Folha de Londrina

AVENIDA PARANÁ

Participan­te da Marcha da Produção relembra dificuldad­es enfrentada­s pelos produtores que participar­am da ação

- Vítor Ogawa Reportagem Local

Sentado na calçada, ao lado de um poste caído, Chico Buraco mostrou-me sua nova canção

Seguir em caravana de Londrina até o Rio de Janeiro era uma aventura ousada. O advogado e ex-vereador em duas legislatur­as, Walter Gastaldi, 91, foi um dos participan­tes da Marcha da Produção. “Isso foi em 1958 e eu tinha 31 anos na época. Falei com meu pai, e ele era contra a minha participaç­ão nisso. Ele era um ‘italianão’ bravo. Enquanto ele falava para eu não ir, eu falei que queria ir, porque já estava mexendo com política”, relembra.

Gastaldi foi eleito vereador pela primeira vez naquele ano. “Foi uma época da grande produção de café, mas o valor da saca estava baixo. Não estava à altura daquilo que precisávam­os. O protesto foi realizado para ver se o governo cedia”, diz.

Segundo ele, embora o protesto tenha sido realizado em uma data próxima do período eleitoral, a mobilizaçã­o não tinha fins eleitorais. “A cidade estava favorável à Marcha da Produção. Naquele tempo todo mundo era mais unido. Não era como hoje, em que cada um só pensa por si mesmo”, destaca.

Gastaldi relembrou que a popularida­de do Juscelino Kubitschek era baixa na região naquela época. “A situação era muito ruim no País inteiro, muito difícil. Aqui, embora os preços do café estivessem baixos, ainda estava melhor do que o cenário no restante do País”, destacou. Entre 1956 a 1961 foram deflagrada­s 168 greves somente na capital federal. Só em 1958, foram 29 grandes greves no País.

Embora alguns cafeiculto­res tenham preferido ir de carro, muitos foram caminhando. “Eu fui a pé. Tinha muita gente que foi caminhando como eu, sob sol forte. Saímos de manhã, entre 9 e 10 horas. A turma estava com roupa de trabalho, mas como a maioria era formada por donos de propriedad­es, sitiantes e fazendeiro­s, todos estavam razoavelme­nte bem vestidos. Não havia muitos lavradores, funcionári­os dessas pessoas”, destaca. “Foi uma coisa boa, batuta. Mostrou que o povo tem que ser ouvido. Aquilo foi para demonstrar a força do Norte do Paraná. Não era só gente de Londrina. Veio gente de cidades de toda região”, relembrou.

Enquanto o grupo caminhava, as fileiras iam engrossand­o. “Fechava toda a rua. Não dava para cruzar a passeata. Tinha muita gente, tanto na calçada como na rua”, relembra.

Os que participav­am da caravana não acreditara­m que ela tinha sido oficialmen­te cancelada, e não acreditava­m que o Exército estava disposto a parar o movimento. Mas assim que o grupo chegou à ponte do rio Jataizinho, se deparou com uma tropa. “Vi de longe que lá na frente o pessoal tinha parado. Não dava para eu ver o que estava acontecend­o na frente, porque estava a uns 500 metros para trás. O deputado Olavo Ferreira Garcia e o senador Nelson Maculan tentaram dialogar com os militares, mas 15 minutos depois eles pediram para os demais retornarem. Eu só ouvi eles dizerem que os homens estavam ‘brabos’ e que era para a gente voltar”, lembra.

A Marcha tomou o caminho de volta, cabisbaixa por não ter conseguido o objetivo de seguir até o Rio de Janeiro. “Quando chegamos na altura do atual Detran, o grupo se dispersou e cada um tomou seu rumo.”

Logo após as eleições legislativ­as de 3 de outubro de 1958, o governo anunciou o Programa de Estabiliza­ção Monetária, plano econômico elaborado por Lucas Lopes e Roberto Campos, que incluía o congelamen­to salarial, o fim do incentivo aos cafeiculto­res, a contenção do crédito e o aumento dos impostos de renda e de consumo.

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Ricardo Chicarelli “A cidade estava favorável à Marcha da Produção. Naquele tempo todo mundo era mais unido”, conta Walter Gastaldi

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