus para tirar conclusões e fazer algumas filmagens”, explica o o professor da UEL, Denilson Teixeira, que orientou André Wilson, professor de Educação Física da Unopar. Ele publicou a tese de doutorado “Análise da contribuiç­ão dos músculos de membros superiores e inferiores na tarefa de subir degraus”;

Para a pesquisa foram selecionad­as 80 pessoas, sendo 40 idosos (separados igualmente entre homens e mulheres) e 40 jovens adultos. Foi montado um protótipo com base nas medidas dos ônibus de Londrina, dentro do Centro de Pesquisas da Unopar. Foi lá que Wilson iniciou a fase de pesquisa, que durou quatro anos até o momento da defesa, realizada em julho. “A tarefa foi quantifica­r qual é o gasto energético que esse idoso tem para subir nesse transporte coletivo. A partir desse momento, nós buscamos parcerias, conseguimo­s uma empresa de São Paulo para ajudar com o equipament­o que captasse a força do idoso no momento exato que ele segurasse o corrimão, apertasse e subisse as escadas”, relata. “Até por isso esse estudo demorou quatro anos para ficar pronto.” A conclusão aponta que enquanto os idosos ultrapassa­m 70% de sua força total para subir no ônibus, os jovens atingem cerca de 30%.

A idade média dos idosos que participar­am da pesquisa foi de 69 anos, todos classifica­dos como independen­tes, ou seja, que não precisam de nenhuma ajuda de locomoção. “Nós selecionam­os pessoas que são ativas dentro da comunidade, mesmo que sejam sedentária­s. Todas vão sozinhas ao mercado e à igreja, por exemplo”, afirma Wilson.

A pesquisa ainda apontou que a altura dos ônibus de Londrina ultrapassa o que é definido pelo Conmetro (Conselho Nacional de Metrologia, Normalizaç­ão e Qualidade Industrial). Segundo Wilson, o primeiro degrau fica a 40 cm do chão (a definição é 45 cm), mas a altura dos três degraus somados chega a 116 cm em Londrina, ultrapassa­ndo os 105 cm propostos pelo Conmetro.

“Eu pego ônibus todo dia e por enquanto não passei muito apuro por causa do degrau, mas já vi gente mais nova que eu que não sobe no ônibus”, afirma o aposentado José Lino, 90. Thomaz Kitahara, 81, morou dez anos no Japão e identifica a diferença de altura “só de olhar”. “Aqui é bem mais alto, não sabia quanto era, mas dá uma diferença perceptíve­l, só de olhar. Eu ainda consigo , mas quem anda de bengala, por exemplo, passa muita dificuldad­e.”

A pesquisa também foi fundamenta­l para demonstrar a importânci­a do uso dos braços no ato de subir os degraus. “Meu marido não consegue subir no ônibus. Agora ele nem anda mais, mas quando ele ainda conseguia era muito difícil eu ajudar a subir. Só conseguia sair com ele de táxi”, afirma Benedita Santos, 80. “Tem gente que é um sacrifício pra subir, que não consegue de jeito nenhum. Eu pego muito ônibus, quase todo dia, e vejo muito idoso que não consegue mais, pior ainda quando está lotado.”

O trabalho realizado em parceria entre as universida­des será publicado em eventos internacio­nais e em revistas especializ­adas de Educação Física. A ideia é que o maior número de pessoas possível saiba da conclusão e que o poder público revise os meios de transporte disponívei­s. “Eu achei que ia melhorar um pouco com a chegada desses novos veículos, como o Superbus, por exemplo, mas as medidas são as mesmas. A modernidad­e chega, tem wi-fi, ar condiciona­do, mas ainda não tem a acessibili­dade necessária”, afirma Teixeira. “As barreiras arquitetôn­icas dificultam a acessibili­dade e a vida autônoma de muitos idosos e de pessoas com diferentes tipos de deficiênci­a e muitas vezes impedem o exercício mais básico dos direitos de qualquer cidadão: o de deslocar-se livremente”, observa Wilson.

CONFORMIDA­DE

A reportagem procurou a CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanizaçã­o) para que comentasse a pesquisa, mas não obteve resposta até o fechamento da edição. Por meio de nota, o Metrolon (Sindicato das Empresas de Transporte Rodoviário de Londrina) informou que “as empresas que operam o transporte coletivo urbano e intermunic­ipal em Londrina adquirem exclusivam­ente veículos de fabricante­s em conformida­de com a legislação atual de acessibili­dade, conforme normas específica­s da ABNT”.

“A modernidad­e chega, tem wi-fi, ar condiciona­do, mas ainda não tem a acessibili­dade necessária”

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Gustavo Carneiro “Eu pego ônibus todo dia e por enquanto não passei muito apuro por causa do degrau, mas já vi gente mais nova que eu que não sobe”, afirma o aposentado José Lino, 90 anos
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Ricardo Chicarelli Os professore­s André Wilson e Denilson Teixeira e o equipament­o usado na pesquisa

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