Palco dos grandes festivais
Música, teatro, dança. Em 30 anos, o palco do anfiteatro do Zerão recebeu convidados de renome das mais diversas artes na Londrina dos festivais. “O que mais me marcou foi o show do Hermeto Pascoal (2004). Começou a chover, ele ficou protegido, mas o público ficou embaixo de chuva e não ia embora. A cena foi linda, a luz ficou mais bonita, foi maravilhoso”, conta a musicista e produtora cultural Janete El Haouli.
A apresentação de Clara Crocodilo, de Arrigo Barnabé, em 2004, e os vários concertos da Osuel (Orquestra Sinfônica da Universidade Estadual de Londrina) também marcaram a memória da produtora pela vibração e energia que aquele espaço lotado produz ao espalhar tanta gente pela arquibancada e gramado, embaixo de sol ou chuva.
A mesma intensidade que Luiz Bertipaglia, diretor do Filo (Festival Internacional de Londrina), sentiu ao anunciar a cantora Ana Carolina na abertura do festival, em 2010. “Foi uma experiência marcante. Eu entrei e, na hora que eu vi aquela multidão, me deu medo, eu tremia com o microfone na mão. Era muita gente, cerca de 10 mil pessoas. Quando aquilo está lotado é impressionante a vibração do lugar. É realmente mágico, cheio de energia”, revela. As aberturas do Filo levaram ao palco nomes importantes, como Chico César, Alceu Valença e Timbalada. “Quando você leva um show interessante, sempre dá muita gente”, afirma.
É a vocação da cidade em acolher a cultura, defendida por Magali Kleber, presidente da AAFIML (Associação dos Amigos do Festival Internacional de Música de Londrina). Como aluna e diretora, Kleber organizou edições do FIML e guarda com carinho os concertos da Osuel naquele local. “Lembro um repertório de Rafael Santos, com jazz, música popular. Foi uma alegria, invadiu um pouco a noite, as pessoas não queriam ir embora.” Para ela, espaços como o anfiteatro do Zerão são responsáveis por congregar a cidade. “Sair de casa, poder cantar, isso é importante para o cidadão e tem que ser gratuito, em espaço aberto, com pipoca, picolé”, defende.
CRÍTICA
As danças passaram por lá, mas explicam as dificuldades de apresentação. “A memória afetiva é boa, mas em termos de estrutura é muito ruim. Não é acústica, tem infiltrações, não tem camarim, está no lugar errado e é bastante precária”, afirma Leonardo Ramos, diretor do Ballet de Londrina. “A cultura de Londrina tem alma, mas não tem corpo. A gente não tem como dar o maior potencial”, afirma. Ainda assim, ele leva consigo o espetáculo em comemoração aos 20 anos do Ballet de Londrina, em 2013, que preencheu a arquibancada.
O sentimento de Ramos não é único. Fica a dicotomia amor e ódio, memória e esquecimento. “O anfiteatro é muito bom, mas tem impedimentos para fazer uma coisa de alta qualidade por conta do custo com equipamentos para aquele local”, afirma Bertipaglia sem reduzir sua importância. “É um espaço vital, um templo em condições precárias. Tem que ser mantido, preservado e melhorado. É fundamental para a nossa sociedade e deve ser valorizado”, finaliza.
Mistura de nostalgia e esperança faz a comemoração do trintão se tornar cobrança de que ele possa ser melhor aproveitado. “As próximas gerações merecem ter espaços abertos”, pede Kleber. “Acredito que ele esteja isolado por falta de ativação. Eu amo aquele espaço, é um pedaço do coração de Londrina. Ele está precisando ser cuidado e isso depende de todos nós: população, produtores e políticos”, propõe El Haouli.
Nesse sentimento de afeto e esperança, as boas memórias clamam por novas histórias para praticar o exercício da continuidade e fazer com que mais pessoas sintam a energia que o anfiteatro lotado causa em dia de bom espetáculo.(L.T.)
É um espaço vital, um templo em condições precárias. Tem que ser mantido, preservado e melhorado”