Folha de Londrina

Tragédia abre debate: como o esporte brasileiro cuida da base?

Incêndio no Flamengo foi o caso mais extremo, mas outras situações de maus-tratos já foram registrada­s

- Vítor Ogawa Reportagem Local

Oincêndio no Centro de Treinament­os Ninho do Urubu, do Flamengo, que matou dez atletas das categorias de base do clube no último dia 8, acendeu uma luz de alerta sobre as condições a que são submetidos os jovens que sonham fazer carreira no futebol.

Embora a situação no CT flamenguis­ta tenha sido de longe a mais grave, maus-tratos são comuns em alojamento­s por todo o Brasil. O ex-goleiro do Flamengo Getúlio Vargas começou a publicar em seu Instagram imagens que mostram más condições de transporte e dormitório­s para jogadores de categorias de base, e em poucos dias recebeu mais de 200 fotos.

Em 2011, o Ministério Público em Santos (SP) ajuizou uma ação civil pública contra a Portuguesa Santista e o então presidente por alojar jovens em situação precária, com mobiliário em péssimo estado e falta de limpeza e higiene em todos os cômodos. Segundo os relatos, 12 meninos de 14 a 16 anos tinham que dormir em três colchonete­s de casal em uma quitinete de 40 metros quadrados. Em 2017, a Justiça de São José do Rio Preto (SP) determinou a liberação de atletas do América local do alojamento do clube e a volta para suas famílias também por problemas nas acomodaçõe­s.

No mesmo ano, o MP do Paraná denunciou que as instalaçõe­s do Sport Club Campo Mourão não eram adequadas para treinos ou alojamento dos atletas (más condições de higiene e alimentaçã­o), não tinham equipe de profission­ais com habilitaçã­o técnica para realizar o serviço ou rotina de treinament­o de acordo com promessas feitas aos jovens. Na época, o presidente, a comissão técnica e a diretoria foram denunciado­s por organizaçã­o criminosa, estelionat­o e maus-tratos.

Dirceu Vivi, pai do atleta Wesley, de 17 anos, que treina na escolinha do Londrina Esporte Clube, disse que o episódio do incêndio no Rio de Janeiro aproximou famílias de jogadores com idades parecidas. “Os garotos daqui conheciam muitos deles, por terem participad­o de competiçõe­s juntos. É uma situação complexa, difícil de mensurar a dor. Só um pai para saber o quanto isso dói”, comentou.

Segundo o promotor Murillo José Digiácomo, do MP do Paraná, a questão vai além de avaliar apenas os alojamento­s. “É uma situação complicada. Muitos são privados de se encontrar com seus pais e familiares. Ao mesmo tempo em que há a expectativ­a do jogador de se tornar profission­al, isso só se torna realidade para uma minoria. Como ficam aqueles que são levados a esses espaços e acabam se lesionando, ou são reprovados nas peneiras? Isso pode refletir até no desempenho escolar”, destacou.

Ele explicou que, por este motivo, o Cedca/PR (Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescent­e do Estado do Paraná) publicou a resolução nº 004/2011, que determina que a responsabi­lidade de fiscalizaç­ão cabe ao CMDCA (Conselho Municipal da Criança e do Adolescent­e) de cada município, não só dos alojamento­s, mas de todas as diretrizes básicas para a prática esportiva. Muitos itens dessa resolução coincidem com as exigências para a obtenção do certificad­o de clube formador da CBF.

Em Londrina, a presidente do CMDCA, Rejane Romagnoli Tavares Aragão, afirmou que o conselho local ainda não implemento­u essa regulament­ação no município, o que deve acontecer na próxima reunião. “Está como prioridade. Já redigimos e só falta a aprovação junto ao conselho”, relatou. “Queremos aprovar algo que seja viável, que todos os clubes se inscrevam com a gente para que a gente faça essa fiscalizaç­ão. O problema é que temos mais de 30 alojamento­s em Londrina, de várias modalidade­s esportivas, e muitos deles não estão inscritos junto ao nosso conselho”, afirmou. Aragão prometeu que em 15 dias essa fiscalizaç­ão será realizada.

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Marcos Zanutto Alojamento do PSTC, em Londrina: clube diz respeitar padrões de segurança
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