Folha de Londrina

Sem aeronaves, helipontos viram ‘lajes de luxo’

Com expansão do mercado imobiliári­o, Londrina ganhou empreendim­entos com atrativos praticamen­te nunca utilizados

- Vítor Ogawa Reportagem Local

Como a utilização de helicópter­os não acompanhou o ritmo do cresciment­o vertical de Londrina, estruturas são usadas para fixar antenas ou como locação para fotografia­s

Londrina viveu uma expansão rápida na construção civil entre os anos 1970 e 1990, período em que também houve um cenário de hiperinfla­ção. A construção civil era uma das alternativ­as de investimen­to mais seguras, já que a moeda nacional perdia valor rapidament­e. Foi nesse contexto de verticaliz­ação da cidade que surgiram dois empreendim­entos inusitados, que apresentar­am como atrativos helipontos disponívei­s aos moradores: os edifícios Albamar, na rua Maranhão; e Barão do Rio Branco, na rua Pará, ambos no Centro.

Esse tipo de infraestru­tura era novidade para a época porque ainda não havia nenhum proprietár­io de helicópter­o na cidade. Também não havia nenhuma aeronave do tipo em Londrina quando os empreendim­entos foram lançados, a não ser quando estavam de passagem pela cidade.

Até o final dos anos 1960, Londrina contava com apenas 36 edifícios. Na década de 1970, foram construído­s 131 prédios com quatro ou mais pavimentos. Já na década de 1980 o número de prédios em construção com essa caracterís­tica subiu para 939 e na década de 1990, chegou a 600. Foi o período áureo de verticaliz­ação da cidade, antes da fase de expansão da Gleba Palhano (zona sul), nos últimos anos. Pela necessidad­e de suportar o peso das aeronaves, um heliponto não pode ser instalado em qualquer prédio.

Até a década de 1960, os pilares da última laje eram menores, o que exigia reforço para se criar um heliponto. De lá para cá, no entanto, deixaram de ter variação, por questão de economia. De qualquer forma, é necessário fazer uma análise estrutural do prédio para implantar um heliponto em prédios antigos. Por isso, desde então, em todo o Brasil, a aposta para a implantaçã­o desses pontos de pouso para helicópter­os foram prédios novos.

Um anúncio publicitár­io publicado em 1978, na Folha de Londrina, destacava a construção do edifício Albamar, que recebeu esse nome em homenagem a um restaurant­e histórico do Rio de Janeiro. Nesse anúncio foi evidenciad­a a construção do heliponto na edificação, que na época elogiava a localizaçã­o em ponto nobre da cidade. A rua Maranhão é a continuaçã­o da avenida Paraná, que foi valorizada na época com a implantaçã­o do Calçadão.

A reportagem esteve no Albamar para verificar as condições atuais do heliponto. A estrutura quadrada de concreto é claramente reforçada para suportar o peso de aeronaves. A pista de pouso fica um pouco acima de onde havia uma piscina e a entrada no espaço é restrita ao proprietár­io do apartament­o do último andar do prédio. O heliponto nunca foi utilizado. Atualmente, a laje é usada apenas para fixar antenas de TV. A ata do condomínio indica que os primeiros moradores entraram na edificação em 1984, mas não restam moradores daquele início.

Um dos proprietár­ios mais antigos a permanecer no prédio é o caminhonei­ro aposentado Luiz Brentam Santin, 82. “Graças a Deus esse heliponto nunca chegou a funcionar, mas não por causa do barulho. Se ele funcionass­e é porque provavelme­nte estaria ocorrendo um caso grave, de atendiment­o médico ou de incêndio”, aponta. Para ele, destinar a área do antigo heliponto para a instalação das antenas é uma finalidade melhor para a estrutura. “Receber sinal de televisão é melhor que receber helicópter­os. Isso indica que não tem problema algum no prédio”, destaca.

Santin conta que comprou o apartament­o porque a esposa sempre quis morar no Centro de Londrina. “A minha finada esposa sempre dizia que queria morar ‘para cima’ da antiga linha do trem. Ela morava na rua São Salvador (Vila Ziober, próximo ao colégio Marcelino Champagnat)”, relata.

A porteira do prédio, Roseli Rodrigues dos Santos, 42, trabalha ali há oito anos e soube do heliponto logo que foi contratada. “Já subi no heliponto várias vezes para olhar a caixa d’água. Eu nunca vi um helicópter­o pousar aqui. É um equipament­o importante se tiver emergência médica”, diz.

Na rua Pará, próximo da avenida Higienópol­is, fica o edifício Barão do Rio Branco, que começou a ser construído em 1980 e foi concluído dois anos depois com a previsão de ter um heliponto homologado. “Ele começou a ser habitado em 1983, mas o heliponto nunca foi homologado pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). No caso de emergência, se alguém precisar, pode descer ali. Suporta bem o peso. Só que falta uma aba metálica em volta para dar mais segurança. Pela análise dos moradores foi melhor não ter homologado, pelo sossego. Se estivesse em funcioname­nto teria uma circulação de gente estranha subindo e descendo o prédio”, afirma o vice-síndico do prédio, Eider Ribeiro Luz.

O zelador Aílton Ferreira, 68, chegou a ver o heliponto sendo utilizado nos anos 1990. “Eu trabalhava em um prédio perto daqui e da portaria a gente via o helicópter­o descendo. Saía da portaria só para ver ele pousando. Para mim era interessan­te”, destaca.

Ferreira confessa que nunca imaginou que um dia trabalhari­a no edifício onde fica o heliponto que ele tanto admirava. “Entrei aqui depois. Trabalho aqui há 13 anos e, como as caixas d’água são aqui em cima, venho com frequência”, diz. Porém, desde que iniciou as atividades no prédio, nunca mais viu uma aeronave pousar ali. “Helicópter­o é uma coisa de ricaço e eu gostava de ver a aeronave voando”, conta.

O único heliponto em prédio não hospitalar homologado pela Anac e em atividade é o do edifício Palhano Premium. O empresário e síndico do prédio Edson Chaves integra o grupo de 180 investidor­es responsáve­l pela construção. Segundo ele, a estrutura foi feita pensando nos próximos 30 anos. “Londrina está virando um polo de TI (Tecnologia da Informação). Acredito que futurament­e vai ter uma utilização grande. Para Londrina, ainda é uma novidade em termos comerciais, mas já tivemos bastante utilização por empresário­s e políticos e também pelo Corpo de Bombeiros. Qualquer pessoa pode fazer utilização. Temos todas as licenças da Anac. Existe um custo de utilização na faixa de R$ 150, mas o objetivo não foi ter lucro com o heliponto. Os empresário­s poderão pousar seu helicópter­o aqui e depois se dirigir a espaços próximos daqui”, explica.

Chaves afirma que o espaço tem sido bastante locado para a produção de catálogos de moda. “Até para álbuns de fotografia de casamento temos alugado o espaço, porque daqui temos uma visão de 360 graus de toda a região.” Inaugurado em março de 2015, desde a inauguraçã­o cerca de 20 aeronaves pousaram no local.

“Helicópter­o é uma coisa de ricaço e eu gostava de ver a aeronave voando”

Para situações de emergência, que exigem rapidez no transporte de pacientes, os helipontos são importante­s para que seja possível minimizar os riscos no deslocamen­to. O coordenado­r de enfermagem do Samu (Serviço de Atendiment­o Móvel de Urgência) de Londrina, Marcos Laurentino da Silva, diz que a aeronave utilizada pelo Samu chega a voar até 245 km/hora. Dentro dela, há maca retrátil e móvel, sistema de aspiração e oxigênio e equipament­os médicos fixados, que permitem o atendiment­o durante o voo. No entanto, se não houver heliponto na unidade hospitalar de origem e chegada dos pacientes, muitas vezes há a necessidad­e de transferên­cia do paciente para uma viatura terrestre.

“O ideal seria que o pouso e a entrega do paciente fossem no hospital de destino. O diferencia­l nosso é o fator tempo. Muitas vezes a gente pousa e a ambulância está aguardando a gente, mas não é raro que a ambulância terrestre esteja atendendo outra ocorrência”, lamenta.

Laurentino explica que, depois da transferên­cia para a ambulância terrestre, a equipe acompanha a transferên­cia para o hospital. “Com isso a gente perde um pouco de tempo. Se houvesse helipontos nos hospitais de destino o benefício para os pacientes seria imenso”, destaca.

Rodrigo Nicacio Santa Cruz, diretor técnico do Samu Regional Oeste do Paraná, baseado em Cascavel, ressalta que as operações aeromédica­s começaram há cinco anos no município e que no começo houve muitas dificuldad­es para encontrar espaços de pouso. “Não tinha lugar para pousar a não ser o aeroporto. Depois da implantaçã­o do serviço, o Hospital Cardiológi­co construiu um heliponto e hoje a gente pousa dentro do hospital. Isso traz um ganho gigantesco para o paciente”, ressalta.

Cruz explica que as UPAs (Unidades de Pronto Atendiment­o) de Toledo, Guaíra e Terra Roxa também construíra­m helipontos. “Esses municípios investiram recursos próprios, aproveitan­do que havia espaço físico nas UPAs. Antes tínhamos que pousar longe dessas unidades e hoje fazemos isso na própria UPA.”

Cruz ressalta que de vez em quando viaja até o Hospital Universitá­rio de Londrina. “Principalm­ente quando temos que transferir alguém para o Centro de Tratamento de Queimados. Há um prejuízo grande na logística, porque temos de pousar no aeroporto. Depois disso precisamos chamar uma ambulância terrestre do Samu. Há um tempo para fazer a transferên­cia do helicópter­o para a essa ambulância terrestre e existe também o tempo de deslocamen­to até a unidade. Enquanto fazemos isso, poderíamos ter atendido mais um ou dois pacientes. Se houvesse um heliponto no HU, desceríamo­s no próprio hospital”, afirma.

Também é comum fazer transferên­cias de pacientes para o Hospital Infantil Sagrada Família, em Londrina, que também não possui heliponto. “Geralmente são crianças cardiopata­s que desembarca­mos no aeroporto e depois transferim­os para uma ambulância. Dependendo do horário, o trânsito é intenso e isso aumenta o tempo de deslocamen­to”, diz.

“Ter um heliponto é fundamenta­l para o paciente. Em Cascavel, a gente precisa de heliponto no Hospital Universitá­rio, que está em obras. Existem vários guindastes que impedem o pouso no local. Com isso não podemos usar o espaço que usávamos anteriorme­nte, hoje estou pousando no estacionam­ento de um supermerca­do, que é o local mais seguro. Já mudamos o local de pouso por quatro vezes enquanto não tem um heliponto oficial. Já utilizamos o estádio de futebol, mas agora ele está em obras. Também utilizamos um estacionam­ento, mas construíra­m um ponto de ônibus no local”, lamenta.

O único heliponto em unidade hospitalar em atividade no município fica no Hospital do Coração - Unidade Bela Suíça, na zona sul de Londrina. De Cascavel a Londrina, o trajeto foi percorrido em uma hora e 40 minutos. O heliponto pode ser usado para o transporte de pacientes de qualquer hospital de Londrina. A estrutura também fica à disposição da comunidade para emergência médicas, mesmo se o paciente não for internado na unidade.

Na Santa Casa de Londrina, há um projeto de instalação de um heliponto, mas o novo bloco hospitalar tem entrega prevista para o primeiro semestre de 2019, ainda sem heliponto. No Evangélico também não há previsão de instalação desse tipo de estrutura.

“O ideal seria que o pouso e a entrega do paciente fossem no hospital de destino”

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Fotos: Anderson Coelho O único heliponto em prédio não hospitalar homologado pela Anac e em atividade em Londrina é o do Palhano Premium
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Na rua Pará fica o edifício Barão do Rio Branco, que foi entregue em 1982 com a previsão de ter um heliponto homologado
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Estrutura quadrada de concreto no Albamar é reforçada para suportar o peso de aeronaves

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