Relatos ocorrem em escolas e hospitais
A experiência da promotora da Vara Maria da Penha em Londrina, Susana Lacerda, e da delegada do Nucria (Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Crimes), Lívia Pini, incida que “os hospitais e escolas são a porta de entrada da violência”. Nesses ambientes a criança costuma relatar a violência de forma espontânea ou surge a por parte dos profissionais. Nas escolas, a professora Cristiane Sola, que atua na gerência educacional de apoio especializado, da SME (Secretaria Municipal de Educação), conta que é comum os relatos acontecerem através de redações ou desenhos. Em outros casos, a criança conta diretamente para o professor.
Um episódio emblemático foi o do advogado e exassessor da Câmara Municipal de Londrina, Marcos Colli, que foi condenado a 54 anos de prisão pelo abuso sexual contra 14 meninas de 5 a 13 anos de idade. O caso foi descoberto porque uma das vítimas contou sobre os abusos para uma professora. “Às vezes, é só na escola que a criança sente confiança. Ela acaba tendo um vínculo afetivo com o professor (a) e sente segurança para pedir esse socorro”, comenta Sola.
Há um ano, a Comce (Comissão de Casos Especiais) da SME foi reativada para que os professores sintam mais segurança para fazer denúncias, uma vez que, segundo Sola, já houve situações de ameaça. Além da notificação direta ao Conselho Tutelar ou Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) 3, o professor pode encaminhar um e-mail com o relato da criança, utilizando as mesmas palavras dela, ou fazer a denúncia por telefone. “Isso faz parte da escuta especializada e que vai para a ficha Sinam (Sistema Nacional de Atendimento Médico) como relato fidedigno em nome da secretaria e encaminhamos para os órgãos responsáveis”, afirma.
De outubro de 2017 a outubro deste ano, a Comce registrou 83 denúncias. “Isso demonstra que os professores realmente estão se sentindo mais seguros para fazer a denúncia através da comissão. Para se ter uma ideia, em janeiro de 2017 a outubro de 2017, foram somente seis denúncias”, compara.
No ambiente hospitalar, no caso o HU (Hospital Universitário) de Londrina, o médico Renato Moriya afirma que geralmente “a violência chega mascarada, com outras queixas, e nem sempre se consegue confirmar o diagnóstico e assim, dar o encaminhamento”. Ele diz que, no Brasil, de cada dez crianças que são vítimas de violência, apenas um caso é notificado. Pensando justamente em mudar essa realidade, foi fundada, em agosto de 2017, a Comissão Permanente de Defesa da Criança e Adolescente Vítima de Violência do HU. “O foco é aglutinar os casos, levar informações e capacitação para que toda equipe esteja habilitada para esses atendimentos, inclusive na questão de identificar casos suspeitos”, aponta Moriya.
No início do mês, a comissão realizou o 1º Simpósio sobre Violência Infantil do HU. No evento, especialistas de diversas áreas do município falaram sobre protocolos médicos, proteção da vítima, identificação dos sinais de violência e encaminhamentos para a rede de proteção do município. De acordo com a assistente social do HU, Maria Lúcia Maximiano, entre julho de 2017 e julho de 2018, o hospital atendeu 44 crianças e adolescentes entre 3 e 17 anos, vítimas de maustratos, sendo 16 de violência sexual, 10 casos de violência física e 18 de negligência/abandono.
A infectologista pediátrica Jaqueline Dario Capobiango, que atua no ambulatório do HU que atende crianças com aids e vítimas de violência sexual, revela que um caso novo de violência sexual envolvendo criança ou adolescente surge a cada semana no hospital. Ela palestrou sobre as principais ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis) e esclareceu pontos importantes sobre os protocolos de quimioprofilaxia. (M.O.)