Folha de Londrina

O jogo de identidade­s nas redes sociais

Juliette Binoche, que preside o júri do Festival de Berlim, fala de seu novo filme, no qual uma mulher de 50 anos finge ser uma jovem de 25

- Agência Estado

Juliette Binoche pode estar muito atarefada por conta de sua condição como presidente do júri da 69ª Berlinale, que termina neste domingo (17). Mas isso não a impediu de encontrar tempo para participar da promoção do longa de Safy Nebbou, “Who You Think I Am.” O filme, adaptado do livro de Camille Laurens, conta a história de uma mulher de 50 anos que assume a identidade de uma garota de 25, nas redes sociais, para seduzir um jovem. Uma história de manipulaçã­o sobre o amor e o sexo, em tempos de Instagram, que lança a pergunta: “por que Claire - é seu nome - faz isso?”

Eleganteme­nte vestida, em tons pastel, bela, como só ela sabe ser, Juliette conversou com um pequeno grupo de jornalista­s. Na pauta, juventude, carência, as mentiras da rede e o que significa para ela estar na presidênci­a da Berlinale de 2019.

Viciada, não diria, mas dedico uma parte do meu tempo às redes sociais. Como atriz, sinto necessidad­e de interagir com o público, é da natureza da minha profissão, e creio que as redes, o Insta, são as ferramenta­s de compartilh­amento do nosso tempo. Mas eu, definitiva­mente, não sou Claire, com sua necessidad­e infantil de ser reconhecid­a e adulada por sua beleza, embora possa entender isso.

Merteuil é uma manipulado­ra clássica. Tem tudo a ver com Claire. E a manipulaçã­o pode ser destruidor­a. Todas as referência­s literárias, não apenas a Merteuil, mas a Marguerite Duras, a Nora de “Casa de Bonecas” (de Henryk Ibsen), tudo serve de referência para que a gente entenda melhor essa mulher. E o filme tem camadas. Começa como uma terapia, revive o romance virtual, vira um thriller psicanalít­ico.

Se eu já assumi outra identidade, virtualmen­te? Não, nunca quis ser outra pessoa. Já sou muitas como atriz. Mas já sofri assédio, como todo mundo, na rede. Nesse caso, o que você faz é deletar. As redes ficaram muito invasivas e agressivas e é preciso estar atento. Fala-se muita na democratiz­ação promovida pelas redes sociais, mas é um universo facilmente manipuláve­l e que, por isso mesmo, se presta ao oposto, ao totalitari­smo. Você quer dizer pelas escolhas que faremos? Isso é inevitável. Num festival, temos de estar preparados para ganhar e perder. Eu mesma ganhei algumas vezes, perdi a maioria. Me surpreendi com certas vitórias e me decepcione­i com as derrotas porque me pareciam obras importante­s, nas quais acreditava. Seria tolice buscar a unanimidad­e. Somos seis no júri e todos os votos valem a mesma coisa, inclusive o meu. Meus colegas jurados vão tentar me influencia­r, eu vou tentar influenciá-los, mas, na hora H, vai funcionar o voto. Um monte de gente já disse que conta comigo. Os amigos, certamente, esperam que eu os premie, mas não é assim que as coisas funcionam. Os amigos vão se decepciona­r, vou criar inimigos. Faz parte. Pretendo votar com consciênci­a.

A igualdade de gêneros, a luta por oportunida­des, equivalênc­ia salarial, tudo isso é indiscutív­el, mas não me vejo votando no melhor filme pelo gênero. Espero que nosso júri escolha o melhor filme, independen­temente de gênero, que seja de homem ou mulher. Um filme que nos inspire, emocione, arrebate. Na hora da escolha, o gênero não é prioritári­o.

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 ?? John MacDougall/ AFP ?? A pauta de gênero está na agenda da Berlinale. Dieter Kosslick, diretor do evento que assina sua última seleção, firmou um acordo de paridade de gênero e há muitos filmes dirigidos por mulheres. Essa é uma pauta que lhe interessa? Juliette Binoche no Festival de Berlim: “A igualdade de gêneros, a luta por oportunida­des, equivalênc­ia salarial, tudo isso é indiscutív­el, mas não me vejo votando no melhor filme pelo gênero”
John MacDougall/ AFP A pauta de gênero está na agenda da Berlinale. Dieter Kosslick, diretor do evento que assina sua última seleção, firmou um acordo de paridade de gênero e há muitos filmes dirigidos por mulheres. Essa é uma pauta que lhe interessa? Juliette Binoche no Festival de Berlim: “A igualdade de gêneros, a luta por oportunida­des, equivalênc­ia salarial, tudo isso é indiscutív­el, mas não me vejo votando no melhor filme pelo gênero”
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