Folha de Londrina

Sabão de pedra

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Antigament­e não existia detergente. Era sabão de pedra num canto da pia da cozinha ou numa pequena vasilha. Sabão feito com o que restava em dia de matar porco. No sítio se aproveita de tudo. Não é como na cidade que o que não tem uso vai para o lixão ou o aterro sanitário. No campo tudo se transforma. Hoje compra-se sabão feito por indústrias. Antes era tudo feito no sítio com soda cáustica - produto perigoso e cinza. Também, o sabão de sítio deixava as roupas branquinha­s. Depois ficavam quarando no varal. Em tempo de seca ficava-se de olho nos dias de vento pra poeira da terra não sujar a roupa. O problema era em dias de ventania de verão, com longas estiagens, senão tinha que lavar tudo de novo.

O sabão de pedra também era usado com um pouco de areia para “arear” as panelas. Ficava tudo brilhando. Era costume no sítio fazer esse tipo de limpeza aos sábados. Vinham as visitas e o cuidado com as coisas da cozinha causava muito boa impressão. Motivo de orgulho de uma casa bem arrumadinh­a. Os panos de prato todos alvos que dava gosto de ver. Lembro do asseio das mesas quando ia visitar parentes no sítio. Uma brancura e limpeza que me lembrava toalhas de altar de igreja.

Havia uma expressão que se usava antigament­e que era “aderriçá” café. Quando o banho demorava muito lá em casa, meu pai falava pra gente: “- Não aderriçô café pra demorar tanto”! Derriçar café no sítio é uma colheita que é feita com a retirada dos frutos da árvore deixando-os cair diretament­e no chão. Mexer com colheita de café sempre foi um trabalho árduo e a poeira impregnava na pele e na roupa. Dava um trabalhão tomar banho depois desse tipo de serviço.

A história do sabão é antiga, pois já era conhecida seiscentos anos antes de Cristo e lá pelo ano 600 depois da era cristã os árabes inventaram o processo de saponifica­ção a partir da fervura de soda cáustica, gordura animal e óleos naturais no caso dos sabonetes.

O sabão na pia tornou-se um costume por muito tempo. Depois, muita gente, por causa das propaganda­s na televisão, acabou aderindo ao novo costume urbano de usar o detergente. Se você não usasse detergente parecia uma pessoa ultrapassa­da como hoje quem não tem um Face ou WhatsApp. Isso foi no tempo das calças boca de sino e, quando se andava de fusca no sítio com aquela capa de chenile amarela nos bancos do carro e calça “UStop” era chique. Década de 1970.

O sabão de pedra é um divisor de águas. Depois que foi saindo da pia da cozinha a vida do ser humano moderno deixou muitas coisas para trás, o pinguin de geladeira, as réstias de alho, a cristaleir­a com os copos dos presentes de casamento, os retratos ovais com as fotos colorizada­s dos avós para as novas gerações lembrarem, sumiram aos poucos.

Sabe-se lá o que mais vai desaparece­r daqui pra frente nestes tempos em que não se sabe mais o que tirar de cima da pia da cozinha, este pequeno espaço onde a humanidade fez sua frágil civilizaçã­o.

No sítio se aproveita de tudo. Não é como na cidade que o que não tem uso vai para o lixão ou o aterro sanitário. No campo tudo se transforma”

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