Ciência e sensibilidade no projeto da UEL
O sorriso no Hospital Universitário é valioso. Internados para o tratamento das mais diversas enfermidades, os pacientes são surpreendidos semanalmente por animados grupos que propõem a arte como um alento à dor. Através de números de clowns, narração de histórias, música e artesanato, os estudantes da UEL (Universidade Estadual de Londrina) integrantes do Sensibilizarte promovem um ambiente mais sensível tanto para quem precisa de cuidados quanto para quem cuida. E, diferentemente do que se possa parecer, o projeto de extensão foi idealizado para sensibilizar os futuros profissionais de saúde. “As pessoas, quando decidem se inscrever no processo de seleção, acham que vão fazer o bem ao próximo, mas, depois do treinamento e com o passar do tempo, acabam vendo que o bem maior é para si mesmo. Sentimos que há um grande crescimento profissional”, avalia a psicóloga Debora Corsino, que participou do grupo por cinco anos.
Os 11 anos de trabalho do projeto foram parar nas páginas do livro “Sensibilizarte: decompondo as paredes brancas em cores”, editado pelo próprio grupo, impresso na UEL, sob a organização dos ex-colaboradores Debora Corsino, Márcio Santos e da professora de psicologia Maíra Bonafé Sei. A publicação é dividida em artigos escritos por quem atuou nas frentes de trabalho do projeto.
O Sensibilizarte foi criado em 2007, a partir da ideia de três alunos do curso de medicina. Na época, os veteranos Marina Papa Penteado e Rodrigo Aralios Neves propuseram à caloura Adna Fareli Reis a ideia de humanizar o ambiente dos alunos de medicina depois de assistir a uma palestra do grupo do médico Paulo Campelo, da UPE (Universidade de Pernambuco), intitulado “A arte na medicina às vezes cura, de vez em quando alivia, mas sempre consola”. “Eles sabiam que eu mexia com música e resolvemos, meio que na curtição, mas cheios de boa vontade, fazer o projeto. Na primeira vez que entramos no HU, a direção disse que nunca mais voltaríamos. Fizemos uma bagunça enorme”, lembra Adna Reis, atualmente psiquiatra e professora da UEL. “Hoje, tenho o orgulho do projeto como se fosse um filho”, descreve a médica.
Aquela confusão inicial se organizou. O grupo passou por capacitações, criou um planejamento de trabalho e ano a ano ganhou mais integrantes. Hoje, para ser parte do Sensibilizarte, é preciso passar por um processo de seleção, iniciado a partir dos simpósios anuais de humanização na universidade. Atualmente são admitidos alunos de oito cursos: medicina, enfermagem, odontologia, farmácia, fisioterapia, educação física, serviço social e psicologia. Na atual gestão existem 137 alunos como colaboradores que visitam os pacientes do Hospital Universitário e do Hospital do Coração. “Temos a preocupação de mostrar que o nosso trabalho não é uma ação de solidariedade e que não somos uma espécie de animadores de festa. Para estar no projeto, todos são capacitados durante cerca de seis meses”, explica a atual coordenadora Mariana Lombardi, estudante do curso de psicologia. Ela divide a gestão do grupo com a colega do curso de farmácia, Geovana Oliveira dos Santos.
ESPAÇO E IMPORTÂNCIA
Ao longo dos anos, o projeto foi ganhando espaço e importância dentro da UEL e, em 2014, foi reconhecido pela universidade, recebendo o status de projeto de extensão com apoio da professora Maíra Bonafé Sei. A ideia era institucionalizar o trabalho e permitir que ele pudesse ter tratamento adequado, como, por exemplo, concorrer a bolsas científicas e financiamento. “Minha dificuldade ao longo dos anos foi inclusive de saber quando me aproximar para orientar. Os alunos tomaram esse trabalho de forma tão responsável, que ele é muito gerido exclusivamente por eles”, afirma Sei, que foi substituída na coordenação institucional do projeto pelo farmacêutico Alberto Duran Gonzalez, professor de Saúde Coletiva.
O novo gestor vê o projeto com admiração e exalta a possibilidade de antecipar a presença dos alunos no ambiente da prática dos profissionais de saúde. “Principalmente os alunos de primeiro ano têm a ansiedade do trabalho prático, que só é feito do meio para o fim dos cursos. Isso permite um múltiplo diálogo com vários profissionais. É muito positivo”, avalia Gonzalez. “O Sensibilizarte permite que os alunos não apenas tenham uma profissão, faz com que se formem cidadãos melhores”, pontua.
No meio em que se discute o tema no País, o projeto ganhou respeito. Ao longo dos anos passou a participar dos congressos nacionais de Saúde, Cultura e Arte, e chegou inclusive a receber o evento na UEL. Os estudantes chegaram a participar de workshops com o médico americano Patch Adams, um dos precursores do uso do humor e do trabalho com artes nos tratamentos de saúde - sua vida inclusive foi retratada em um filme homônimo, de 1998, interpretado por Robin Williams.
A gestão financeira e a arrecadação de fundos do Sensibilizarte para a compra de materiais é feita pelos estudantes através de produção de eventos e venda de objetos como camisetas, adesivos e broches. A impressão do livro foi paga a partir desses recursos. “Mesmo tendo saído da prática dos trabalhos, me mantenho afetivamente ligada. Ainda não consigo medir o quanto ele influenciará na minha vida profissional, mas ver o livro pronto é importante para divulgar e compartilhar nossas experiências”, avalia Debora Corsino.
“O Sensibilizarte permite que os alunos não apenas tenham uma profissão, faz com que se formem cidadãos melhores”