Folha de Londrina

Crônicas e cronistas

Portal do Instituto Moreira Salles traz de volta cronistas que marcaram época

- Celia.musilli@gmail.com

Cronistas também precisam falar de crônicas. E, esta semana, soube que o Portal do Instituto Moreira Salles (IMS) acaba de criar um espaço especial para a crônica brasileira. Inicialmen­te, seis dos maiores cronistas brasileiro­s formam os pilares do portal: Rachel de Queiroz, Rubem Braga, Antônio Maria, Clarice Lispector, Paulo Mendes Campos, Otto Lara Resende.

Ao todo, já são 2.519 crônicas, o que dá a medida da produção intensa desses autores ao longo de sua vivência e colaboraçã­o com jornais e revistas. Cabe destacar que muitos dos textos estão publicados tal como foram vistos por leitores ao longo das décadas. O acervo é formado por vários recortes recolhidos na imprensa pelos autores ou por seus leitores. Isso me faz pensar que, mesmo com toda tecnologia digital, ainda é importante guardar o registro em papel dos textos que, mais que resgatar, ilustram uma fase do jornalismo. A ideia é que a plataforma seja sempre alimentada com novos recortes, segundo o texto de apresentaç­ão do portal que é editado por outro cronista reconhecid­o: o jornalista Humberto Werneck, que conta com a curadoria de Elvia Bezerra (IMS) e Rosângela Rangel (Fundação Casa de Rui Barbosa).

Já é possível acessar cerca de 816 crônicas de Rubem Braga, que começou a escrever profission­almente aos 15 anos, no Correio do Sul, de Cachoeiro do Itapemirim (ES), firmando-se depois como cronista e uma das maiores expressões do gênero no Brasil, com seu estilo por vezes ácido, irônico ou bem humorado. O cronista oscilava, como muitos, entre os textos poéticos e as duras críticas que escrevia em forma de artigos. Fazia crítica social de primeira linha, sabia contestar governos autoritári­os e chegou a ser preso durante o Estado Novo pelo que escrevia.

Clarice Lispector também está no portal, através de seus textos profundos, na abordagem da realidade mais corriqueir­a. Conhecida pela sofisticaç­ão na linguagem, bem como pelo conteúdo psicológic­o de sua escrita, a autora consagrou-se não só como cronista, mas como romancista, deixando à literatura nacional obras que se inscrevem entre as mais destacadas da produção contemporâ­nea, como “Perto do Coração Selvagem” (1943); “A Paixão Segundo GH” (1964) e “A Hora da Estrela” (1977), depois transforma­do em filme por Suzana Amaral. Além de Clarice, o espaço conta com as crônicas de Rachel de Queiroz, outro expoente da literatura de autoria feminina.

Otto Lara Rezende e Paulo Mendes Campos também estão entre os cronistas inaugurais do Portal, eles integram juntamente com Fernando Sabino e Hélio Pellegrino uma das gerações mais importante­s de escritores mineiros. Paulo Mendes Campos - tido como o amor impossível de Clarice Lispector - foi um dos principais colaborado­res da imprensa carioca, mais assiduamen­te em “O Jornal”, “Correio da Manhã” e “Diário Carioca”. Escreveu também durante anos para a revista “Manchete.”

O novo Portal traz de volta estilos díspares, dentro de um gênero que aproxima autores e leitores, através de temas cotidianos e linguagem coloquial que sempre revelam aquilo que os olhos do cronista registram de forma peculiar e que passaria batido aos olhos de um observador comum. O gosto pela crônica mostra que é possível registrar um outro cotidiano, às vezes de forma mais crítica, às vezes de forma mais delicada ou poética, do que aquele que o senso comum distingue, sem notar suas peculiarid­ades reveladora­s ou potencialm­ente transforma­doras da realidade.

O Portal da Crônica Brasileira, que pode ser acessado no endereço cronicabra­sileira. org.br , chega para reunir autores de gerações e sensibilid­ades distintas que nos dão uma visão geral da grandeza da literatura nacional. Ele conta ainda com crônicas quinzenais do editor Humberto Werneck e as ilustraçõe­s magníficas de Cássio Loredano.

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Ilustração: Marco Jacobsen

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