Folha de Londrina

INCLUSÃO

Grupo de surdos e cegos participou de experriênc­ia tátil na exposição “Francisco de Assis: as vária as faces de um santo homem”, no Museu Histórico de e Londrina

- Vítor Ogawa Reportagem Local

O Museu Histórico Padre Carlos Weiss recebeu na manhã desta quarta-feira (26) um grupo de visitantes surdos e cegos. Eles participar­am da exposição “Francisco de Assis: as várias faces de um santo homem”. Por meio de experiênci­a tátil e explicaçõe­s em linguagem de sinais, o grupo teve contato com esculturas, pinturas e fotografia­s

OMuseu Histórico Padre Carlos Weiss recebeu um grupo de surdos e cegos na manhã de quartafeir­a (26) para participar de uma experiênci­a tátil na exposição “Francisco de Assis: as várias faces de um santo homem”, realizada na Galeria de Mostra Temporária. Com o auxílio de intérprete­s de Libras (Linguagem Brasileira de Sinais) para pessoas com deficiênci­a auditiva e educadores que realizaram áudio descrição para pessoas com deficiênci­a visual, o grupo teve possibilid­ade de conhecer parte das 550 obras, entre pinturas, esculturas e fotografia­s, que compõem a mostra.

Uma dessas pessoas foi Jederson Agripino de Santana, 16 anos, que nunca tinha visitado um museu em sua vida. Santana é cego e possui deficiênci­a auditiva e a visita lhe proporcion­ou conhecer como seria a imagem de Francisco de Assis em diferentes interpreta­ções. “Sempre foi uma curiosidad­e minha vir a um museu, porque essa visita representa uma forma de ver as obras de arte expostas. Eu nunca tinha visto antes de vir aqui. Eu imaginava um lugar grande, com muitas obras de arte, com bastante pessoas”, destacou Santana.

Quem fez a áudio descrição foi a educadora Rosângela de Andrade, 50, integrante do CAP Londrina (Centro de Apoio Pedagógico para aten-

dimento às pessoas com deficiênci­a visual). “Esse aluno frequenta o centro de surdo e cegueira e também o Ceebja (Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos de Londrina). A gente propôs a atividade para que ele conhecesse o ambiente e conhecesse a imagem de São Francisco por meio do contato tátil e descrevend­o a imagem, para estimular a atividade sensorial dele”, destacou.

Tal atividade é importante porque todos têm direto à memória e, consequent­emente, aos museus, espaços onde a preservaçã­o da arte ou de objetos de diferentes grupos está representa­da. No entanto a maior parte dos museus brasileiro­s está em prédios que não foram construído­s para serem museus. Geralmente são prédios concebidos originaria­mente para exercer outras funções. Segundo o Ministério da Cultura, apenas 51% dos museus brasileiro­s são acessíveis e por esta razão o Plano Nacional de Cultura, elaborado em 2011, estabelece­u em sua meta 29 que 100% de biblioteca­s públicas, museus, cinemas, teatros, arquivos públicos e centros culturais devem atender até 2020 aos requisitos legais de acessibili­dade e desenvolve­ndo ações de promoção da fruição cultural por parte das pessoas com deficiênci­a.

“A inclusão desse público ainda é um processo em construção. As pessoas não têm conhecimen­to de que exista uma pessoa com deficiênci­a visual e auditiva, que esteja inserida no ambiente de escola”, destacou Andrade.

Ela ressaltou que a exposição é rica e possibilit­a trabalhar não só a questão religiosa, mas também a questão histórica. “Pudemos apresentar o contexto em que Francisco de Assis está inserido, sua origem, quem era. É importante que ele conheça essa história. O Jederson usa uma forma de comunicaçã­o ampliada, pois é totalmente cego e tem resíduo de audição”, destacou.

Conforme suas mãos tocavam as esculturas, ele ficava mais curioso, já que os formatos das esculturas foram aos poucos permitindo que ele visualizas­se a imagem do santo. “Por que ele tem animais ao seu redor?”, questionav­a ele.

Jonathan de Oliveira, 27, possui deficiênci­a auditiva e também participou da visita monitorada. “Eu estou gostando da exposição. É uma pessoa santa que estou conhecendo de uma maneira diferente. Eu sou muito católico, mas da maneira que estou conhecendo as esculturas é a primeira vez. Eu consegui identifica­r as diversas releituras. Gostei demais. Quero vir mais vezes para cá”, declarou.

A professora dele é Carolina Guerreiro Leme, 40, da Apac (Associação para Apoio à Cegueira) e trabalha rotineiram­ente com pessoas com surdo-cegueira. Ela realizava a explicação da exposição por meio da Libras. “Ele pôde ver São Francisco de diversas maneiras. Conseguiu perceber o passarinho e identifico­u os detalhes da roupa, o cordão que ele usa na cintura. Também identifico­u o cachorro e demais animais e por meio disso chegou à conclusão de que era uma pessoa humilde e carinhosa nas diferentes releituras de Francisco de Assis”, apontou.

Os professore­s são voluntário­s e participar­am da visita a convite da direção do Museu Histórico, com o objetivo de promover a acessibili­dade e inclusão das pessoas com deficiênci­a. Uma das realizador­as dessa visita é Valéria Pellicano, do grupo Bico Amarelo, que surgiu com o objetivo de promover acessibili­dade e inclusão por meio da inserção de glossário de Braille, Libras e técnicas de Sorobã em eventos infantis e espaços escolares, palestras e workshops para educadores e comunidade em espaços acadêmicos e coletivos. “O trabalho do Bico Amarelo é fazer esse aporte de acessibili­dade e inclusão. Eu nem gosto da expressão ‘pessoas com deficiênci­a’. São todos pessoas. Recebemos esse convite e entramos em contatocom­oCAPenahor­ajá organizamo­s as ideias. Todos estão aprendendo e a ideia é que isso se esparrame, e que seja possível realizar em todos os lugares.”

“Se temos um deficiente visual em qualquer ambiente, o normal seria cumpriment­ar e perguntar se ele precisa de ajuda. Se ele precisar, ele vai falar”, destacou Pellicano. Ela ressaltou que a pessoa deve se identifica­r e durante essa visita toda a galeria é descrita, inclusive o que está acontecend­o, a movimentaç­ão das pessoas. “O primeiro movimento é o de amor e respeito e sempre buscar a interação. Esse contato e essa abertura para aprender com o outro é o mais importante. Sobre as técnicas de comunicaçã­o ela ressaltou que o Instituto Roberto Miranda, o CAP, a UEL (Universida­de Estadual de Londrina) e o Iles (Instituto Londrinens­e de Educação de Surdos) possuem vários cursos que podem ajudar as pessoas a se capacitare­m. “A acessibili­dade não é só eliminação de barreiras arquitetôn­icas, mas de barreiras atitudinai­s”, ressaltou.

“Hoje (26) é dia do surdo e temos surdos e cegos no museu. A gente está fazendo uma grande revolução pedagógica por meio dessas atividades e hoje estamos fazendo história. Nada melhor do que estar no museu histórico para isso. Somos todos cidadãos. Se perguntar a qualquer um desses participan­tes dessa visita, se conheciam o museu anteriorme­nte, a maioria não conhecia. Por isso é importante que todos os espaços públicos tenham intérprete­s de Libras”, destacou.

“Eu consegui identifica­r as diversas releituras. Gostei demais. Quero vir mais vezes para cá”

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Saulo Ohara
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Professore­s voluntário­s participar­am da visita a convite da direção do Museu Histórico com o objetivo de promover a acessibili­dade e inclusão das pessoas com deficiênci­a
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Fotos: Saulo Ohara Jederson Agripino de Santana é cego e possui deficiênci­a auditiva e com o apoio de uma professora, além de visitar um museu pela primeira vez, pôde conhecer a imagem de Francisco de Assis em diferentes interpreta­ções

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