'A PF é uma polícia republicana'
Novo delegado-chefe da Polícia Federal em Londrina destaca desafios na função e faz balanço da Lava Jato
Maior investigação contra a corrupção já realizada no Brasil, a operação Lava Jato completou quatro anos de trabalho em maio. Desde 2014, a investigação, que levou diversos nomes importantes da política e do empresariado para trás das grades, acabou elevando o grau de reconhecimento da população pela PF (Polícia Federal), em especial a do Paraná. A operação, inclusive, tem sua origem ligada a Londrina.
Segunda maior cidade do Estado, Londrina também é alvo constante de operações da instituição, entre elas ações da própria Lava Jato. No início de outubro, Joel Moreira Ciccotti assumiu a chefia da delegacia regional da Polícia Federal. Natural de Fernandópolis (SP), formou-se em direito pela UEL (Universidade Estadual de Londrina). Trabalhou na Justiça Federal de Maringá por cinco anos, até passar no concurso para delegado da PF. Já atuou em Imperatriz do Maranhão (MA), Marília (SP) e Guarapuava (Centro-Sul). Foi superintendente regional da PF no Rio Grande do Norte. Está na terceira passagem pela PF de Londrina, totalizando oito anos.
À FOLHA, o novo delegado-chefe da Polícia Federal em Londrina, que no total atende 84 municípios do Paraná, elenca as prioridades de sua gestão, fala sobre as principais demandas da instituição e comenta sobre o papel da PF na Lava Jato, garantido que o trabalho é independente do governo.
Quais as prioridades para a nova gestão à frente da Polícia Federal em Londrina?
A ideia é fortalecer os setores de investigação com recursos tecnológicos e humanos, até porque a maioria dos órgãos (pelo Brasil) tem enfrentado problema crônico de efetivo. Temos a preocupação de tentar fazer que pelo menos os postos que perdemos com aposentadoria sejam repostos. Assim como nos outros setores, já que prestamos vários serviços públicos à comunidade, como a emissão de passaportes, temos setor de estrangeiros, atendimento para registros armas de fogo. Estes setores, buscaremos mantê-los e, na medida do possível, melhorá-los. Uma medida que está implantada e contribuiu muito para melhoria no atendimento foi aumentar o horário para quem busca o setor de passaporte. Conseguimos reduzir a fila de espera. Hoje o cidadão que procura a PF de londrina consegue ser atendido em menos de dois dias. No caso do setor de estrangeiros vamos aumentar o atendimento, com a contratação de servidor terceirizado. Além disso, temos em Londrina investigações de pequenos a grandes delitos e a PF como um todo tem combatido com mais ênfase os desvios de recursos públicos e lavagem de di- nheiro. Os servidores precisam ser capacitados para investigar este tipo de crime, já que são praticados com bastante inteligência e contam com peculiaridades. Vamos buscar o investimento para estes policiais se capacitarem no combate destes crimes que demandam um tipo de conhecimento especifico.
Londrina tem a presença de muitos produtos contrabandeados, principalmente cigarros, sendo inclusive rota de contrabandistas. Como combater isto?
Temos plena convicção que o contrabando de cigarros é uma prática muito rentável. Tanto que os contrabandistas investem pesado nisto, com veículos de alto custo. Então, a Polícia Federal foca nas estruturas maiores, em que há um volume financeiro muito grande. Até em razão disto nós não combatemos o pequeno vendedor de cigarro que eventualmente se vê nas esquinas pela cidade, até porque ali seria volume muito pequeno de mercadoria. O combate mais efetivo é feito nos grandes “empresários do crime”. Tem ainda o descaminho, que é a mercadoria que a importação é permitida, mas tem que pagar o tributo. Tanto no combate ao contrabando como no descaminho, vamos procurar ampliar a atuação, fazendo fiscalizações e investigações voltadas para o combate de forma inteligente, juntamente com outros órgãos de repressão
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu em maio pelo fechamento da carceragem da PF na cidade. Como está este processo?
A carceragem ainda está aberta porque a decisão judicial que determinou o fechamento concedeu prazo para que fosse feito planejamento da forma como se implementaria esta desativação. Isto já foi encaminhado para o Depen (Departamento Penitenciário do Estado do Paraná). Pelo fato de termos um volume que não é tão grande de presos, não será difícil fazer esta desativação. Hoje temos bom relacionamento com o juiz da Vara de Execuções Penais (Katsujo Nakadomari), no sentido de fazer o encaminhamento (dos presos) para o sistema estadual. O encerramento da nossa custódia vai trazer a possibilidade de utilizarmos os servidores que precisamos manter para cuidar dos presos que ficam aqui em outros setores. Isso vai contribuir para as ações que demandam efetivo maior. Tenho a expectativa que muito em breve temos a condição de fazer a desativação total da nossa custódia.
A Justiça ordenou a reintegração de posse do residencial Flores do Campo (zona norte). Quando a determinação será cumprida?
No ano passado houve uma mobilização, com um planejamento muito grande para retirar as famílias de lá. Teve a ação na Justiça e determinação (do Tribunal Regional da 4ª Região) para que fosse suspensa (a reintegração). Todos os prazos transcorreram e, recentemente, estive no residencial juntamente com representantes da Caixa Econômica Federal e oficial de Justiça e comunicamos para as lideranças que se apresentaram que estaríamos retomando as providências necessárias para dar cumprimento à ordem de reintegração. Paralelamente a isso, as famílias que ainda estão lá foram à prefeitura, que estaria se mobilizando para tentar solucionar a questão com a disponibilização de um espaço, onde estas famílias poderiam ser realocados. Isto ainda está em tramitação. A própria Caixa, que é a parte autora da ação, está empenhada nesta solução pacífica. Estamos em contato com Caixa para que na eventualidade de fazer a desocupação, já tenhamos condição de fazê-la em prazo curtíssimo. Recentemente foram feitos levantamentos e a partir deles temos condição de mobilizar o quantitativo necessário para retirada. Estamos em sintonia com os envolvidos, de forma que se essa solução que está sendo desenhada pela prefeitura for viável e acontecer, será melhor, pois não seria necessário fazer desocupação forçada. Mas se precisar, estamos preparados.
Como o senhor vê o destaque que a Polícia Federal ganhou nos últimos anos com a operação Lava Jato?
Vejo de forma positiva. A operação Lava Jato projetou a Polícia Federal em âmbito nacional e internacional. Foram feitos até filmes, séries, documentários e livros. No aspecto da operação em si, sabemos que ela é um trabalho conjunto, uma força-tarefa, com a PF fazendo a investigação e cuidando da parte ostensi- va, mas existe o trabalho do MPF (Ministério Público Federal), Justiça Federal, Receita Federal, CGU (Controladoria-Geral da União). Órgãos parceiros e que também têm importância em todo o contexto. Necessário destacar que a PF é uma polícia republicana, ou seja, que não é de governo. Ela atua independentemente de quem seja a pessoa, instituição ou empresa que está sendo investigada. Tanto que verificamos muitas operações ora com foco em determinado partido, ora em outro, o que significa que a Polícia Federal não tem partido. Ela investiga quem pratica o crime, o que independe do viés ideológico, se está dentro ou fora do governo. E vai continuar assim.
A legislação atual permite esta independência funcional. Nos até temos um anseio de que houvesse independência administrativa e financeira, pois isso ajudaria no aprimoramento da instituição e está em discussão. A prova da independência é que recentemente uma investigação da PF concluiu que o próprio presidente da República (Michel Temer) estaria envolvido (em esquema de propina).
A Lava Jato já teve operações em Londrina e no Paraná. Participou de alguma?
Recentemente tivemos o desdobramento da fase da Integração, que investiga a questão dos pedágios. A Polícia Federal de Londrina, até pela importância da nossa cidade e região, está sempre sendo demandada em investigações de várias localidades do País. Recentemente, também cumprimos mandado da operação Registro Espúrio, que está sendo conduzida por Brasília.
Nas eleições de 2018 foi lançada uma frente nacional composta por agentes das PF e apoiadores. Cinco acabaram eleitos entre deputados federais e estaduais no Brasil. Como o senhor enxerga esta ascensão da PF na política?
Acredito que a visibilidade da Polícia Federal nas operações que tem desencadeado no País possa ter contribuído para que esses colegas policiais tenham tido sucesso nas eleições. Não tenho condições de fazer uma análise mais aprofundada ou o que eles pretendem defender enquanto parlamentares, uma vez que foram eleitos por alguns partidos diferentes e cada um tem sua ideologia e, eventualmente, recomendações. Não tenho como fazer juízo sei isso será proveitoso ou não para a PF. De qualquer forma é sempre bom sabermos que nas assembleias legislativas e Congresso Nacional existem pessoas da Polícia Federal, porque acreditamos que os servidores da PF são pessoas competentes, que têm conhecimento e vão poder desenvolver um bom mandato e trabalhar em prol do País, para nós é uma satisfação.