Folha de Londrina

Desigualda­de: a maior epidemia no sistema de saúde do Brasil

- ESPAÇO ABERTO FELIPE BURATTINI, executivo e fundador de startup de saúde

Hoje, menos da metade da população mundial tem acesso a serviços essenciais de saúde. Além disso, cerca de 800 milhões de pessoas gastam mais de 10% de seu orçamento doméstico com cuidados médicos e quase 100 milhões de pessoas são empurradas para baixo da linha de pobreza a cada ano por causa das despesas com saúde. No Brasil, por exemplo, a falta de acesso é responsáve­l por um gap de expectativ­a de vida que pode chegar a 20 anos dependendo de fatores como sua classe social ou local de moradia, e por uma média de 830 mortes evitáveis por dia. Ou seja, 305 mil mortes evitáveis anualmente! Isso é inaceitáve­l. As desigualda­des em saúde não são apenas uma nota de rodapé nos problemas que enfrentamo­s, mas, sim, o principal problema. A injustiça social está matando em grande escala.

O Brasil possui um sistema extremamen­te deficiente. Por falta de opções, as pessoas acabam tornando-se reféns de programas governamen­tais, como o SUS, no qual, para agendar uma simples consulta, muitas vezes você terá que esperar de 3 a 6 meses, ou companhias de seguro, mas nenhum deles realmente resolve o problema. Segundo pesquisa realizada pelo Ibope e SPC, mais de 70% dos brasileiro­s não possuem plano particular, e dos que tem, mais de um milhão cancelam seus planos anualmente. Não por não desejarem mais estar cobertos, mas por não poderem mais arcar com os custos, afinal, além das mensalidad­es serem altíssimas, as taxas de reajuste são muito acima da inflação e não há garantia alguma de que caso algo aconteça, você terá acesso aos tratamento­s necessário­s.

Novas tecnologia­s têm sido ferramenta­s fundamenta­is para empoderar o novo consumidor e melhorar o acesso tanto a serviços quanto a informação, principalm­ente para a população de baixa renda. Hoje temos exemplos de serviços que combinam, por exemplo, inteligênc­ia artificial, machine learning e big data para dar diagnóstic­os mais precisos, sem precisar efetivamen­te consultar um médico, em poucos cliques e com algumas perguntas respondida­s em um app, no sofá da sua sala, você pode ter alternativ­as de diagnóstic­os que tem mostrado uma assertivid­ade média superior a médicos reais. Temos as tecnologia­s vestíveis que conseguem traquear suas funções corporais, como índice de açúcar no sangue, batimento cardíaco, oxigenação, pressão, etc. Computação quântica tem se mostrado uma ferramenta fundamenta­l para, por exemplo, iniciar uma era de cuidados de saúde personaliz­ados.

Além da aplicação direta de novas tecnologia­s em pacientes, também temos um mar de oportunida­des com Internet das Coisas para ajudar a reduzir gastos com hospitais e evitar acidentes, afinal, um hospital inteligent­e, com sensores para tudo, conseguiri­a alertar um problema em uma máquina, tubulação ou o que for antes mesmo do problema acontecer, ou, podemos ir além, já existem materiais cirúrgicos com sensores que alertam o cirurgião caso ele esqueça algo dentro do paciente. As possibilid­ades com novas tecnologia­s são inúmeras e muitas soluções ainda são inimagináv­eis. São ferramenta­s, não solução.

Para encontrarm­os a solução, acredito que devemos dar um passo atrás e olhar não para a tecnologia, mas para as pessoas, para a sociedade. Para inovar em saúde, precisamos mudar o sistema, e para mudar o sistema precisamos mudar a forma que as pessoas pensam. Precisamos voltar a pensar e agir em comunidade. Precisamos entender que o poder das pessoas é e sempre será muito maior do que as pessoas no poder. Saúde é um mercado que é tradiciona­lmente unilateral. O paciente é o menos importante e está na hora disso mudar! Precisamos colocar o paciente no centro do processo, precisamos nos envolver como comunidade para resolver os problemas que nos afligem ao invés de esperar que alguém o faça por nós. Está na hora de entrarmos na era da economia do acesso.

Para encontrarm­os a solução, devemos olhar mais para as pessoas, para a sociedade”

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