Folha de Londrina

No colégio interno

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Houve uma época décadas de 1950 e 1960 - em que as famílias colocavam suas filhas internas em colégio de freiras e os filhos em seminários para estudar. Era então janeiro de 1962, quando meus pais chegaram para mim e disseram que eu iria para o internato em Agudos (SP), onde minhas primas Venturosa, Carmem e Cidinha, de Cornélio Procópio, haviam se formado professora­s. Não se discutia, apenas obedecia. A mamãe, com a lista do enxoval em mãos, começou a prepará-lo, aplicando meu número 64 nas roupas pessoais, de cama, banho, até no véu branco que ainda se usava na época para ir à igreja. Tudo pronto, eu precisava estar no colégio no final de fevereiro porque as aulas começariam em março.

Era o Instituto Nossa Senhora do Sagrado Coração, dirigido pelas Irmãs Franciscan­as. Funcionava o internato - uma média de 150 alunas - o externato e também ali estudavam as meninas que iam se tornar freiras, as candidatas. Havia dois dormitório­s para as alunas do curso normal, dois para nós do ginásio e um para as futuras freiras. Em cada dormitório, havia mais ou menos de 40 a 50 camas e uma cela onde dormia a irmã responsáve­l por ele. Assistíamo­s à missa na capela um dia sim, outro não, revezando com as maiores; mas aos domingos, íamos todas. Durante a semana, depois do café da manhã, assistíamo­s às aulas.

Almoçávamo­s,

descansáva­mos um pouco no pátio interno e, em seguida, íamos para a sala de estudos onde cada uma tinha sua carteira pra guardar todo o material escolar. Ficávamos a tarde toda, fazendo tarefa, estudando. Como sempre gostei de ler, eu lia Machado de Assis, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Jorge Amado e fazia ficha de leitura de cada livro. Duas vezes por mês, tínhamos que escrever para casa e deixávamos as cartinhas na mesa da Madre Joaquina que ficava conosco na sala de estudos. Lá pelas 15 horas, uma irmã ia até a sala e organizava as meninas para ir tomar banho. Este tinha que durar no máximo dez minutos, depois ela já ficava batendo na porta.

Às 17h30, era o jantar; em seguida, rezávamos o terço na

gruta de Nossa Senhora que havia na entrada do colégio. Ficávamos passeando por ali até chegar a hora de dormir. Às 19h30, na minha cama, eu ouvia emocionada, a linda música Moonlight Serenade, com o Glenn Miller e Orquestra; era o início dos serviços de alto-falante do cinema de Agudos. A Irmã ficava conosco, no dormitório, andando pra lá e pra cá e, às 20 horas, ela apagava as luzes.

Aos sábados, tínhamos filmes no Salão Nobre; era a época de Romy Schneider (a Sissi), Sandra Dee, Troy

Donahue, etc. O filme Ben Hur com o Charlton Heston, assistimos em Bauru. Aos domingos, tínhamos música. As meninas maiores dançavam rock, twist, ao som de Bill Haley e seus Cometas, Chubby Checker, Elvis Presley, enquanto nós sentávamos no chão e jogávamos damas, dominó, varetas, cinco saquinhos, baralho. Nos feriados prolongado­s, as meninas que moravam em cidades perto de Agudos, iam para suas casas e nós que morávamos longe, ficávamos no colégio. Mas o papai sempre me

visitava porque ia buscar cerveja Brahma na fábrica em Agudos para levar pra Sertaneja.

Nos primeiros dias de colégio, eu chorava todas as noites de saudades de casa, dos meus pais, dos meus irmãos e das nossas brincadeir­as. Mais tarde, reconheci que foi um tempo bom. Agradeço a Deus poder estudar num ótimo colégio, que me deu uma boa formação, poder conviver com tantas pessoas bacanas que passaram na minha vida: as irmãs, as colegas, as futuras freiras...

Nos primeiros dias de colégio, eu chorava todas as noites de saudades de casa, dos meus pais, dos meus irmãos e das nossas brincadeir­as. Mais tarde, reconheci que foi um tempo bom”

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