O que podemos aprender com o sofrimento
1.
O ano mal começou e já tivemos a nossa quota de catástrofes por terra, água, fogo e ar. Choramos os mortos de Brumadinho, choramos as vítimas das enchentes, choramos os meninos do Flamengo, choramos o jornalista e o piloto do helicóptero. Quando observamos essas tragédias, concluímos que o sofrimento parece estar previsto na ordem da criação, como uma característica inevitável da existência humana. O que fazer, então?
2.
O médico e psicólogo Viktor Frankl, autor do clássico “Em Busca de Sentido”, ensinava que é necessário ao homem encontrar um sentido na própria dor. Sobrevivente dos campos de concentração nazistas, Frankl passou pelas maiores provações que um ser humano poderia suportar, e ao fim escreveu: “A liberdade espiritual do ser humano, a qual não se lhe pode tirar, permite-lhe, até o último suspiro, configurar a sua vida de modo que tenha sentido. (...) Se a vida tem sentido, também o sofrimento necessariamente o terá”.
3.
Na última segunda-feira, 11 de fevereiro, quando ocorreu o desastre que matou Ricardo Boechat, comemorava-se o Dia Mundial do Enfermo. Essa data foi instituída pelo papa São João Paulo II em 1992, para coincidir com o dia da primeira aparição de Nossa Senhora de Lourdes, na França, em 11 de fevereiro de 1858. Lourdes tornou-se um centro de peregrinação, onde enfermos do mundo inteiro buscam a cura para males do corpo e do espírito. Por esse motivo, João Paulo II consagrou a humanidade à Virgem de Lourdes.
4.
A palavra enfermo, ensinou-me o querido padre Aristides Deretti, deriva do latim “infirmus”, que significa “sem firmeza”, “sem forças”, “frágil”, “imperfeito”. É um conceito que se aplica a todos os seres humanos, uma vez que a imperfeição nos acompanha do nascimento à morte. O Dia do Enfermo é o dia de todos nós.
5.
O Livro de Jó conta a história de um homem que tinha tudo e tudo perdeu: saúde, família, riqueza e prestígio. Ele é a imagem da nossa enfermidade, da nossa vulnerabilidade. Quando acontecem as tragédias, podemos encontrar um sentido em nossa condição enferma, ou podemos simplesmente amaldiçoá-la, festejando a infelicidade alheia ou ofendendo a Deus. Jó recusou-se a blasfemar, mesmo depois de todos os sofrimentos que suportou, tornando-se um modelo de conduta para nós. A vida exige a paciência de Jó.
6.
Agora, infelizmente, houve quem zombasse das vítimas de Brumadinho (por terem majoritariamente votado no candidato “errado” nas últimas eleições), dos meninos do Flamengo (por pertencerem ao clube “errado”) ou de Ricardo Boechat (por ter opiniões “erradas”). É a enfermidade transformando as pessoas em monstros.
7.
O professor José Monir Nasser costumava dizer que a morte é a grande pedagoga, a mestra que nos faz contemplar a vida sob uma perspectiva mais ampla e generosa. A mesma lição encontra-se em praticamente todos os clássicos da literatura, e também está na oração da AveMaria, que termina com o seguinte pedido: “Rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte”. Amém.
A morte é a mestra que nos faz contemplar a vida sob uma perspectiva mais ampla e generosa