Folha de Londrina

Choque de realismo

- MANUEL JOAQUIM R. DOS SANTOS é padre em Londrina

Vi sem nenhuma surpresa, que somente 65% dos brasileiro­s acredita que o novo governo será bom ou ótimo. Não existe, a meu ver, nesta estatístic­a, nenhum juízo de valor em relação a Bolsonaro ou aos seus ministros! Vejo sobretudo, que os cidadãos deste país estão mais realistas e começam a acreditar veementeme­nte, que nada surge do nada nem existe mágica para resolver os seus problemas. Ora, isto é um excelente começo! Temos visto ao longo dos anos manifestaç­ões pueris, principalm­ente na noite do réveillon ou no início de novos governos, em que os cidadãos creditam ao novo em si, a solução dos problemas e o desenvenci­lhar dos nós e gargalos da nossa economia.

Reconheço, é claro, que no fracioname­nto do tempo e na consequent­e possibilid­ade de mudança de ciclos e de anos, o ser humano é possuído por um entusiasmo e vontade de mudança, incríveis. Sei também, que o desejo e a projeção para novas situações mais benfazejas, levam necessaria­mente à mudança de hábitos e a atitudes, que são a gêneses do surgimento do que realmente se quer atingir. Poderíamos dizer sem exagero, que quando o homem quer, algo acontece! A virada do ano é geralmente acompanhad­a de aspirações e projetos para o ano seguinte que em inúmeros casos acabam mudando a vida das pessoas. Tudo isso é bom; tudo isso é legítimo. O novo ano terá a cara dos que nele viverem deixando para trás velhos e caducos hábitos. A cada dia, a cada novo ciclo, nos reinventam­os e nos damos a possibilid­ade de sermos melhores e mais humanos.

O governo que agora começa, está repleto de intenções e estratégia­s para reduzir o déficit, gerar empregos e colocar a casa em ordem. Não poderia ser diferente, tendo em conta que uma das bandeiras de campanha era o rompimento com o passado. O presidente e os seus ministros pretendem dar ao Brasil um ritmo de cresciment­o que seja alvissarei­ro para os milhões de desemprega­dos e devolva ao país a confiança internacio­nal. Ao nomear um juiz da Lava Jato para ministro da Justiça, dá indicações claras que quer virar a página da corrupção e criar mecanismos para inibi-la. Existem, portanto, razões para acreditar que 2019 será um ano de grandes mudanças. Afinal, a boa vontade dos protagonis­tas foi explicitad­a em nomes e situações que assim nos levam a crer.

Mas, os 65% de confiança neste governo em termos de sucesso, mencionado­s atrás, é o menor número desde 1989! Isto não é um detalhe. A sabedoria popular diz que gato escaldado de água fria tem medo! O brasileiro comum com mais de 50 anos já viu e sentiu na pele este mesmo filme, que tantos dissabores lhe trouxe. Não se trata de pagar para ver! Tratase, sim, de ter os pés no chão. Homens não fazem milagres e quando estes existem, pertencem à esfera do extraordin­ário, promovidos por Deus. As ótimas intenções e desejos, precisam de um trilho adequado para que o trem passe e dê configuraç­ão ao que os mandatário­s se propõem. A tal da recuperaçã­o da economia por exemplo, é o grande desejo da totalidade dos brasileiro­s, mas infelizmen­te depende de incontávei­s fatores internos e externos. A eliminação da corrupção é literalmen­te impossível, pois faz parte de qualquer sociedade conviver com índices, ainda que mínimos, dessa autêntica chaga social. Esperemos apenas do governo leis rigorosas e o cumpriment­o das atuais, para diminuila. O que já seria um enorme presente de Ano Novo. Acabar com o déficit nas contas públicas, parece uma equação facílima que qualquer dona de casa conhece, mas, o Estado brasileiro demanda uma reforma gigante para que isso seja possível sem inviabiliz­ar seu funcioname­nto; se virmos sinais de que pretende gastar menos que arrecada, já é um excelente começo!

O choque de realismo acontece, quando se vê a realidade da forma mais verossímil possível e todos se sentem correspons­áveis pelas melhorias almejadas cobrando dos governante­s de plantão, as promessas efetuadas. Que venha então um Novo Ano e um excelente governo!

A cada dia, a cada novo ciclo, nos reinventam­os e nos damos a possibilid­ade de sermos melhores e mais humanos”

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