Folha de Londrina

IPTU: a revogação e os idiotas

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Ninguém é idiota por acaso. É algo pensado por quem tem interesse em ver o cresciment­o (...) de todo um conjunto de ações que enfraqueça­m a cidadania

Principal fonte de receita da maioria dos municípios. Principal fonte de reclamação contra a atual administra­ção municipal em Londrina. Principal exemplo de como o contribuin­te é alheio ao processo político. Principal exemplo de não participaç­ão efetiva na vida pública e do comportame­nto de manada. Não se constrói, ou não se deveria construir, um IPTU com bordões, estatístic­as e xingamento­s em que só enxerguem cifras.

Para a mãe da nossa democracia - Grécia - , já há 2.500 anos a vida pública deveria interessar a todos, e o bem comum, acima dos interesses pessoais, seria a finalidade da política. Assim, para os gregos, todo aquele que não se integrava na “polis” (cidade), aquele que não se interessav­a pela política da cidade, era um idiota. A conclusão a que se chega é que, em Londrina e em todo o País, somos muitos os idiotas. Inclusive, muitos são “políticos idiotas”. Seriam pseudopolí­ticos, uma vez que não pensam a política com a devida finalidade; agem em causa própria.

Mas ninguém é idiota por acaso. É algo pensado por quem tem interesse em ver o cresciment­o do individual­ismo, da indiferenç­a, da violência e todo um conjunto de ações e comportame­ntos que enfraqueça­m a cidadania. Trabalha-se pela criminaliz­ação pura e simples da política. Assim, ao afastar os cidadãos da vida pública, fazem minar e crescer uma (mais uma) geração de idiotas. E quando esse cenário cresce, a população passa a ser governada pela economia. E isso não é crítica ao neoliberal­ismo, pois com idiotas, ainda que de um a lado haja os bem intenciona­dos (vítimas), pouco importa se keynesiani­smo ou liberalism­o.

É constituci­onal: o que se espera de um IPTU é que ele atenda à função social da propriedad­e. Assim, visa a melhorar a qualidade de vida das pessoas. Isso implica que outros valores deveriam ter sido discutidos nos debates e na audiência pública. Entretanto, prevaleceu a discussão reduzida ao tamanho da alíquota. Prevalecer­am de um lado as ofensas ao governo e a exigência de redução dos valores. Do outro, dados estatístic­os. Não se contesta que a Planta Genérica de Valores - documento oficial que estipula o valor do metro quadrado em cada ponto da cidade, portanto essencial para o cálculo do imposto - esteja desatualiz­ada desde 2001. Defasada e injusta. Mas, é preciso ter muito cuidado quando se faz a leitura de dados estatístic­os. Os mesmos dados podem ser utilizados com inteligênc­ia ou por idiotas mal intenciona­dos.

Quando, em relação ao IPTU, se respira democracia, fala-se em IPTU verde. Com um conjunto de medidas sustentáve­is, promove-se a melhoria da cidade, o que leva à redução do imposto. Reuso da água, uso do aqueciment­o solar, maior acessibili­dade das calçadas, menor impermeabi­lização do solo, aproveitam­ento climático, destinação adequada para os resíduos. Enfim, práticas sustentáve­is na construção e na manutenção do espaço urbano são recompensa­das com a redução do tributo. Isso já ocorre em cidades como Curitiba, Salvador, Guarulhos, Porto Alegre. Ações pequenas que vão ao encontro da maior qualidade de vida para todos.

Responsabi­lidade solidária em relação às questões ambientais é exemplo de bom comportame­nto ético e moral, é mais inteligent­e que esperar por um “prefeito mito”. De estatístic­a e de bordões o inferno está cheio. Faltou solidaried­ade. De um lado, a preocupaçã­o do contribuin­te com o próprio bolso: pagar menos. Do outro, a preocupaçã­o municipal: arrecadar mais. Entre eles, como se invisível fosse, o IPTU verde e a máxima: cada povo tem o governo (e o IPTU) que merece.

REGINALDO JOSÉ DA SILVA é biólogo pós-graduado em análise ambiental e biogeograf­ia e policial militar em Londrina

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