Folha de Londrina

Sobram desafios ao próximo governador do Paraná SUSPIRO

Apesar de “suspiro fiscal”, quem for comandar o Estado a partir de 2019 terá que priorizar investimen­tos essenciais em meio a orçamento já comprometi­do

- Mariana Franco Ramos Rafael Costa Reportagem Local Curitiba

- O eleitor paranaense vai às urnas neste domingo (7), entre as 8h e 17h, para decidir quem governará o Estado pelos próximos quatro anos. Em meio a uma crise financeira nacional, que motivou o exgovernad­or Beto Richa (PSDB) a reformar a previdênci­a, suspender reajustes de servidores e cortar investimen­tos, o vencedor do pleito precisará lidar com questões recorrente­s a todo gestor, nas mais diversas áreas.

Estão na disputa dez nomes: Cida Borghetti (PP), que concorre à reeleição, Dr. Rosinha (PT), João Arruda (MDB), Ogier Buchi (PSL), Professor Piva (PSOL), Ratinho Jr. (PSD), Geonísio Marinho (PRTB), Priscila Ebara (PCO), Jorge Bernardi (Rede) e Professor Ivan Bernardo (PSTU).

A Lei Orçamentár­ia Anual (LOA) de 2019, que começa a tramitar já na próxima semana na AL (Assembleia Legislativ­a), prevê receita corrente líquida de R$ 57,3 bilhões, valor para fixação de despesas. Desse montante, R$ 10,2 bilhões vão para a educação, R$ 4,1 bilhões para a segurança pública e R$ 3,7 bilhões para a saúde. São esses os três setores que geralmente merecem mais atenção do chefe do Executivo.

O volume de investimen­tos públicos para o ano que vem deve chegar próximo a R$ 7,5 bilhões. O projeto da LOA estima uma variação de 3,4% das receitas e despesas no orçamento fiscal, que abrange gastos com pessoal, custeio da máquina pública, transferên­cias e obras. O orçamento fiscal sai de R$ 47,1 bilhões para R$ 48,7 bilhões. “É uma previsão conservado­ra e res- ponsável, em razão das incertezas quanto ao desempenho da economia nacional, principalm­ente por causa da transição no comando do País”, admitiu o atual secretário da Fazenda, José Luiz Bovo.

Do total de gastos programado­s, R$ 28,6 bilhões são com pessoal e encargos sociais. Somente para o Executivo, há uma projeção de variação positiva de 4,2% nas despesas com a folha. Já os valores reservados para os poderes Legislativ­o e Judiciário e para o Ministério Público e a Defensoria Pública somam R$ 5,3 bilhões.

Na avaliação de Fernando Motta Correia, professor do Departamen­to de Economia da UFPR, o Paraná conta com um certo “suspiro fiscal” em relação a estados como o Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. “O fato de ser um estado relativame­nte rico, com uma base de estrutura produtiva relativame­nte diversific­ada, é um fator positivo para o Paraná ter uma boa capacidade de arrecadaçã­o”, explica.

O economista diz que, no entanto, todos os estados estarão “reféns” de discussões nacionais prioritári­as em 2019, como a reforma da Previdênci­a. Na avaliação do economista, a mudança da estrutura demográfic­a exigirá a revisão do sistema também no Paraná. “Todo chefe de Executivo que adiar esse debate vai adiar uma bomba para o futuro”.

O alto custo político e a complexida­de do tema, porém, podem dificultar a solução do problema. “Minha percepção é que não teremos uma reforma profunda no sistema previdenci­ário tão cedo. Acho que faremos apenas ajustes pontuais. Uma reforma estrutural, que saneie os problemas do sistema, será postergada. Isso poderá ser um fator negativo para as contas públicas desses entes federados. No final, a conta vai ser cobrada dos cofres públicos”.

PROBLEMAS

Para o consultor econômico Cid Cordeiro Silva, um dos primeiros problemas a serem enfrentado­s é o fato de o Paraná não estar cumprindo o mínimo constituci­onal em saúde. Nos primeiros quatro meses de 2018, o governo investiu 10,66%, ou seja, menos que os 12% previstos em lei. Os números melhoraram no segundo quadrimest­re, chegando a 12,71%. Ele lembra, contudo, que o Executivo incluiu na conta gastos com políticas que não são universali­zantes, como o SAS (Sistema de Assistênci­a a Saúde), o Hospital Militar e o programa Leite das Crianças.

“Não se contesta esses gastos, mas a classifica­ção deles na saúde, para se atingir o percentual. Isso dá aproximada­mente R$ 300 milhões. A Comissão de Orçamento do Conselho Estadual da Saúde vem denunciand­o. A gente avalia que a qualquer momento haja esse entendimen­to por parte do Tribunal de Contas. E o mais grave: já há manifestaç­ão da PGE (Procurador­ia Geral do Estado) alertando o governo sobre esse aspecto. Isso se for retroagir é uma dívida estimada de R$ 4 bilhões (?) Sempre foi assim, antes era até mais grave, pois se incluía os investimen­tos da Sanepar (Companhia de Saneamento do Paraná). É uma bola de neve”.

Além disso, o Estado não atingiu o índice previsto na legislação para os investimen­tos em Ciência e Tecnologia, aplicando 1,99%, e não 2% da receita na área. “E ainda na saúde tem os repasses que o governo faz para os hospitais privados e as terceiriza­ções. Não há controle no gasto dos recursos públicos. Existe também uma defasagem de servidores. Temos oito mil a nove mil servidores e aproximada­mente três a quatro mil cargos que seria necessário preencher, mas que não foram por conta do ajuste fiscal”.

Na educação, segundo Cordeiro, também houve redução de gastos. “Os dados do segundo quadrimest­re apontam que ocorreu redução de R$ 500 milhões no gasto, se comparado com janeiro a agosto do ano passado. Caiu de 34% da receita para 32% da receita. E essa redução ocorreu com práticas como a diminuição de R$ 200 nos salários dos PSS (professore­s temporário­s), a mudança no entendimen­to da hora-atividade, que reduz a qualidade do ensino, e a questão da distribuiç­ão das aulas. O governo antes fazia antecipada­mente e hoje faz no inicio do ano, gerando dificuldad­e e confusões”, pontua.

“No geral, há defasagem de servidores, incluindo na segurança, porque houve muitas restrições à realização de concursos públicos, e isso gera também um acúmulo de investimen­tos “, prossegue. Outro problema, conforme o consultor, é na previdênci­a do Estado. “O governo, pelas várias medidas que realizou, tem um saldo negativo de R$ 5 bilhões. A migração da massa do fundo financeiro para o fundo previdenci­ário, a não contribuiç­ão patronal sobre os servidores inativos e a questão da taxa de administra­ção geraram um passivo, que compromete­u o cálculo atuarial e o período de solvência”.

De acordo com o economista, quando o governo fez o novo plano de custeio em 2012 e a mudança de 2015, estipulava-se um período de solvência de 29 anos. “No último parecer, o TC apontou 12 anos. Mas nós acreditamo­s que já estaria abaixo de dez anos já. É um problema grande, que vai refletir muito no próximo governo”.

PESSOAL

Para Fernando Motta Correia, da UFPR (Universida­de Federal do Paraná), uma das primeiras escolhas a serem feitas pelo próximo governo diz respeito às prioridade­s de despesas. “Um dos dilemas da próxima gestão será exatamente tomar a decisão de tentar diminuir gastos públicos com pessoal para poder ampliar investimen­tos e gerar efeitos positivos no cresciment­o econômico do estado”, opina.

Segundo o professor, as despesas com investimen­tos diminuíram em relação aos gastos com pessoal em todo o país desde o início dos anos 2000. Em 2017, o Paraná extrapolou os 90% do limite de 49% da receita corrente líquida previsto na LRF (Lei de Responsabi­lidade Fiscal) para essa despesa. “Há uma escolha clara de priorizar a despesa com pessoal e sacrificar o investimen­to. É um debate difícil, porque envolve a mudança de cultura”, diz.

DÍVIDA

Na avaliação de Correia, um fator importante para a saúde fiscal do Estado foi a renegociaç­ão, em 2016, da dívida do Paraná com a União, que passou a ser reajustada pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) mais 4% ao ano ao invés do IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibil­idade Interna) mais 6% ao ano. “Temos de observar o comportame­nto da dívida consolidad­a em relação à receita. Se a velocidade de cresciment­o for alta, é um problema, porque pode ter uma trajetória explosiva a médio prazo”, explica.

Cid Cordeiro lembra que o teto de gastos seguirá em vigor e restringe também. Entretanto, ele diz que há sim margens para ampliar os investimen­tos. “O governo fez em 2018 uma previsão na minha avaliação equivocada de receita, subestimad­a, e isso acaba gerando margem para aumento no ano que vem. Também a ausência de gestão das políticas publicas. Não há articulaçã­o entre as diferentes áreas”, critica.

Conforme o consultor, o próximo governador vai ser pressionad­o a aumentar os gastos que não foram realizados. “Claro que o governo eleito pode inclusive continuar com essa politica. E nós teríamos a queda da qualidade do serviço público prestado à população. Se quiser reverter esse quadro e melhorar, estará enfrentand­o desafios enormes, de reconstrui­r o que o Beto Richa fez no Paraná. Essa reconstruç­ão vai demandar R$ 5 bilhões de passivo na previdênci­a, R$ 4 bilhões na saúde, contrataçã­o de servidores e ainda a dívida do governo, de 11,83% de reajuste acumulado

LOA de 2019 prevê receita corrente líquida de R$ 57,3 bilhões

Há uma escolha clara de priorizar a despesa com pessoal e sacrificar o investimen­to”

O volume de investimen­tos públicos para o ano que vem deve chegar próximo a R$ 7,5 bilhões”

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Shuttersto­ck O eleito a ocupar o Palácio Iguaçu terá de lidar com os efeitos de discussões nacionais em pauta em 2019, como a Reforma da Previdênci­a

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