Constituição chega aos 30 anos ‘no divã’
Constitucionalista ouvido pela FOLHA critica proposta de nova Constituinte; presidente do STF diz que desafios em promover cidadania persistem
Enquanto o ambiente de polarização ideológica culminou ainda mais com a promoção das campanhas de Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) e escancara o descontentamento de uma grande parcela de eleitores com o sistema político brasileiro, brechas se abriram para que propostas sobre uma possível “revisão” da Constituição Federal fosse realizada pelo próximo governo. Especialmente de Haddad, cuja convocação de uma Assembleia Constituinte fez parte da sua plataforma de governo e declarou recentemente que iria “criar condições para nova Constituição”.
Já do outro lado o vice de Jair Bolsonaro, general Hamilton Mourão, fez declarações no mesmo sentido, de que uma nova Constituição deferia ser promovida pelos o que chamou de “notáveis”.
Para o presidente do Conselho de Membros Fundadores da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst), Flávio Pansieri, a manifestação do vice de Jair Bolsonaro não deveria nem ser considerada, já que “não representa o partido nem o candidato e nem o programa”, avalia. O jurista reconhece apenas a do Partido dos Trabalhadores e lembra que a Academia se posiciona contrariamente à convocação de uma Assembleia Constituinte há pelo menos dez anos.
“A bandeira de uma Constituinte só pode ser defendida por pessoas que talvez não compreendam a real magnitude do modelo constitucional brasileiro, pois a ausência de implementação de direitos não tem nenhuma relação com o texto Constitucional”, afirma.
Dentro do que considera “golpe constitucional”, diz acreditar que a medida deva ser retirada do plano de governo nas próximas semanas havendo um segundo turno entre Haddad e Bolsonaro.
“O texto constitucional contempla todas as garantias de liberdades, como em todas as democracias do mundo, não é insuscetível de modificação àqueles trechos que trabalham com mera regulamentação no modelo de Estado que nós vivemos mas não há nenhuma necessidade de urgência de se convocar uma Constituinte”, afirma.
Para homenagear os 30 anos da Constituição de 1988, celebrados nesta sexta-feira (5), a Academia vai realizar na noite do aniversário, em Curitiba, uma discussão em que haverá o lançamento da 2ª edição da obra “Comentários à Constituição do Brasil”.
“Nós acreditamos que temos muito a comemorar. O professor Lênio Streck vai falar sobre limites da jurisdição constitucional, o professor Ingo Wolfgang Sarlet vai tratar de garantias e direitos fundamentais e eu vou tratar da liberdade do estado de ideias totalitárias nesse momento em que vivemos e o objetivo é celebrar este momento que vivemos hoje, que certamente é melhor do que o momento anterior a 1988. Nós vivemos hoje na plenitude de uma democracia onde o embate de ideias é algo pleno, exposto de forma franca na sociedade, onde todos nós temos o direito de nos manifestarmos a partir dos nossos ideias”, finaliza.
OAB LONDRINA
A subseção Londrina da Ordem dos Advogados do Brasil também vai celebrar a data e avaliar os 30 anos em que a Constituição está em vigor. Ministrarão palestras os especialistas Zulmar Fachin, presidente do Instituto de Direito Constitucional e Cidadania, e Natalina Stamile, pós-doutoranda pela Universidade Federal do Paraná e docente na Università “Magna Graecia” di Catanzaro, na Itália. As palestras farão uma avaliação desse período, evolução da interpretação constitucional, ascensão do poder judiciário e multiplicação da litigância. O evento será 19 horas, no auditório da OAB-Londrina (R. Parigot de Souza, 311).
TOFFOLI
Em Brasília, durante sessão de homenagem aos 30 anos da Constituição Federal, o presidente do Supremo Tribunal federal (STF), ministro Dias Toffoli, disse nesta quinta-feira (4) que a função primária de uma Constituição cidadã é ecoar os gritos do “nunca mais a escravatura”, “nunca mais a ditadura”, “nunca mais o fascismo e o nazismo”, “nunca mais o comunismo”, “nunca mais o racismo” e “nunca mais a discriminação”, em citação a uma fala do jurista José Gomes Canotilho.
“Os desafios existem e sempre existirão, como disse em meu discurso de posse nesta Corte, o jogo democrático traz incertezas, a grandeza de uma nação é exatamente se inserir neste jogo democrático e ter a coragem de viver a democracia”, discursou Toffoli.