Folha de Londrina

Os cachorrinh­os da minha vida

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Dias atrás o Cisco estava de guarda aos pés da árvore de Natal. Essa árvore tem mais de 20 anos e foi comprada por minha mãe, na época em que eu ainda era ateu. Sempre que chegava o período do Advento, Aracy vinha para Londrina, montava a árvore, arrumava os adereços e fazia o pequeno presépio. Com o tempo, eu fui me acostumand­o àquele ritual, e hoje tenho certeza de que esse foi um dos caminhos que me levaram de volta à Igreja: o caminho de Belém.

Quando São Francisco montou o primeiro presépio, no início do século 13, utilizou pessoas e animais de verdade para compor a cena do nascimento de Jesus. Para mim isso demonstra que, apesar de não possuírem o discernime­nto para escolher livremente entre a virtude e o pecado, os animais são criaturas de Deus; devem ser respeitado­s na medida em que contribuem para a salvação das almas humanas.

Cisco, aos pés da árvore de Natal, me lembrou o cão de companhia do ex-presidente George Bush, falecido há alguns dias. O mundo inteiro se comoveu com a foto do labrador aos pés do esquife de Bush. Talvez ele tenha contribuíd­o para a salvação do expresiden­te, quem sabe?

A árvore de Natal de casa fica hoje no mesmo lugar em que antes havia uma poltrona, a preferida de Aracy. Lembro-me que o Cisco, logo após ser resgatado da rua, encostava-se nessa poltrona para ficar perto de minha mãe. Desconfio que, mesmo sem palavras, ele estava anunciando uma boa notícia, e ela veio: dias depois do resgate de Cisco, soubemos que a Rosângela estava grávida do Pedro. Nos primeiros meses de nosso filho, Cisco montou guarda embaixo do berço.

Todos os dias, como vocês sete sabem, eu saio para passear com o Cisco - ou melhor, ele me leva para passear. Às vezes, no caminho, relembro as cenas vividas com outros cachorrinh­os. Laika, que foi abandonada pelos donos no dia de Natal, em São Paulo, e acabou sendo adotada pela família de meu tio Álvaro. Ace, mestiço de poodle e vira-lata que dava pulos de alegria e quase falava na hora de sair para passear com meu pai. Tainá, que quando pequena foi rejeitada por ser fêmea e acabou sendo adotada pela avó mais carinhosa do mundo, a Dona Elia. E tantos outros cãezinhos que latiram, brincaram de bolinha, rosnaram, morderam, abanaram o rabo e fugiram na hora do banho ou do veterinári­o. Amei todos eles, sofri com a morte de todos eles. Cada um deles tem um lugar no meu coração.

Mas não idolatro os cachorrinh­os. “Onde houver adoração de animais, haverá também sacrifício humano”, ensinava o grande Chesterton. Os animais devem ser um instrument­o para a elevação do que há de melhor em nós. Eles não substituem as pessoas, nem devem servir de pretexto para fugirmos ao dever amar a Deus e ao próximo.

Lembrem-se do que Jesus disse à mulher cananeia: “Não convém jogar aos cachorrinh­os o pão dos filhos”.

Lembrem-se também da resposta da mulher, em palavras que comoveram Jesus: “Certamente, Senhor; mas os cachorrinh­os ao menos comem as migalhas que caem da mesa de seus donos...”

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