Folha de Londrina

SOLIDARIED­ADE

Evento realizado pela Toca de Assis reúne voluntário­s que atendem dezenas de pessoas em dia de confratern­ização e fé

- Viviani Costa Reportagem Local

Café da manhã, corte de cabelo, roupas limpas, almoço e atividades culturais. Assim foi o Natal antecipado de dezenas de moradores de rua que participar­am neste domingo (9) de evento organizado pela Toca de Assis.

Café da manhã, roupas limpas, banho quente, corte de cabelo, manicure, almoço e atividades culturais. Esse foi o Natal antecipado de dezenas de moradores de rua de Londrina que participar­am neste domingo (9) do evento organizado pela comunidade religiosa Toca de Assis. Logo nas primeiras horas da manhã, um ônibus percorreu a cidade para transporta­r os moradores de rua até o Colégio Estadual José de Anchieta, no Jardim Higienópol­is, região central. Everson Silva, 47, foi o primeiro a ser atendido pela equipe de voluntário­s. Ele caminhou por algumas horas até a escola e dormiu em frente ao portão ainda na noite de sábado.

Silva vive nas ruas há um ano. O envolvimen­to com as drogas o afastou dos filhos que chegaram a oferecer ajuda, mas a internação em uma clínica de tratamento não foi suficiente para o manter longe do vício iniciado em 2001. “Não quero mais que eles fiquem magoados comigo. Prefiro ficar longe. Vou ter que sair dessa sozinho”, sentenciou enquanto aproveitav­a os serviços oferecidos no evento.

Em cada espaço do colégio, dezenas de realidades invisíveis aos olhos da maioria. Emeleide de Campos, 31, estava na fila para cortar o cabelo. Depois de pintar as unhas e dar um trato no visual, a participan­te não conteve a alegria. “Isso aqui tá maravilhos­o”, comemorou. Os três filhos dela vivem com a avó desde que passou a morar sodores zinha nas ruas há 12 anos. “Foi uma desilusão amorosa”, justificou como ponto de partida para o vício em crack. “Não é nada fácil. Estou cansada dessa vida. Já tentei tratamento, mas não consegui ficar”, confessou. “Hoje vou aproveitar tudo isso aqui”, desconvers­ou para retomar o sorriso no rosto.

Nas quadras de esporte da escola, mesas estavam disponívei­s para que todos pudessem fazer as refeições. Larissa Catarino, 21, mora em um abrigo da cidade com as duas filhas. Elas aproveitar­am juntas o café da manhã e aguardavam ansiosas pelo almoço. “É muito legal participar de tudo isso. Nunca tinha vindo para cá”, comentou. Mãe e filhas deixaram a casa em que moravam após desentendi­mentos familiares.

Ao longo do dia, os corre- da escola se transforma­ram em uma grande festa. Além dos serviços, os mais de 50 voluntário­s doaram sorrisos, abraços e tempo para conversar com cada participan­te. Em troca receberam amor, gratidão e reflexões sobre a fragilidad­e da vida.

Ao ouvir o primeiro ‘cliente’, o barbeiro Luciano Pereira se deparou com um velho conhecido da adolescênc­ia. Surpreso, ele demorou a reconhecer o rapaz, hoje viciado em drogas. “Ele estava bem diferente. Conforme fomos conversand­o, percebi que era ele e perguntei sobre alguns conhecidos em comum. Foi bem triste, mas consegui dar meu apoio e dizer a ele que nunca é tarde para recomeçar. Deus nos faz vencedores”, contou.

O chamado “Natal dos Pobres” é realizado há mais de 15 anos pelos integrante­s da Toca de Assis. Mais de 200 participan­tes eram esperados ao longo do dia. A coordenado­ra da Pastoral de Rua e uma das organizado­ras do evento, Sandra Ribeiro, se emocionou ao falar da confratern­ização. “Mudou o meu olhar para cada um deles e para a minha própria vida. A gente reclama de coisas e quando olha para isso tudo... O que enche o meu coração de alegria é quando a gente chega e eles nos chamam de amigos”, relatou. Nas noites de terça-feira, o grupo da pastoral percorre a cidade para oferecer roupas e alimentos aos moradores de rua.

A técnica de enfermagem Márcia Wielganczu­k atua há 4 anos como voluntária na Toca de Assis e não esconde a alegria em acolher cada participan­te. “Quando você pergunta para cada um deles: ‘O que você gostaria de ganhar de Natal?’. Nenhum pede dinheiro. Nenhum pede presente. Eles pedem o afeto que eles perderam, a família, um sorriso, um abraço. Às vezes, eles chegam com medo. Medo de serem rejeitados novamente, de serem julgados mais uma vez. Quem vive na Toca de Assis aprende a não julgar e a acolher todos os irmãos”, frisou.

Para o integrante da Toca de Assis, Irmão Samaritano, é preciso resgatar o verdadeiro sentido do Natal e trocar o consumismo desenfread­o pelo amor ao próximo. “Eu me considero uma pessoa muito privilegia­da. O sentimento que nos move é o de gratidão. Fisicament­e, saímos de cada evento exaustos, mas a alegria é muito grande. Fico triste por não poder ajudar mais. É uma gota no oceano, mas sem essa gota, o oceano seria menor”, resumiu.

 ?? Ricardo Chicarelli ??
Ricardo Chicarelli
 ?? Ricardo Chicarelli ?? Ao ouvir o primeiro morador de rua, o barbeiro Luciano Pereira se deparou com um velho conhecido da adolescênc­ia, ele demorou a reconhecê-lo
Ricardo Chicarelli Ao ouvir o primeiro morador de rua, o barbeiro Luciano Pereira se deparou com um velho conhecido da adolescênc­ia, ele demorou a reconhecê-lo
 ??  ?? Emeleide de Campos, 31, estava na fila para cortar o cabelo e dar um trato no visual, ela vive nas ruas há 12 anos
Emeleide de Campos, 31, estava na fila para cortar o cabelo e dar um trato no visual, ela vive nas ruas há 12 anos
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil