Folha de Londrina

Poentando

- D.pellegrini@sercomtel.com.br

Na lagoa enfim os quatro gansos viraram seis, com dois repentinos gansinhos. Os quatro devem ser dois casais, até pelos tamanhos, pois dois são maiores como são os machos, paizões sempre a grasnar defendendo o grupo. Mas, no dia seguinte, só um gansinho continua, o outro decerto comido por algum furão, predador dos banhados e lagoas.

Ainda sopesando essa perda, vou pelo trilho em redor da lagoa e vapt, capivara se lança na água. Deve estar ansiosa pela noite, para sair fuçando e roendo por aí, o fundo de vale é um mundo. Tardinha, gavião passa batendo lentas asas no rumo do pouso ou do ninho. E de repente passa casal de andorinhas, voando juntas em rápidas evoluções céu afora: como é que conseguem voar sincroniza­das assim?

Casal de andorinhas bem ou mal sempre juntinhas

As garças estão uma pescando na beira da lagoa, outra pousada posando no alto de árvore; casal de garças leva a vida assim, parecendo até descasados. Mas o amigo Google diz que depois farão o ninho juntos, catando e trançando gravetos nalguma forquilha, onde ela chocará e ele ficará de sentinela contra quatis e outros predadores. Quando ela for comer, ele ficará chocando os ovos sem qualquer machismo. Depois de nascidos os filhotes, também se revezarão na busca de comida, assim dividindo as funções domésticas como muitos casais humanos.

Casal de garças mesmo distantes sempre comparsas

Pescadores sabem que garças vem espreitar esperando os peixinhos que eles dão em vez de devolver à água. Então garça vai chegando cada mais perto e, com o tempo, pode até comer na palma da mão. Por enquanto estou agradecido já porque uma delas se achega, talvez para me observar. Faço de conta que a ignoro, ela então passeia por perto, me dá mais umas olhadas e se vai no seu voo tão leve. Grato, garça!

Há que agradecer a garça amiga vem me visitar

Algumas nuvens vão se queimando no poente, outras vão se fazendo e se desfazendo pelo céu. Estou cansado, depois dos trabalhos do dia, invejando tantos pássaros a cantar.

Quem dera ser nuvem que nada faz além de se desfazer

Corisco risca o horizonte, e o trovão demora alguns segundos para chegar.

O trovão retruca: - Quem você pensa que faz a chuva?

O poente é espetáculo a contar que estou entre tudo que vivi até hoje e tudo que desconheço daqui pra frente. Otimista, posso pensar que já é pré-aurora, aceno de amanhã, ou pessimista posso ver como morte do dia, velório já com seu primeiro círio, a estrela Vésper. Me conforto lembrando que o sol também morrerá, embora daqui a seis bilhões de anos conforme a ciência, previsão que porém nenhum cientista confirmará...

Poente e tanto a tarde fazendo fogo a noite puxando o manto

Vou para casa, chego com as estrelas. Branquinha vem atrás, o rabo a abanar feliz, farejando lá e cá, acolá e acoli, totalmente alheia ao tempo.

Alegrement­e em paz quem anda para a frente sem olhar para trás

Adeus, dia de hoje; boa noite, estrelas; e você, velho sol, até amanhã, com seu velho poente de um novo dia. E obrigado, Tempo, por tudo que me deste e também por tudo que me tiraste, principalm­ente do Ego; obrigado, meu mais velho e sempre renovado amigo.

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